Publicidade
Economize: canal oficial do CT Ofertas no WhatsApp Entrar

Citação por WhatsApp: requisitos e decisões dos tribunais

Por| 23 de Fevereiro de 2023 às 10h00

Link copiado!

Imagem: Thiago Furquim/Canaltech
Imagem: Thiago Furquim/Canaltech

*escrito em coautoria com Camila F. Soares

Em 2020 o CNJ (Conselho Nacional da Justiça) criou o “Juízo 100% Digital”, acompanhando a transformação digital e as exigências naturais da pandemia causada pela covid-19.

É fato que a digitalização dos processos tem promovido maior celeridade e eficiência na prestação jurisdicional. Os atos processuais cada vez mais têm tomado o formato eletrônico, sendo o caso, por exemplo, da publicação eletrônica dos atos judiciais, das audiências virtuais e dos atendimentos aos advogados por juízes e seus assessores através de videoconferência.

Continua após a publicidade

Como consequência da evolução digital nos canais de comunicação, o artigo 246 do Código de Processo Civil foi alterado e a citação por meio eletrônico se tornou preferencial.

No entanto, o cadastramento do endereço eletrônico da pessoa a ser citada no banco de dados dos respectivos tribunais é pressuposto para que haja essa modalidade de citação.

Recentemente, a Resolução 455/2022 do CNJ definiu a expressão “endereço eletrônico” como “toda forma de identificação individualizada para recebimento e envio de comunicação/mensagem digital, tal como o correio eletrônico (e-mail), aplicativos de mensagens, perfis em redes sociais e o Domicílio Judicial Eletrônico.”

Esse avanço vem abrindo portas para os pedidos de citação por WhatsApp, o que tem gerado bastante controvérsia no nosso Judiciário, afinal, a citação é o ato formal e solene pelo qual a Justiça dá ciência a alguém de que há contra si ação judicial em curso, devendo comparecer em juízo para a apresentação da sua defesa no prazo legal, sob as penas da lei.

Continua após a publicidade

Por um lado, sabe-se que o processo judicial pode ser uma verdadeira batalha de gato e rato. Há partes que se escondem a todo custo, evitando a citação. Não raramente devedores se ocultam, a fim de ganhar tempo, mantendo-se inertes frente suas obrigações. Em se tratando de pessoas físicas que desejam evitar a citação, um expediente comum por parte de quem deve é orientar porteiros a informar que se mudaram, que estão viajando ou que simplesmente não há ninguém em casa. Já no caso de pessoas jurídicas, usual que mudem de endereço sem que realizem a necessária atualização de informação perante os órgãos públicos, como a Receita Federal e Juntas Comerciais.

A esse respeito, tenhamos em mente o caso de uma empresa que permanece trabalhando de forma totalmente remota mesmo com o fim da pandemia. Tal empresa se encontra 100% ativa, alimentando suas redes sociais, respondendo e-mails, telefone e aplicativos de mensagens, no entanto, no imóvel indicado como sua sede ninguém pode ser encontrado para citação.

O que fazer? Como usar a tecnologia para solucionar a situação de fujões que teimam em se ocultar, mas continuam “on”?

O Superior Tribunal de Justiça, em 15/03/2021, no julgamento do HC nº 641.877-DF, estabeleceu medidas para a verificação da real identidade do destinatário da mensagem por WhatsApp:

Continua após a publicidade
“Abstratamente, é possível imaginar-se a utilização do WhatsApp para fins de citação na esfera penal, com base no princípio pas nullité sans grief. De todo modo, para tanto, imperiosa a adoção de todos os cuidados possíveis para se comprovar a autenticidade não apenas do número telefônico com que o oficial de justiça realiza a conversa, mas também a identidade do destinatário das mensagens. (...) Como cediço, a tecnologia em questão permite a troca de arquivos de texto e de imagens, o que possibilita ao oficial de justiça, com quase igual precisão da verificação pessoal, aferir a autenticidade da conversa. É possível imaginar-se, por exemplo, a exigência pelo agente público do envio de foto do documento de identificação do acusado, de um termo de ciência do ato citatório assinado de próprio punho, quando o oficial possuir algum documento do citando para poder comparar as assinaturas, ou qualquer outra medida que torne inconteste tratar-se de conversa travada com o verdadeiro denunciado. De outro lado, a mera confirmação escrita da identidade pelo citando não nos parece suficiente. (...) Necessário distinguir, porém, essa situação daquela em que, além da escrita pelo citando, há no aplicativo foto individual dele. Nesse caso, ante a mitigação dos riscos, diante da concorrência de três elementos indutivos da autenticidade do destinatário, número de telefone, confirmação escrita e foto individual, entendo possível presumir-se que a citação se deu de maneira válida, ressalvado o direito do citando de, posteriormente, comprovar eventual nulidade, seja com registro de ocorrência de furto, roubo ou perda do celular na época da citação, com contrato de permuta, com testemunhas ou qualquer outro meio válido que autorize concluir de forma assertiva não ter havido citação válida” (HC nº 641.877 DF, 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Ribeiro Dantas, em 09/03/2021, DJe 15/03/2021).


Chama a atenção que diante da importância do ato de dar conhecimento a alguém sobre um processo judicial movido contra si é imprescindível a comprovação da ciência inequívoca da citação e a efetiva identificação da pessoa a ser citada, mediante os seguintes requisitos:

  • número de telefone,
  • confirmação da identidade e
  • ciência por escrito pelo citando quanto ao processo.

Não há dúvidas de que, para os juristas que defendem a citação por WhatsApp, é fundamental que não ocorra prejuízo ao contraditório e à ampla defesa do destinatário da citação sendo ressalvado o direito deste de, posteriormente, impugnar e comprovar que sua citação não foi válida.

Continua após a publicidade

O Tribunal de Justiça de São Paulo demonstra muita cautela e apresenta divergências entre os julgados, tornando o tema complexo e longe de ser pacífico. As decisões, a depender do entendimento do juiz, sustentam diversos argumentos:


  • que é condição para essa modalidade de citação que a pessoa a ser citada tenha autorizado a prática dessa modalidade de citação, mediante cadastro do seu endereço eletrônico no banco de dados do Portal do Tribunal de Justiça, sendo viável, por ora, a habilitação apenas para pessoa jurídica.
  • que a citação/intimação por meio do aplicativo WhatsApp somente deve ser admitida de forma complementar. Ou seja, após prévia tentativa de citação pessoal nos endereços conhecidos no processo, de forma complementar, deve haver a tentativa por meio do WhatsApp.
  • E em sentido absolutamente contrário, em observância à orientação expressa da Corregedoria Geral da Justiça – Comunicado CG nº 2265/2017 que dispõe que, por ora, o Tribunal de Justiça de São Paulo se abstém de utilizar o procedimento de intimação via aplicativo WhatsApp, com o intuito de garantir a segurança jurídica e processual, devendo se aguardar regulamentação do CNJ para a validade dessa modalidade de citação.

Como se pode notar, a citação por WhatsApp é um assunto ainda bastante polêmico que exige cuidado na sua efetivação.

Autor e Réu devem ter precaução ao se deparar com essa modalidade de citação no contrato, como forma de ter garantido o direito da regularidade na formação e desenvolvimento do processo. O autor deve se atentar, por exemplo, para afastar eventual alegação de nulidade que pode colocar em xeque todo o processo e retorná-lo à estaca zero.