IA inventa produto, mas entidades não querem registrar a patente; entenda o caso
Por Alveni Lisboa • Editado por Douglas Ciriaco |
Diariamente, o Canaltech mostra invenções criadas por seres humanos, muitas com uso de inteligências artificiais criadas com propósitos diversos. Em geral, as máquinas ajudam cientistas e inventores na obtenção do resultado, mas todo o processo de concepção é conduzido por seres humanos. E se uma IA fosse capaz de desenvolver ela mesmo uma invenção de forma autônoma?
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Aparentemente, foi isso que aconteceu e causou uma imensa confusão jurídica. A África do Sul foi o primeiro país a conceder o direito de patente para uma criação produzida inteiramente por inteligência artificial. A DABUS desenvolveu um “recipiente para alimentos com base na geometria fractal" de forma completamente independente.
DABUS é um acrônimo de Device for Autonomous Bootstrapping of Unified Sentience (“Dispositivo para inicialização autônoma de consciência unificada”, em tradução livre) e se trata de um complexo sistema de IA desenvolvido na Universidade de Surrey, no Reino Unido. Seu criador é o físico Stephen Taler, reconhecido pesquisador de IA e programador, que cedeu a “máquina” para realização de experimentos.
Na prática, o que DABUS faz é gerar ideias de potenciais invenções, quase como um computador especializado em brainstorming. Esse tipo de criação é chamado de “máquina de criatividade” porque seu funcionamento é totalmente baseado nessa habilidade humana.
O supercomputador processa dados e analisa informações de modo crítico, graças ao conhecimento adquirido a partir das técnicas de aprendizado de máquina. Com a assimilação feita sobre o tema, a IA consegue trabalhar de forma independente, sem interferência humana, e com uma capacidade absurda de resolver equações como ninguém de carne e osso é capaz.
O recipiente desenvolvido pelo DABUS tem um formato peculiar (fractal) que ajuda na aderência dos alimentos e reduz a troca de calor, mantendo-os na temperatura ideal por mais tempo. Pode não parecer uma megainvenção, mas é algo notável vindo de uma máquina que ainda tem muito a aprender.
Patentes para máquinas: sim ou não?
Certo, então existe uma máquina produtora de recipientes que desenvolveu algo inédito. Aí entra a polêmica da questão: é possível registrar uma patente de algo que não foi criado por uma pessoa física ou jurídica?
Escritórios de patentes nos Estados Unidos e da Europa disseram que não. A Suprema Corte da Inglaterra e do País de Gales rejeitou os dois pedidos de patente de Thaler, declarando que IA não é uma pessoa, portanto não pode ser considerada um inventor sob a Lei de Patentes do Reino Unido.
O Instituto Europeu de Patentes também recusou o pedido, ao alegar que tais sistemas carecem de personalidade jurídica, o que os impede de reivindicar a propriedade legal da produção. Apenas o órgão de patentes da África do Sul considerou DABUS um inventor de verdade e registrou a criação. É preciso ressaltar que a entidade sul-africana não é reconhecida pelo cuidado com as patentes, por isso esse registro é menos significativo do que deveria.
Alguns dias depois, o Tribunal Superior da Australia decidiu, de forma inédita, que existe a possibilidade de registro de patentes para “inventores não humanos”. Essa tomada de decisão pode ser um marco no setor e abrir precedentes para que outros países sigam o mesmo caminho.
Segundo o criador da máquina, a batalha jurídica para registrar a invenção do DABUS foi muito mais no campo filosófico do que físico, afinal ele precisava convencer que uma arquitetura neural criou algo utilitário no mundo real. "O fato de que DABUS criou invenções dignas de patente é mais uma evidência de que o sistema 'anda e fala', exatamente como um cérebro humano consciente", defendeu Thaler à rede de notícias ABC.
Fonte: Patent Journal of South Africa, ABC