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Brasil aparece como um dos dez países que mais censura a internet no mundo

Por| 18 de Outubro de 2019 às 14h45

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Pixabay
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Uma das maiores preocupações dos grupos de liberdade de expressão nos últimos anos é com a censura aplicada por governos na internet, principalmente com a onda de regimes autoritários que têm afetado o mundo todo nesta última década. Com esse problema em mente, a Comparitech fez o levantamento de todos os pedidos de derrubada de conteúdo feitos por governos de todo o mundo aos principais gigantes da internet (Google, Facebook, Twitter, Microsoft e Wikimedia). E o Brasil ocupa posição de destaque nesse quesito.

A empresa levantou dados de pedidos de remoção de algum conteúdo, publicado por usuários através das plataformas dessas empresas e feito por governos de algum país entre 2009 e 2018, numa tentativa de compilar quais são as nações que mais se esforçam em censurar sua população. E há alguns resultados interessantes aqui: como esperado, a Índia e a Turquia são dois dos países que mais censuram seus cidadãos, mas há algumas surpresas: uma delas é o fato da China não aparecer com destaque no levantamento (e explicaremos melhor o porquê no decorrer da matéria) e, mais impressionante ainda - o Brasil está entre os 10 países que mais pedem a remoção de conteúdos para as empresas de mídia na internet.

No geral (ou seja, na soma de todos os pedidos de remoção), o Brasil aparece na sexta posição, atrás apenas da Índia, Rússia, Turquia, França e México. No total, o país fez mais de 17 mil pedidos de remoção de conteúdo entre 2009 (que foi quando o Google passou a registrar esses pedidos) e 2018, mas não é possível saber exatamente quais são os motivos dessas requisições de retirada, pois o Brasil não foi o alvo do estudo da Comparitech. Mas ainda não há causa para alarme: como veremos a seguir, nem todas essas remoções são uma afronta à “liberdade de expressão” dos cidadãos, e muitas desses pedidos podem ser considerados como legítimos, ainda que países como Turquia e Rússia usem essas ferramentas de forma abusiva para censurar opositores do governo.

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Google

O local onde o Brasil mais se “destaca” nos pedidos de remoção de conteúdo é junto Google. Nele, o país aparece como o 4º no ranking, com 6.455 pedidos no total, atrás apenas dos Estados Unidos (7.964 pedidos), Turquia (10.379) e Rússia (61.471). Nessa conta entram não apenas pedidos para a retirada de conteúdos dos resultados da ferramenta de busca, mas também a derrubada de conteúdos postados em plataformas como Blogger e Blogspot, que pertencem à companhia.

Os principais motivos para os pedidos de remoção (no apanhado geral) no Google são: perigo à segurança nacional (29,74%), difamação (17,83%) e regulação da venda de produtos ou serviços (12,72%). Entre essas categorias, 88% de todos os pedidos se enquadram em segurança nacional e 97% em pedidos relativos a regulação de itens e serviços que vieram da Rússia.

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Ainda que não saibamos exatamente o motivo de cada remoção, o Google forneceu alguns exemplos dos tipos de pedidos: em 2014, a empresa recebeu uma ordem judicial expedida pela justiça dos Estados Unidos pedindo a remoção de dezenas de postagens de um blog sobre um escândalo envolvendo políticos locais, cuja remoção foi negada. Outro exemplo de remoção negada veio do governo da Turquia em 2016, quando foi pedido que a empresa retirasse duas postagens no Google Groups e um blog inteiro hospedado no Blogger. Ambas as plataformas teriam publicado uma caricatura de uma renomada figura política do país.

Outro exemplo de pedido de remoção que foi acatado pelo Google foi um feito pela Rússia em 2017, que solicitou a retirada de um blog que publicava diversos artigos sobre uma teoria da conspiração, onde os Estados Unidos teria o interesse em separar os diversos territórios russos, esterilizar o povo eslávico e lançar um ataque nuclear contra o país.

Facebook

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Outra lista onde o Brasil aparece com maior destaque é a de pedidos de remoção de postagens do Facebook. O país aparece na quinta colocação com 10.418 solicitações, atrás da Turquia (230.002 pedidos), México (24.872) França (42.989) e Índia (70.815). O destaque aqui fica por conta da Índia, já que cerca de 91% de todos os 77.620 pedidos de remoção de conteúdo feitas pelo país entre 2009 e 2018 ocorreu na rede social de Mark Zuckerberg.

Como em muitos casos, os pedidos de remoção são feitos por causa de conteúdos que violam leis locais, mas que não são proibidos pelas regras da rede social. Logo, o mais comum nesses casos é que o Facebook apenas proíba que certas regiões acessem esses materiais, mas não os remove completamente da rede social.

Um caso que exemplifica bem essa prática aconteceu em 2016: autoridades da Índia pediram a remoção de uma desenho feito a mão do profeta Maomé. Como o conteúdo não violava nenhuma das regras do Facebook, mas infringia uma lei indiana que proíbe o compartilhamento de qualquer imagem do profeta, o material deixou de aparecer para os usuários do país, mas continuou sendo acessado pelo resto do mundo.

Twitter

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Em relação ao Twitter, o top 5 dos países com mais pedidos é composto por Turquia (30.183), Rússia (11.570), França (3.807 ), Índia (1.406) e Japão (1.375 ). O Brasil está na 12ª colocação, com 436 pedidos de remoção.

Os exemplos de pedidos enviados ao Twitter são um tanto mais complexos, e vão desde remoção de conteúdo que glorifica terrorismo (feito pela França após os ataques que ocorreram no país em 2015) até solicitação de retirada de tweets por difamação de figuras políticas (feitos pela Turquia).

Wikipédia

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Em relação à Wikimedia (o grupo responsável pelo gerenciamento da WIkipédia), os países que mais efetuaram pedidos de remoção de artigos foram os Estados Unidos (797), a Alemanha (305), França (199 ), Reino Unido (175 ) e Itália (89). Assim como no Twitter, o Brasil se encontra na 12ª posição, com 37 pedidos.

Os motivos para a remoção dos conteúdos da Wikipédia são os mais complexos e a enorme maioria deles não é acatado pela empresa, pois ela considera esses pedidos como uma violação da liberdade de imprensa. Um exemplo aconteceu em 2013, na França, onde uma agência de inteligência do país ameaçou de prisão um dos moderadores da Wikipédia pela publicação de informações sobre uma suposta base secreta dos militares franceses. O problema era que essa base não era mais secreta, já que os militares não apenas já haviam falado dela em entrevistas, como até mesmo conduziram uma equipe de repórteres para fazerem um tour nas dependências. Por isso, a Wikimedia se recusou a acatar ao pedido.

Microsoft

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O último medidor utilizado pela Comparitech são os pedidos de remoção enviados à Microsoft. No caso da empresa de Bill Gates, são registrados apenas as solicitações de conteúdos referentes à violação dos termos de uso de programas da empresa ou às leis do país. Logo, ela não leva em conta pedidos de remoção de conteúdo para proteção individual, como “pornô de vingança” ou violação de direitos autorais.

Como a Microsoft tem os registros mais recentes de todas as empresas, datados apenas a partir de 2015, muitos países não aparecem na listagem - e o Brasil é um deles. O país com mais pedidos de remoção é a China, que soma 3.732 solicitações, seguido pela França (685), Reino Unido (535), Rússia (179) e Holanda (94).

Entendendo esses números

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Apesar do maior número de pedidos de remoção, no geral, ser da Índia, o fato de mais de 90% deles terem sido feitos apenas ao Facebook mostra que o país não tem tanto interesse assim em censurar a internet do país como um todo. A preocupação do governo indiano é apénas com o uso da rede social de Zuckerberg.

Assim, três outros países aparecem como claros “censores” da população, pois aparecem entre os primeiros em praticamente todas as plataformas: a Turquia, a Rússia e a França.

A presença da Turquia e da Rússia não é uma surpresa para ninguém, afinal ambos são comandados por líderes autoritários, que abertamente censuram a população e perseguem opositores do regime. Mas a presença da França é uma enorme surpresa, por se tratar de um país com bases democráticas muito bem consolidadas.

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Mas o caso francês pode ser entendido se considerarmos que preocupações com a segurança nacional foram o principal motivador dos pedidos efetuados pelo país. Além disso, 50% das solicitações no período estudado aconteceram no ano de 2015, quando a França foi alvo de diversos ataques terroristas cometidos pelo Estado Islâmico. Logo, é muito provável que a maior concentração de pedidos de remoção de conteúdo tenha a ver com o planejamento e a glorificação dos atentados.

Já o caso do Brasil, não é possível acessar os dados de todas as empresas que fizeram parte do estudo. Mas ao verificarmos o relatório de transparência da Google é possível notar que são três os principais motivos para os pedidos de remoção enviados à empresa: difamação, proteção à privacidade e segurança e violação das leis eleitorais.

Como dois desses motivos (difamação e violação das leis eleitorais) estão diretamente ligados a campanhas difamatórias e de desinformação (e isso fica claro por um crescimento nesses pedidos em todos os anos pares, quando acontecem as eleições municipais e federais), é possível dizer que um dos motivos que coloca o país entre aqueles que mais tentam censurar a internet é o compartilhamento das fake news, algo que se tornou um enorme problema em todo nosso processo eleitoral.

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Agora o caso da China - amplamente conhecida pelo nível de censura imposta a sua população - o fato dela só aparecer na lista de pedidos enviados à Microsoft tem uma explicação simples: a empresa de Bill Gates é a única das estudadas que tem permissão para operar no mercado local. Como o acesso a Google, Facebook, Twitter e Wikipédia é completamente proibido no país, não há motivos para o governo enviar pedidos de remoção de conteúdos postados por seus cidadãos.

Fonte: Comparitech