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Prévia | The Signifier mistura investigação com psicologia e regulação

Por| 02 de Setembro de 2020 às 10h10

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Divulgação/Raw Fury
Divulgação/Raw Fury

Caso pudesse realizar um backup de toda a sua memória, com direito também às emoções, você faria isso? Mesmo que esse volume de dados estivesse sob o guarda-chuva de uma corporação e não tivesse absoluto controle sobre ele? E se o arquivo fosse usado após sua morte para desvendar o mistério dela, mas junto, também revelasse seus segredos e medos mais profundos? Em The Signifier, o jogador está bem no meio de tudo isso.

O game desenvolvido pelos chilenos da Playmestudio e distribuído pela Raw Fury é descrito pelos produtores como uma aventura tech noir. Em primeira pessoa e com foco na narrativa e na investigação, a obra tem um quê de ficção, mas como toda boa extrapolação desse tipo, carrega consigo um aspecto político bastante real e conectado ao mundo em que vivemos. Afinal, quais são os limites da privacidade no uso de uma tecnologia que parece não ter limites sobre o que é visto da cabeça de outra pessoa?

Essa discussão surge em meio à investigação da morte de Johanna, uma executiva de destaque no ramo da tecnologia que é encontrada sob circunstâncias suspeitas. Russell, neuropesquisador e responsável pela tecnologia capaz de transformar elementos abstratos da mente humana em algo (quase) palpável por meio da inteligência artificial, é chamado para avaliar as circunstâncias e viajar pelas memórias da vítima para entender o que aconteceu. Ele próprio está em uma encruzilhada, também, com o financiamento de seu trabalho intimamente ligado ao apoio governamental que recebe, mas o mantém igualmente sob controle.

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A demonstração do título apresentada ao Canaltech focou menos nesse aspecto e mais no que a IA, batizada como Evee, é capaz de fazer, mas sem deixar de lado aquele pé atrás característico de qualquer inovação que se pinta como maravilhosa. A apresentação foi uma sobreposição de elementos, com o apartamento de Johanna no mundo real, após a morte, sendo visto primeiro para, depois, embarcarmos na visão que a executiva tinha de sua própria casa.

“As mecânicas [de The Signifier] têm peso narrativo. Tudo o que aparece tem um propósito e criamos o design dos ambientes de acordo com a psicologia de cada personagem”, explica David Fenner, diretor criativo do jogo. Isso se traduz, por exemplo, no vazio de um escritório de pesquisas cujo protagonista é a própria máquina de leitura dos backups da mente, usado por Russell, ou do apartamento quase inteiramente branco, de vidro e com poucos itens de Johanna, típico de alguém que passa mais tempo no trabalho do que no lar.

Levando em conta essa aparência quase asséptica, elementos como um espelho quebrado em pedaços, remédios espalhados, a cama desarrumada e as manchas de sangue pelo chão mostram que algo anormal aconteceu ali. Hora de seguir para uma segunda camada da realidade, onde vemos o mesmo local a partir das memórias de Johanna e onde o game assume um caráter um pouco mais artístico, quase como uma aquarela em movimento. Entra em jogo, também, o aspecto psicológico de The Signifier e uma de suas mecânicas mais interessantes.

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Da mesma forma que estímulos podem avivar nossa memória enquanto humanos, o mesmo também vale para a representação feita por Evee. Fenner nos lembra que essa é uma adaptação de um conjunto de dados caóticos, o que resulta em falhas na simulação e elementos que podem ser manipulados pelo jogador para auxiliar a inteligência artificial a entender melhor o que está lendo. Um relógio na parece, por exemplo, se transforma em um fragmento incompreensível, mas quando colocado de volta no lugar, abre novas nuances do apartamento visualizado e acaba indicando o caminho para a solução do mistério.

Nessa rota, entretanto, passamos ainda por uma terceira dimensão, se é que a podemos chamar assim. A representação criada pela IA tem duas facetas, a primeira, objetiva, e a segunda envolvendo também as emoções de Johanna, que afetam diretamente a memória e a forma como ela se lembra de ter visualizado as coisas. É na transição entre estes três momentos, feita de forma livre pelo jogador, que ocorre a investigação de The Signifier e, também, se desenrola todo o resto dos temas do game, tão interessantes quanto.

Sessão de análise

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“O ponto do jogo é explorar a subjetividade para encontrar a verdade”, explica o diretor criativo, contrapondo dois conceitos quase opostos com a naturalidade de quem sabe bem o que está fazendo. Cabe também, ao jogador, manter o foco e entender exatamente o que é objetivo, quando se fala da morte de Johanna, e os elementos que são trazidos a partir de traumas de infância ou eventos que mudaram a vida da personagem. Ela, mesmo morta, é uma presença constante no game e, mais do que desvendar o que aconteceu em seus últimos momentos, Russell acaba tendo uma vista de camarote sobre o âmago de seu ser.

A visão de uma garotinha deitada na cama, em posição fetal e presa por teias de aranha, não revela se ela foi morta ou se suicidou, mas traz um elemento a mais para revelar o que a trouxe até aqui. Uma escada leva a um andar superior inexistente no apartamento real, que mostra uma nova visão do apartamento na qual um porta-retrato com um cachorro nos persegue devagar. E em meio a memórias, afetividade e certa melancolia, surge a mão de um segundo indivíduo presente na cena, que nos remete ao que estamos fazendo naquele local.

O que você faz com essa informação, porém, cabe inteiramente ao jogador. A Playmestudio fala de um game com diferentes linhas de história e até mais de um final, cujo encaminhamento depende do quanto o usuário se aprofundar na trama e explorar todas as suas nuances. Quem preferir uma experiência mais objetiva também tem vez, com Evee dando dicas sobre onde estão os elementos que levam a trama adiante.

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Essa, porém, nem seria a melhor forma de se jogar. “The Signifier recompensa quem for observador”, explica Fenner, mostrando também como funcionam as engrenagens da história e sua abordagem política. Aos poucos, a história da morte e vida de Johanna se encontra com a do próprio Russell, que se vê mais envolvido pela saga da moça e, também, diante da mão de ferro de corporações e um governo que desejam se aproveitar de sua criação.

Enquanto memórias são descobertas dentro de memórias, o usuário acaba se vendo diante dos movimentos para regulação da inteligência artificial, mas também entende sua pequenez diante de tudo. “O game permite que o jogador se expresse politicamente e altere o rumo dos fatos. Ao mesmo tempo, rapidamente, perceberá que o futuro da tecnologia é muito maior do que ele mesmo”, completa o diretor criativo. Segundo ele, porém, nada disso indica que é tudo em vão.

A subjetividade da história nos leva além do apartamento, para uma viagem pela infância de Johanna e por sequências de sonho que aparecem ainda mais distorcidas do que a mistura entre memória e sentimento. Aqui, The Signifier assume ares que chegam a lembrar um game de terror, com o que parece ser uma viagem de férias assumindo um caráter completamente sombrio (e que nos deixou ansioso por mais).

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The Signifier chega aos PCs no dia 15 de outubro. Segundo a Playmestudio, versões PS4 e Xbox One também estão em desenvolvimento, mas não têm data de lançamento marcada. Em todas, legendas e textos em português brasileiro estarão disponíveis.