Forza Motorsport quer revolucionar acessibilidade para deficientes visuais
Por Felipe Demartini • Editado por Jones Oliveira |
Ao falar sobre o novo Forza Motorsport, a Microsoft deixou temporariamente de lado os veículos potentes, a simulação e os belos gráficos que todos já sabem que farão parte do título. O anúncio da vez foi sobre acessibilidade e veio com a promessa de revolucionar o contato com o game de corrida para deficientes visuais, possibilitando que eles também aproveitem as pistas, a velocidade e o desafio de maneira integral.
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Desenvolvido lado a lado com a experiência central de Forza Motorsport, o chamado Blind Driving Assist, ou Assistência de Direção para Cegos, em tradução direta, traz uma série de recursos que ampliam a acessibilidade do game. Entre informações sonoras e customizações profundas dos elementos de controle, está o que a desenvolvedora Turn 10 indica como a experiência mais acessível que já criou.
O formato vai funcionar em todas as opções de jogo disponíveis, desde as corridas single player até as competições online, e também é compatível desde o joystick convencional do Xbox ou a combinação mouse e teclado até volantes e o controle adaptável do Xbox. Além disso, os jogadores contarão com menus e amplas opções de configuração de indicadores sonoros, alterações de interface e guias, além das já tradicionais preferências relacionadas a assistências de pilotagem e dificuldade.
“A customização é o centro do nosso trabalho. Tudo pode ser ajustado ou até mesmo desligado caso o jogador não precise deles”, explica Brandon Cole, produtor de acessibilidade e jogabilidade em Forza Motorsport. “Ao mesmo tempo, foi bem importante para nós que as assistências não dirigissem o carro no lugar do usuário. A jogabilidade do game está presente de forma integral e os usuários estarão em pé de igualdade em termos de simulação, fidelidade e desafio.”
Essa preocupação é comprovada quando se olha para as diferentes opções disponíveis, que vão desde combinações com todas as opções de física e dirigibilidade ativadas, ao lado das indicações para pessoas cegas ou com baixa visão, até preferências que deixam parte do trabalho para o “computador”. Na outra ponta, há ainda o recurso One Touch Driving, ou Pilotagem com Um Toque, que reduz a quantidade de botões que precisam ser acionados ou a pressão exercida sobre eles, também pensado para os jogadores com dificuldades motoras.
“O objetivo final é a criação de uma experiência que seja certa para cada jogador e também permita que eles experimentem o game a seu modo”, explica Neha Chintala, produtora de acessibilidade e jogabilidade. “Estando rompendo barreiras em algumas áreas e possibilitando que quem já experimentou [games de corrida] tenha mais controle e iniciando uma jornada de acessibilidade para quem nunca teve essa experiência.”
Curva de aprendizado compartilhada
O feedback de jogadores que já experimentaram outras opções do mercado de games de corrida foi essencial para o desenvolvimento dos recursos de acessibilidade de Forza Motorsport. Ao desenvolver o Blind Driving Assist, a Turn 10 teve um contato direto com a comunidade — o próprio Cole, aliás, fazia parte desse grupo, sendo um dos jogadores mais vocais em prol da acessibilidade nos títulos da série.
Belle Utsch, pesquisadora de interfaces e acessibilidade, também é parte desse grupo e relata uma experiência com jogos de corrida desde os idos de Super Mario Kart. Essa jornada vem ao lado da noção de que pouquíssimos títulos do gênero, mesmo hoje, são acessíveis a pessoas com baixa visão como ela, o que impedia um aproveitamento completo.
Nos anos recentes, a postura das desenvolvedoras começou a mudar, mas mesmo Forza Horizon 5, um título que chegou com uma série de opções acessíveis para diferentes tipos de público, ainda tem um longo caminho a percorrer. “O principal, para mim, é que [o game] permite que o jogador erre. Eu não vou jogar maravilhosamente bem por causa da visão limitada, mas poder percorrer a história e retroceder em caso de problemas é um recurso que possibilita a diversão.”
No caso de Utsch, o principal obstáculo está relacionado à visão periférica. Como pessoa de baixa visão, ela aponta sentir dificuldade em observar elementos que estão nas laterais da tela, como indicadores de velocidade, mapas e informações sobre sua colocação em uma corrida. Ao mesmo tempo, elogia opções que facilitam a visualização do que está acontecendo, como modos de alto contraste, recursos de câmera lenta e até a linha guia, que não é necessariamente uma funcionalidade de acessibilidade, mas auxilia na hora de frear, acelerar e saber para onde ir.
“A indústria ainda tem muito o que caminhar, mas pelo menos já iniciou esse processo de deixar os jogos mais acessíveis, pensando fora da caixinha e buscando soluções inovadoras”, aponta, em entrevista ao Canaltech. A ideia de tornar um game de corrida acessível para pessoas cegas pode soar incrível, e realmente é, mas também é algo plenamente possível.
Para Cole, esse processo vai além. Ele é cego e, por conta disso, não apenas sentiu as barreiras de jogar um título de corrida como nunca pôde dirigir um carro de verdade. Por isso, para o produtor, a visão em torno dos recursos de acessibilidade é ainda mais profunda, já que Forza Motorsport pode representar não apenas o primeiro contato com um game do gênero, mas também com o universo dos veículos em si.
É daí que veio a preocupação de manter a fidelidade e física do título, que traz elementos de simulador de velocidade, também nos modos acessíveis. Por outro lado, a introdução do Blind Driving Assist e demais elementos do novo título geram uma curva de aprendizado, com os jogadores com diferentes níveis de deficiência visual devendo experimentar os recursos e escolher quais funcionam melhor para cada um deles, em que intensidade e de que maneira.
“Por nunca ter pilotado, eu não sabia que era preciso diminuir a velocidade nas curvas e pensava que, em um game de corrida, devíamos ser rápidos o tempo todo. A curva de aprendizado vem tanto de entender como o sistema funciona e se acostumar com os indicadores, quanto do próprio funcionamento dos veículos”, complementa Cole. “Os jogos de corrida para cegos são bem básicos e, [em Forza Motorsport], os jogadores também terão que aprender sobre estratégias e acertos de carros em um mundo em que a física está atuando de forma realista.”
Na ponta dos dedos
Ao conversar com o Canaltech, Utsch não conhecia as inovações que estão prestes a chegar ao game da Turn 10, já que as informações ainda não podiam ser reveladas ao público. Durante a apuração, foi curioso notar como a principal indicação de melhoria feita por ela para melhorar a experiência de um game como Forza Horizon 5, por exemplo, foi justamente o ponto principal da experiência com o Blind Driving Assist.
“Avisos sonoros nas ultrapassagens e curvas ajudariam bastante e são a principal questão”, indica ela, citando o exemplo de Mario Kart. Não intencionalmente, a Nintendo inclui indicações de áudio quando, por exemplo, o jogador está seguindo na direção contrária da pista, assim como sons diferentes para os carros e itens lançados no circuito. São elementos que auxiliam na orientação, principalmente para quem, como ela, só consegue focar no centro da tela.
“[No Blind Driving Assist], trabalhamos com a diferenciação. Cada sinal de áudio é distinto de forma intencional para que os jogadores possam os separar em suas mentes e não se confundam entre si”, complementa Cole. “Trabalhamos em um sistema que não inunde o jogador de elementos, mas que entregue todas as informações que um jogador cego precisa para vencer.”
O Blind Driving Assist, assim como o One Touch Driving e outros recursos de acessibilidade, estarão disponíveis em todas as versões de Forza Motorsport no dia do lançamento, que ainda não foi revelado oficialmente pela Microsoft, mas deve acontecer ainda em 2023. O título estará disponível para PC e Xbox Series X e Series S.