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Gravidade ao contrário? Entenda a força do "vazio" que empurra a Via Láctea

Por  • Editado por  Rafael Rigues  | 

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Tsaghkyan/Wikimedia Commons
Tsaghkyan/Wikimedia Commons

A nossa galáxia está sendo empurrada por uma força misteriosa, chamada repelente de dipolos, ou repulsor de dois polos. Trata-se de uma área localizada a uma distância de 220 megaparsecs (mais de 700 milhões de anos-luz) da Via Láctea, e coincide com uma região de vácuo, onde não há uma quantidade relevante de galáxias.

Quando pensamos no universo em grande escala, talvez a imagem que nos vem à mente, na maioria das vezes, seja de galáxias em processo de fusão, ou um pequeno grupo de galáxias. Um exemplo é a nossa própria Via Láctea com algumas galáxias satélites, como a Grande e a Pequena Nuvem de Magalhães.

No entanto, há muitas outras galáxias próximas, que formam o nosso Grupo Local, com a Via Láctea e Andrômeda servindo de centro gravitacional para dezenas de galáxias anãs. O Grupo Local, por sua vez, é apenas um dos muitos grupos do Superaglomerado Laniakea.

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Laniakea (a “megalópolis cósmica” onde vivemos) tem alguns vizinhos. O mais próximo deles é o Superaglomerado Shapley, com massa de inimagináveis 50.000.000.000.000.000 (50 milhões de bilhões) de vezes a do Sol. Ele exerce uma atração gravitacional incrível sobre seus arredores.

Por causa do Shapley, todas as galáxias, incluindo a Via Láctea, estão se movendo em direção a este atrator. Acontece que, ao observar o movimento dessas mega-estruturas, os astrônomos se depararam com uma conta que não fechava: a força gravitacional de Shapley não explica a velocidade de 631 km/s do nosso Grupo Local.

Pois é, embora a Terra pareça muito rápida, movendo-se a 30 km/s ao redor do Sol, essa velocidade é nada comparada às grandes estruturas. O Sistema Solar, por exemplo, gira em torno do centro da Via Láctea a 230 km/s, o que ainda é menos da metade da velocidade do Grupo Local.

Mas se a massa de Shapley não é suficiente para explicar a velocidade do Grupo Local, qual explicação poderíamos ter? Outro superaglomerado na mesma região? Bem, segundo os autores de um estudo anunciado em 2017, parte desse movimento ocorre graças a uma região oposta a Shapley — uma força repulsiva que nos empurra.

Gravidade ao contrário?

Pode parecer tentador supor que essa força repulsiva é resultado de algum tipo de matéria exótica capaz de criar coisas como buracos de minhoca, mas a realidade é um pouco menos emocionante. A força repulsiva é apenas uma região muito vasta de vácuo galáctico, ou seja, onde não há nada. Pense nele como os furinhos em uma massa de pão.

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Lembre-se que a gravidade nunca é repulsiva, até porque nunca conseguimos encontrar a matéria exótica em tamanha quantidade. O repulsor de dois polos é simplesmente a ausência de massa em um dos lados da região onde nos encontramos.

Imagine se tivéssemos um número igual de massas uniformemente distribuídas em todos os lugares e direções do universo. Se adicionarmos uma massa extra a uma certa distância à esquerda, seremos atraídos para a esquerda, porque ali haverá maior força de atração gravitacional. Mas e se removermos massa à direita?

O resultado seria o mesmo: seríamos atraídos para a esquerda, porque o lado direito não poderá atrair nosso Grupo Local de galáxias com tanta força quanto o lado esquerdo. Imagine agora se tirarmos toda a massa de uma vasta região à direita. Teremos a maior força de atração de um lado e de repulsão do outro, simultaneamente.

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Cientistas descobriram que o vácuo vizinho ao nosso Grupo Local é o responsável por aumentar a nossa velocidade na direção do superaglomerado Shapley, mais ou menos como se estivéssemos dentro de um hambúrguer cósmico. De um lado, somos atraídos pela gravidade de Shapley, e do outro somos empurrados para essa mesma direção.

Após a descoberta, os astrônomos deram um nome a essa força que nos empurra: repelente de dipolos (ou repulsor de dois polos). Todo esse complexo, desde o atrator Shapley até o repulsor (passando pelo nosso Grupo Local), cobre quase 1,7 bilhão de anos-luz.

Não foi encontrada nenhuma concentração de massa neste vácuo, nem mesmo qualquer tipo de matéria negativa (que teria o efeito contrário à atração gravitacional). Isso levou os cientistas à conclusão de que a força repulsora ocorre justamente por não haver massa para exercer o “puxão” gravitacional.

É compreensível pensar que tudo isso parece estranho demais, mas foi essa a conclusão dos pesquisadores liderados por Yehuda Hoffman, em 2017. E parece que o repelente de dipolos não é o único — logo após a publicação do artigo, os mesmos cientistas identificaram outra força repulsora, o Cold Spot Repeller.

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Bem, é curioso pensar que as “bolhas” de vácuo no universo são muito comuns entre os filamentos da grande teia cósmica. Isso significa que, assim como as pausas na música são um importante elemento para as composições, os “vazios” têm um grande papel para a formação dessa estrutura.

Fonte: Nature, Starts With a Bang