Como seria o fim do universo causado por instabilidade em campos quânticos?
Por Daniele Cavalcante • Editado por Patricia Gnipper |
Como será o fim do universo? O universo pode terminar não com um Big Crunch, mas com um complexo processo de decaimento de campos quânticos. A boa notícia é que isso aconteceria tão inesperadamente que nem perceberíamos o que está acontecendo. Em um momento, tudo estaria normal, e no outro, puf! Todos os átomos seriam aniquilados. Ou talvez não. Simplesmente não há como prever o que vem depois do decaimento de vácuo falso.
- Como acasos e descobertas guiaram os cientistas do CERN ao Bóson de Higgs
- Por que nosso universo é perfeitamente ajustado? Eis uma possível explicação
Uma das hipóteses mais “populares” de como o universo acabará é o Big Crunch, no qual o cosmos simplesmente deixará de se expandir e a gravidade vencerá as forças misteriosas da energia escura, fazendo com que toda a matéria existente volte a colapsar em um Big Bang. Mas essa não é a única ideia sobre o fim do espaço e do tempo.
Enquanto o Big Crunch usa alguns conceitos da Relatividade Geral e as observações em grande escala, como a expansão acelerada do universo, a hipótese do decaimento de vácuo falso usa princípios da mecânica quântica. Nela, os campos através dos quais as forças fundamentais da natureza atuam deixariam de “funcionar” corretamente.
O fim do universo no vácuo metaestável
Há uma série de conceitos teóricos (já comprovados observacionalmente) e hipotéticos (ainda não observados) por trás da ideia de um decaimento de vácuo falso, a começar pelo próprio significado de vácuo falso — trata-se de um vácuo hipotético que é estável, mas não completamente estável. Os físicos chamam isso de metaestável.
Isso está diretamente relacionado com os níveis de energia. Tudo tem um nível de energia — quanto mais alto o nível, mais energia entrará no sistema. Algo que pode ser queimado, por exemplo, tem um alto nível e, quando queimado, libera a energia química armazenada nas ligações moleculares.
Toda a matéria no universo e os campos quânticos contém diferentes quantidades de energia e querem se tornar estáveis. Mas no caso dos campos quânticos, que permeiam as partículas, essa estabilidade é o chamado estado de vácuo. Acontece que em vez de obter um vácuo, o campo de Higgs pode grandes quantidades de energia que não podem ser libertadas. Isso resulta em um estado metaestável e em um falso vácuo.
E o que é exatamente a metaestabilidade? Imagine a seguinte situação: uma bola está parada no fundo de um buraco, na borda de outro buraco ainda mais fundo, como uma cratera dentro de outra cratera maior. Se a bola for apenas empurrada sem muita força, ela se acomodará novamente na parte mais profunda do buraco onde estava.
Por outro lado, um empurrão forte pode fazer a bola rolar por cima da crista da cratera interna e cair no segundo buraco, mais profundo que o primeiro. Uma bola de basquete rolando pelo aro antes de cair dentro da cesta é outro exemplo de metaestabilidade, assim como os pinos de boliche balançando por um momento antes de tombar completamente.
Forças fundamentais unidas novamente
As quatro forças fundamentais — gravidade, força fraca, eletromagnetismo e força forte — nem sempre foram separadas. Nos primeiros momentos após o Big Bang, elas eram unidas, mas à medida que o universo se expandia e resfriava, os campos quânticos passavam por transições de fase, dividindo-se um por um.
A última separação foi quando a força eletromagnética se separou da força fraca. Essa divisão deu origem ao fóton e aos bósons W e Z, os portadores dessas duas forças. Desde esse evento, tudo ficou estável por mais de 13 bilhões de anos, mas o mundo dos campos quânticos é imprevisível. E quem separa a força eletromagnética da fraca e o que mantém essa divisão hoje, é o campo de Higgs.
Lembra que as coisas no universo buscam a estabilidade com níveis de energia baixos? Quanto mais massiva for uma entidade quântica, mais instável ela é, por isso as partículas massivas decaem em outras mais leves. Se o Higgs não for tão estável quanto se imagina — se ele for metaestável — ele pode se transformar em outra coisa algum dia. No que isso resultaria? Isso mesmo, a reunião das forças eletromagnética e fraca. Ou não. Depende do que o campo se tornaria.
Essas são apenas hipóteses não confirmadas, mas medições do Higgs apontam que sua massa o coloca entre o "realmente estável" e "ops, talvez não tão estável”. Exatamente como aquela bola de basquete girando no aro ou os pinos de boliche balançando. Não sabemos se a bola entrará no cesto ou cairá do lado de fora, ou se os pinos cairão ou ficarão em pé.
No caso dos campos quânticos, em especial o Higgs, essa aparente metaestabilidade pode significar que o universo ainda vai durar alguns bilhões de anos, ou que o campo já está começando a decair. E o que viria após essa transformação? Difícil dizer. Pode ser que os campos quânticos subjacentes encontrem uma configuração nova e mais estável, ou podemos ter um universo com forças e partículas completamente novas. Talvez a vida como a conhecemos se torne impossível.
Essa região onde o campo de Higgs começa a decair surgiria como uma espécie de bolha, que se propagaria para fora quase à velocidade da luz. Essa transição para um “novo” e desconhecido universo é a tal "falsa decadência do vácuo" que poderia trazer o fim de todas as coisas que conhecemos. Ou pode realizar apenas um pequeno ajuste na física, como na massa de neutrinos.