Como o Sol "pega fogo" se não tem oxigênio no espaço?
Por Daniele Cavalcante • Editado por Patricia Gnipper |
Muita gente pensa que o Sol pega fogo, mas isso não é tecnicamente correto. O Sol está em constante “queima”, assim como todas as estrelas do universo, mas não do mesmo jeito que acontece com objetos aqui na Terra. Lá, ocorre uma reação de fusão nuclear, enquanto uma fogueira de festa junina é apenas ao nível molecular, sem afetar os átomos individuais da lenha.
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Estrelas pequenas como a nossa passam quase toda a vida esmagando átomos de gases leves, como hidrogênio e hélio, para fundi-los e formar elementos mais pesados. É assim que a maior parte da tabela periódica do universo é formada, por sinal — no interior das estrelas.
É errado dizer que o Sol pega fogo
Em um processo de fusão nuclear libera uma grande quantidade de energia contida nos átomos. Quando a fusão de incontáveis átomos ocorre em uma “bola” imensa e pesada como o Sol, um “incêndio” é inevitável. Mas é muito diferente de uma vela acesa, que precisa de oxigênio. Na verdade, estrelas fabricam oxigênio, em vez de consumi-lo.
Para se ter uma ideia, a cada segundo o Sol funde cerca de 600 milhões de toneladas de hidrogênio em hélio. Parte dessa massa é convertida em energia na forma de ondas eletromagnéticas, que são as mediadoras da luz, raios infravermelhos e ultravioletas, e todo o resto do espectro eletromagnético.
São cerca de 4 milhões de toneladas convertidas em energia a cada segundo, e é isso que mantém nosso Sol brilhando — e continuará assim pelos próximos 6 bilhões de anos, aproximadamente. Há muito mais em jogo para possibilitar esse processo, como a densidade da estrela e o campo gravitacional, que “empurra” os átomos mais leves em direção ao centro para serem esmagados.
Contudo, o termo “queimar” pode ser um pouco enganoso e, por isso, é preciso ter em mente que a energia liberada pela fusão nuclear é bem diferente do fogo produzido em um incêndio aqui na Terra, por exemplo. Aqui, a queima é a base de carbono e depende de oxigênio porque se trata de uma reação química na qual moléculas se combinam.
Na combustão de carbono, os átomos de carbono da lenha (ou qualquer outro combustível) movem-se para perto dos átomos de oxigênio no ar, e eles unem para formar dióxido de carbono e monóxido de carbono. Dois átomos se combinando para formar uma molécula é bem diferente de fundir os núcleos de dois átomos para criar outro elemento.
Se estiver confuso, basta lembrar que uma fogueira na Terra jamais criará carbono, apenas combinará o carbono já existente no combustível com o oxigênio no ar. As estrelas gigantes, por outro lado, podem criar carbono após fundir os primeiros elementos da tabela periódica.
Existem outras reações químicas em um fogo à base de carbono, mas a combinação dos átomos de carbono e hidrogênio é a principal. Essa combustão libera energia que chamamos de calor, além da luz da chama. Mas se não houver mais oxigênio para se combinar com o carbono, a combustão será interrompida.
Bomba atômica gigante
As estrelas não dependem de nada além do hidrogênio para manter sua energia a base de fusão nuclear. E onde elas arrumam tanto hidrogênio? Bem, elas nascem em nuvens densas desse elemento. É graças a essa densidade que a massa da nuvem começa a se concentrar em um ponto gravitacional mais forte.
Por isso, as estrelas estão mais perto de uma bomba de fusão nuclear do que de uma bola imensa de fogo. Nosso Sol, considerado uma estrela anã, tem uma temperatura central de 16 milhões de Kelvin e uma pressão central de 25 mil trilhões de Newtons por metro quadrado.
O Sol também não possui chamas, como as que vemos na Terra. É que ele fica tão quente com a fusão nuclear que começa a brilhar, assim como um pedaço de metal fica vermelho quando você o aquece. Aqueça esse metal ainda mais e ele ficará azul, assim como estrelas mais massivas e mais potentes que o Sol — as chamadas gigantes azuis.
Por que a fusão nuclear “queima”?
Existem duas forças fundamentais em jogo no núcleo de um átomo: a força eletromagnética e a força nuclear forte. A primeira é repulsiva, porque os núcleos atômicos são formados por partículas de carga positiva (prótons) e neutras (nêutrons), e, por isso, devem se repelir. Mas a força forte atua para mantê-las unidas.
Quando dois núcleos estão distantes o suficiente, a força eletromagnética repulsiva domina, mantendo os núcleos separados. À medida que se aproximam, a repulsão eletromagnética fica mais forte, tornando cada vez mais difícil espremer os núcleos um contra o outro. Mas se houver pressão o suficiente (no caso das estrelas, gravidade), os dois núcleos se aproximam mais, até a força forte dominar.
A força forte só não entrou em jogo antes porque ela é de curto alcance, enquanto a força eletromagnética é de longo alcance e fica mais forte com a aproximação dos núcleos. Mas a partir de uma determinada distância, a força forte é tão dominante que os núcleos são atraídos e se fundem, liberando energia em ondas eletromagnéticas, principalmente no comprimento de raios gama.
Esses raios gama não chegam intactos à superfície do Sol, mas são absorvidos pela própria estrela no caminho e convertidos em outros comprimentos de onda. Os fótons — as partículas que carregam a força eletromagnética — são absorvidos e emitidos tantas vezes pelos átomos do Sol que podem levar mais de 100 mil anos para viajar do núcleo estelar até serem emitidos na forma de luz e calor para o espaço.
Fonte: Departamento de Astronomia da Universidade Cornel, Space.com, Starts With a Bang