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Buraco negro criado em laboratório fortalece teoria da Radiação Hawking

Por| Editado por Patricia Gnipper | 10 de Março de 2021 às 12h05

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DESY Science Communication Lab
DESY Science Communication Lab

Em 1974, Stephen Hawking publicou uma teoria revolucionária, mas muito difícil de ser comprovada. Ele afirmou que buracos negros emitem uma radiação devido a efeitos quânticos, o que implica em algo muito estranho: os buracos negros podem simplesmente evaporar até desaparecer. Esse efeito ficou conhecido como Radiação Hawking, mas ela seria tão fraca que é impossível ser detectada no universo. A menos, claro, que você faça seu próprio buraco negro em casa.

Bem, não podemos criar um buraco negro real, mas é possível fazer algo análogo, bem pequeno e inofensivo. Foi essa a ideia de um grupo de pesquisadores que tenta verificar se a hipótese de Hawking está correta. Se estiver, trata-se de uma física que pode unificar — ao menos um pouquinho — a Teoria da Relatividade Geral de Einstein e a física quântica. Há décadas cientistas elaboram hipóteses que cumpram esse papel, mas nenhuma delas pode ser verificada através de observação direta.

Com as pesquisas da equipe do Instituto de Tecnologia Technion-Israel, entretanto, a Radiação Hawking poderia ser observada diretamente através de um objeto análogo a um mini buraco negro, feito em laboratório. Não há motivos para se preocupar, pois se trata apenas de um experimento que imita algumas características dos buracos negros. O resultado está longe de ser um devorador de estrelas — embora haja muito calor envolvido.

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Essa mesma equipe já havia realizado experimentos como este em duas outras ocasiões, para testar as teorias de Hawking. Na verdade, eles repetem os testes milhares de vezes, desde 2016. Em 2019, eles conseguiram observar algo semelhante ao que seria a Radiação Hawking, então o experimento mais recente incluiu também outra característica dessa radiação postulada por Hawking: ela não muda em intensidade com o tempo, ou seja, é estacionária.

Resumindo a radiação Hawking

Na teoria da relatividade, os buracos negros são mais ou menos simples. A gravidade desses objetos minúsculos é tão poderosa que nem mesmo um fóton de luz pode escapar de seu alcance, uma vez que ele cruza o ponto de não retorno, conhecido como horizonte de eventos. Para escapar dali, uma partícula teria que viajar mais rápido do que a velocidade da luz — o que seria violar as leis da física que conhecemos. Por isso é difícil imaginar como uma partícula seria capaz de sair de um buraco negro para formar a Radiação Hawking.

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Entretanto, Hawking mostrou que os buracos negros ainda podem emitir uma “luz”, ou radiação, espontaneamente, devido a algo chamado "partículas virtuais". Para compreender isso, é preciso lembrar que o universo não é um grande vazio, mas um imenso mar de partículas que surgem e desaparecem constantemente. Estamos falando do Princípio da Incerteza de Heisenberg, que prevê flutuações quânticas de vácuo, onde pares “gêmeos” de partículas se formam por instantes brevíssimos, apenas para se anularem — pois se trata de uma partícula e de uma antipartícula. Ao se desintegrarem, anulam a energia necessária para sua formação, mantendo a energia do universo em ordem.

Bem, se isso for verdade, uma dessas duplas de partículas poderia surgir perto de um buraco negro. Há, então, uma chance de que uma delas seja puxada para dentro do horizonte de eventos antes de ser desintegrada, o que “liberta” a outra partícula “gêmea”. Elas não podem mais se anular, porque uma delas não pode mais escapar do buraco negro para interagir com a outra. Acontece que a energia para isso vem do próprio buraco negro — ou melhor, a partícula absorvida, tendo energia negativa, subtrai uma minúscula energia na forma de massa do buraco negro, de modo que ele lentamente perde energia e massa nesse processo. A partícula restante será a tal Radiação Hawking.

"Buraco negro" caseiro

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O análogo de buraco negro criado pelos cientistas é feito de algo chamado de condensado de Bose-Einstein — um estado da matéria formada por bósons que chegaram uma temperatura muito próxima do zero absoluto. “É como se elas estivessem unindo os braços e se comportando como um objeto harmonioso”, explica o físico David Aveline, do Laboratório de Propulsão a Jato da NASA, em Pasadena, Califórnia (ele não fez parte deste estudo).

Nesse estado, uma grande parte dos átomos atinge o mais baixo estado quântico, de modo que os efeitos quânticos podem ser observados, por isso é ideal para tentar encontrar a Radiação Hawking. Os cientistas criaram um condensado de Bose-Einstein capturando oito mil átomos de rubídio ultrafrios, e usaram um feixe de laser para gerar uma cascata supersônica de gás dividida de modo semelhante a um horizonte de eventos, separando a área mais densa da área menos densa (representando a parte de fora e de dentro do buraco negro).

Neste experimento, a equipe procurou por pares de partículas chamadas fônons, ou ondas sonoras quânticas, formando-se espontaneamente no gás. Em outras palavras, eles queriam ver o Princípio da Incerteza de Heisenberg acontecer naquela miniatura de horizonte de eventos. Eles descobriram que um fônon na metade mais lenta do experimento poderia viajar contra o fluxo de gás, enquanto o fônon na metade mais rápida ficava preso por causa da alta velocidade do fluxo supersônico do gás.

De acordo com Jeff Steinhauer, um dos coautores do estudo, “é como tentar nadar contra uma corrente que é mais rápida do que a velocidade com que você pode nadar”. Essa analogia também serve para buracos negros reais — uma vez dentro do horizonte de eventos, é impossível “correr” rápido o suficiente para sair dele. E foi exatamente esse o comportamento das partículas gêmeas de fônons formadas no experimento: uma delas estava livre, onde o fluxo era mais lento (subsônico), enquanto a outra ficou presa pelo fluxo ultrassônico.

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Essa era, no entanto, a parte mais fácil do experimento. A próxima etapa era observar se os fônons que surgiram tinham relação com a teoria de Hawking. Para isso, eles tiveram que repetir o processo várias vezes, porque toda vez que eles capturavam uma imagem do mini buraco negro, ela era destruída pelo calor gerado no processo. Foram necessárias 97.000 repetições, por mais de 124 dias, até que obtivessem um resultado satisfatório. "Nós mostramos que a radiação de Hawking era estacionária, o que significa que ela não mudou com o tempo, que é exatamente o que Hawking previu", disse Steinhauer. O estudo foi aceito para publicação na revista Nature.

Fonte: Space.com