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Crítica | The Vow explica a seita assustadora que envolveu atriz de Smallville

Por| 09 de Novembro de 2020 às 10h40

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Divulgação: HBO
Divulgação: HBO

Nos dias de hoje, não é difícil encontrar mensagens motivacionais em todo o canto da internet. Também não é difícil, pelo menos uma vez na vida, receber uma mensagem sobre uma proposta incrível de trabalho camuflada pelo termo "marketing multinível" que, na prática, consiste no famoso e ilegal esquema de pirâmide. Agora, imagine tudo isso junto.

Essas abordagens foram as responsáveis por unir uma vasta quantidade de pessoas nos Estados Unidos interessadas em crescer na vida e descobrir seus propósitos no mundo. E não estamos falando apenas de pessoas anônimas que buscam por uma mudança em suas existências, como também astros de Hollywood que pareciam já estar bem certos em relação às suas carreiras.

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Tudo isso que você leu acima é apenas o pontapé inicial de uma empresa que fez tanto sucesso que acabou se tornando uma perigosa seita, que ficou conhecida na mídia após o envolvimento da atriz Allison Mack, que por anos protagonizou a série Smallville, acusada de comandar um esquema de tráfico humano e de exploração de mulheres. A história que chegou até essa notícia é toda contada na série documental The Vow, que finalmente ganhou o seu último episódio no HBO GO.

Atenção: esta crítica contém spoilers da série documental The Vow!

Antes de começar a assistir à The Vow, a HBO poderia deixar um alerta: contém doses elevadas de conversas motivacionais e inacreditáveis. A série documental conta a história de Keith Raniere, um empresário que se autodeclara hiper inteligente, com QI 240, que fundou a empresa NXIVM, de marketing multinível, ou seja, de pirâmide. Crescendo absurdamente dentro dos Estados Unidos, o "gênio" aproveitou o discurso de sucesso já usado nessas táticas e criou uma divisão chamada ESP (Executive Success Programs), que na tradução literal seria algo como Programa de Sucesso Executivo.

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Essa divisão consiste inteiramente em um programa de autoajuda, com a promessa de fazer as pessoas descobrirem seu valor na sociedade, acreditarem nelas mesmas, não terem medo de enfrentar as diversidades da vida, entre outras questões bem aprofundadas. Dentro desse grupo, as pessoas que mais se envolvem nas atividades vão conquistando diferentes níveis de sucesso, que são representados por faixas de tecido de diferentes cores e quantidade de listras.

Cada cor e quantidade de listras representando níveis diferentes, esses participantes acabam sendo responsáveis por recrutar mais pessoas, ganhar cargos dentro da empresa, criar seus próprios programas e conduzir palestras. Até então, parece estar tudo bem, uma vez que o ESP parece estar funcionando e trazendo a confiança em si tão buscada por esses participantes. Porém, a cada vez mais eles começam a investir seu próprio dinheiro na empresa, geralmente não ganhando nada por isso e se distanciando da vida real, uma das características de seitas.

Essas pessoas se afastam de familiares e amigos, que muitas vezes flagraram a má intenção da empresa assim que eles entraram, deixando de lado também suas carreiras e seus objetivos de vida, e se veem presas no ESP e na companhia de Keith Raniere. Para mostrar o quanto o discurso do empresário é uma grande isca, os produtores do documentário não economizam nas falas do próprio, uma vez que existe uma grande quantidade de imagens gravadas com depoimentos do líder e dos participantes, facilitando bastante o trabalho de buscar e unir as informações.

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Em meio às imagens reais do trabalho da NXIVM e do ESP, o documentário vai construindo a imagem de Keith e em como as pessoas buscam pela sua aprovação. A relação entre o líder e seus preferidos chega a ser surreal de tão íntima, ao mesmo tempo em que é intimidadora. A história é contada com foco em três ex-membros da seita, altamente envolvidos em desmascarar a empresa, e na mãe de uma das envolvidas, uma das preferidas de Keith e influenciada por Allison Mack.

Esse grupo é mostrado de forma a mostrar o quão corajosos eles são, e não com a finalidade de fazer com que o público fique indignado em como eles caíram nesses discursos. Eles mesmos não têm vergonha de contar seus envolvimentos na empresa, alguns deles permanecendo por mais de uma década, e revelam seus traumas e superações logo depois que a ficha começou a cair. Não era fácil sair desse grupo, pois assim como todas as seitas, a sua vida nunca mais vai ser a que era antes e eles nunca vão te deixar em paz.

A parte mais revoltante é de quando as suspeitas de que algo maior estava surgindo começam a ser contadas, após um episódio focar bastante em Allison Mack. As gravações com depoimentos da atriz e das conversas com Keith são momentos esquisitos de assistir por quem já sabe pelo motivo no qual ela foi indiciada. É possível ver em seus olhos a admiração pelo líder, que conseguiu a manipular com sucesso, permitindo que ela fosse a pessoa ideal para executar o seu plano mais cruel e assustador.

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É quando uma das pessoas que deixou a seita e que se movimentou para desmanchar o esquema, Sarah Edmonson, conta que teve seu momento de lucidez após ser convidada para participar do esquema secreto de Allison e Keith, apresentando o momento mais surpreendente de toda a série documental, que já estava cansativa com tanto discurso motivacional. Sarah denunciou que a organização, criada apenas para mulheres, funcionava também como uma pirâmide, mas mais perigosa, com cada participante recrutando escravas que as chamavam de mestres e que serviam a Keith e Allison.

Essa escravidão envolvia a contagem de ingestão de calorias, pedidos de permissão para fazer as atividades do dia a dia, além da exigência do envio de provas que poderiam ser usadas contra as participantes. Essas provas, chamadas de "collateral", eram nada menos que garantias, conquistadas com abuso e pressão psicológica, para que todas as ilegalidades e absurdos não saíssem dali. Então, fotos nuas ou reclamações da família, por exemplo, seriam garantias de que elas nunca deixariam a seita, caso contrário esse conteúdo seria divulgado. Porém, o fator mais importante que classificou esse grupo como uma organização criminosa foi a marcação feita nas mulheres, deixando perto da virilha uma mistura das iniciais de Allison Mack e Keith Raniere.

Após o esquema que foi à mídia finalmente ser revelado, The Vow praticamente se transforma em outra série documental, focando nas angústias do grupo citado anteriormente que, definitivamente, foram cruciais em seus esforços para desmascarar a empresa e todas suas atividades. Todos fizeram um trabalho investigativo incrível, de coleta e reunião de provas, que chamou a atenção do jornal The New York Times, um dos periódicos mais importantes dos Estados Unidos.

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Se torna realmente emocionante, e a cada vez mais revoltante, acompanhar o andamento desse plano, até que finalmente é concluído com sucesso com a captura de Keith, que fugiu assim que as denúncias foram à mídia. Junto a ele foi presa Allison Mack, que por anos participou dessa lavagem cerebral que escravizou mulheres para o prazer do líder da seita. Conforma os depoimentos vão revelando quem Keith realmente era e como ele era impecável na manipulação, seus discursos uma vez tão chatos vão fazendo sentido por serem táticas que desviam da verdade e que são capazes de afetar a consciência dos mais vulneráveis.

Ao longo dos episódios é impossível não se ver perdido nas falas de Keith, o que nos deixa tentando entender a sua capacidade de manipulação e nos questionando também se, em algum momento da vida, também não seríamos vítimas desses discursos. E as pessoas manipuladas por ele, são igualmente cruéis ou apenas extremamente vulneráveis a ponto de sentirem que estão certas, que ele é um ser superior que tem razão em querer ter seus desejos supridos com o abuso de mulheres?

Com a exploração completamente desmascarada, vemos diversas falas misóginas de Keith que foram cirurgicamente deixadas para o final, comprovando a sua psicopatia escondida por tantos anos. Em um grupo apenas para homens, o líder da seita menospreza a existência do sexo feminino, prova acreditar que homens são superiores às mulheres, e também humilha pessoalmente aquelas que estão ao seu redor com palavras de revirar o estômago, trazendo a inusitada reação de concordância delas com a fala desse "gênio" tão superior e inteligente, ironicamente falando.

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A série documental se torna mais viciante e interessante por contar com várias imagens de arquivo da empresa e pelos envolvidos no desmanche também registrarem todos os passos desse processo. Além disso, a história ainda é recente e o julgamento de Keith aconteceu há pouco tempo, com o líder da seita sendo indiciado a 120 anos de prisão. The Vow chega ao fim dando espaço para a próxima temporada, que já está confirmada, e com um áudio que parece ser uma ligação de Keith para os produtores do documentário, dando a entender que ele pode ser entrevistado para os próximos episódios.

A série The Vow está disponível em nove episódios no HBO GO e a segunda temporada já está confirmada para 2021.