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Crítica | Radioativo acerta no tom ao mostrar Marie Curie como cientista heroína

Por| Editado por Jones Oliveira | 20 de Abril de 2021 às 21h00

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Exibindo a atriz Rosamund Pike como uma Marie Curie com o rosto iluminado pelo verde da luz da substância que descobriu, Radioativo chegou com um gostinho de filme fantástico à Netflix. O filme é dirigido por Marjane Satrapi (autora e diretora de Persépolis) a partir de um roteiro adaptado da graphic novel de Lauren Redniss, então é claro que tem um bocado de ficção. Mas isso não atrapalha a história, muito mais dependente da atuação de Pike para deixar sua personagem crível, enquanto os demais departamentos criativos ajudavam a criar uma atmosfera Frankenstein que faz todo sentido.

Radioativo é sensacional ao evitar que um raro filme sobre o legado de uma cientista (cujo principal parceiro foi o marido) acabasse contado em um romance água com açúcar como vimos em A Teoria de Tudo. Os Curie condenaram sua saúde por uma descoberta científica que traria inúmeras melhoras para humanidade, mas que também seria a base para as temidas bombas nucleares.

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Atenção! A partir daqui, a crítica pode conter spoilers.

Terror e Coragem

O verde radioativo nos lembra instantaneamente de qualquer substância verde neon de clássicos trash como Re-Animator, mas com o tom de verde do horror gótico que nos remete muito a Frankenstein, o terror sci-fi de Mary Shelley. Embora não tenha elementos comprovadamente sobrenaturais na biografia, vale lembrar que, para a época, as substâncias radioativas recém-descobertas soavam como elementos mágicos, assim como outra magia da época, o cinema.

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A trilha sonora ajuda a criar essa tensão e parece estar sempre indicando que algo vai dar errado. E vai. O filme nos revela os sintomas e os males que acometeram os membros da equipe de pesquisa e, até hoje, a visita turística ao laboratório exige uma série de preparos e equipamentos especiais. O terror que paira sobre Marie Curie, no entanto, não é apenas o da radioatividade, ainda tão pouco compreendida na época.

Desde o princípio do filme a cientista enfrenta o terror social do machismo, interrompido apenas pelas exceções que a cercam e trabalham com ela. Apesar do apoio do companheiro, os traumas são tantos que a personagem constantemente transborda ao viver os dilemas de uma mãe e dona de casa que é também uma mulher estrangeira, livre e vencedora de dois prêmios Nobel conquistados a duras penas.

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Rosamund Pike é essencial para tudo isso. O terror paira no ar como uma sombra que é deliberadamente ignorada, ainda que constantemente reconhecida pela Curie da atriz. Essa é apenas uma das muitas complexidades da personagem, que ganha muito na pele da intérprete. A atriz é a principal responsável por trazer as características que demonstrarão a coragem, a inteligência, a austeridade e uma certa dureza essencial a uma mulher que precisava se impor em um universo tão machista.

Esse misto de vulnerabilidade e força também é um traço que se deve ao trabalho de Satrapi, uma mulher que viveu seus próprios dilemas como estrangeira e vítima de um regime político patriarcal. A diretora também acerta ao interromper a história por imagens anacrônicas do mau uso da radioatividade e por mostrar a beleza mortal da substância, sobretudo na aparição coloridíssima e quase sobrenatural da dançarina Loïe Fuller (que realmente usava substâncias radioativas para criar a estética das suas apresentações).

Legado

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Radioativo não é um documentário e justamente por isso não deve ser tomado como verdade, embora deva servir como incentivo para a busca por uma biografia mais acurada. A questão, no entanto, não é essa. O filme, sendo bom ou não, verídico ou não, é o pontapé necessário para que as pessoas conheçam mulheres cientistas. Temos muitos filmes sobre grandes descobridores e inventores da humanidade, mas infelizmente pouquíssimos nomes são femininos.

Ter, no Top 10 da Netflix, um filme sobre uma cientista real, que enfrentou sociedade e academia para provar que sua pesquisa era importante, certamente é um pequeno marco, um delicioso indício de que o público da Netflix é bastante subestimado. É um sintoma a ser notado, também, que Radiotivo se destaca no catálogo da plataforma em meio ao auge da pandemia no Brasil, plantando a semente da ciência justo no momento em que mais necessitamos desse fascínio.

Radioativo não apenas mantém vivo o legado de Marie Curie, como consegue criar uma obra cativante ao ponto de tornar Marie muito mais do que “simplesmente” a cientista, a transformando, merecidamente, em heroína inspiradora. Novamente, isso se deve também ao trabalho de Pike. A Marie Curie histórica já é uma heroína cujo retrato merece espaço na parede, claro. Em termos de inspiração, no entanto, a personagem de Pike é como uma super-heroína como as dos quadrinhos, alguém que podemos imaginar em pôsteres, camisetas, cadernos e toda sorte de materiais que gostamos de ter para, indiretamente, nos mandar aquela mensagem de que sim, nós somos capazes de qualquer coisa.

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Radioativoestá no catálogo da Netflix.

*Esta crítica não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech.