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Crítica | O Quarto dos Desejos deixa eco que pode ser de decepção ou satisfação

Por| 30 de Junho de 2020 às 11h22

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Bidibul Productions
Bidibul Productions

Ter boas ideias pode ser muito mais comum do que se imagina. Alguns filmes partem de uma premissa promissora, que dá margem para muitas formas de desenvolvimento. Isso, por sua vez, faz cada decisão alimentar a imprevisibilidade. No caso de um terror como O Quarto dos Desejos (disponível no Amazon Prime Video), a tensão é alimentada justamente pelas escolhas que, na base, são ditadas pelo roteiro, mas, no produto final, é construída pela direção; de como ela pensou cada plano da história e a intercalação destes ao próprio resultado final, que, idealmente, precisa corresponder a uma unidade específica pensada por quem dirige – no caso deste filme, Christian Volckman.

A ideia, portanto, é interessante – por mais que não seja original como os créditos iniciais tentam afirmar. O conto A Mão do Macaco (de W. W. Jacobs), no qual o filme é inspirado, tem quase a mesma idade do cinema e já foi tema até mesmo de episódio d’Os Simpsons. Por outro lado, qualquer história pode se tornar atraente a depender da forma que é contada. Inserir o medo, assim, é parte fundamental da contação e, antes disso, da possibilidade de se ter alguma identificação com o que é contado e, principalmente, com particularidades dos personagens.

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Atenção! Esta crítica contém spoilers sobre o filme!

Contextos sem importância

A Sala (título alternativo usado no serviço de streaming) transforma aquilo que atende a desejos em um cômodo de uma mansão isolada, dando ares do subgênero de casa mal-assombrada. A concepção visual do filme é instigante. Volckman tem um apreço por detalhes visuais que vai além do comum. Nesse sentido, o desenho de produção de Françoise Joset (de Holy Lands) tem um papel quase hipnótico e, junto ao departamento de arte, parece fomentar a frieza do lugar: praticamente tudo faz parte de uma paleta fria, sem vida, sendo a única exceção o compartimento de onde parte toda uma misteriosa fiação.

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Por mais que o filme seja visualmente atraente, existe uma pressa exagerada na condução do casal protagonista. Kate (Olga Kurylenko) e Matt (Kevin Janssens) são desenvolvidos sem qualquer uniformidade e por meio de diálogos expositivos. O pior, por essa perspectiva, não é a exposição em si, mas o quanto ela nem mesmo consegue ser efetiva ou interferir na história. Os contextos de ambos – ela como tradutora e ele como artista – pouco importam a não ser para justificar, por exemplo, uma espécie de exibição cultural com o surgimento de obras de Van Gogh e Cézanne. Aliás, praticamente nenhum contexto é importante, sendo até mesmo a descoberta de que os antigos moradores foram assassinados naquele lugar somente um elemento para, gratuitamente e sem aprofundamento, motivar o mistério.

Claro que motivações sempre são bem-vindas, porque elas funcionam para, além de justificar os acontecimentos seguintes, auxiliar o ritmo do que está sendo contado. Mas Volckman parece preso demais à estrutura estética de O Quarto dos Desejos para enriquecer os subtextos muito claros que estão ali e nunca (ou quase isso) recebem qualquer carinho. As consequências da ambição, dos desejos, funcionam, então, como um comentário muito breve sobre a insaciabilidade de quem tem tudo o que quer.

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Frustração ou satisfação

Apesar de tanto, há um embate interessante entre o ter e o ser. No momento em que o pedido à sala é de uma vida, de um filho, o filme parece querer se soltar de amarras e crescer. É uma pena, portanto, que, rapidamente, o acontecimento seja tratado somente como mais um passo em direção ao fim dos 100 minutos de duração. Com tanto a ser explorado, parece que O Quarto dos Desejos fica restrito ao texto, que, não sendo – nem de longe – original, sofre com a falta de profundidade. Do contrário, poderia fazer o resultado ecoar muito mais na mente do público.

Essa reverberação até é tentada a partir de um misterioso teste positivo de gravidez que pode ser fruto de um estupro ou não. Nesse ponto, o terror seria especialmente cruel se Volckman tivesse um domínio da decupagem, do que fazer na escolha de planos e do jogo de efeitos que a intercalação deles (dos planos) pode causar. Mas o resultado, no final das contas, fica à mercê muito mais da sensibilidade do público do que do trabalho realizado. O que poderia ser interessantemente equilibrado talvez não passe de uma história atraente e, estética pela estética, elegante. Fica como eco, de repente, algum tipo de frustração ou, na melhor hipótese, uma satisfação por ter visto algo muito promissor.

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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech