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Crítica Moonfall: Ameaça Lunar | Quando o diretor se torna refém de si mesmo

Por| Editado por Jones Oliveira | 03 de Fevereiro de 2022 às 15h00

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Reprodução/Diamond Films
Reprodução/Diamond Films

Roland Emmerich é o tipo de diretor que se especializou em um tipo de cinema muito específico — o filme catástrofe. De Independence Day à primeira versão estadunidense de Godzilla, passando por O Dia Depois de Amanhã e 2012, ele se tornou referência em como destruir o planeta e criar grandes cenas com grandes monumentos sendo explodidos e a humanidade encarando seu inevitável fim. É o pai da tragédia enquanto entretenimento.

Só que esse foco quase exclusivo a um único estilo é muito arriscado. Ou você se reinventa a todo instante e avança dentro daquela linha ou você cai na armadilha do lugar-comum. E Moonfall: Ameaça Lunar mostra o quanto o cineasta se tornou refém de si mesmo.

O novo filme é basicamente uma caricatura do tipo de cinema que Emmerich vem recriando incessantemente há mais de 25 anos, reunindo todos os clichês do subgênero que o próprio diretor ajudou a criar em uma trama que até chama a atenção, mas não entrega nada muito além daquilo que a gente já viu em tantos outros filmes do cineasta.

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Moonfall é como aquele bolo de chocolate que pode até parecer gostoso, mas você já viu e provou tantos outros bolos iguais que aquele parece já não ter gosto algum.

Seguindo a receita

A maior prova dessa analogia culinária é que, se fossem realmente de bolo, os filmes de Emmerich teriam todos a mesma receita:

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  • O herói desacreditado e que vive em desgraça, mas se torna a última esperança da humanidade — mas que faz isso só para se reaproximar do filho —;
  • A pessoa ligada ao governo e que quer expor a verdade;
  • O teórico da conspiração que sabe toda a verdade e ninguém acredita;
  • O exército americano cheio de segredos e sendo pouco confiável;
  • A família dos protagonistas passando algum perrengue tentando chegar a um abrigo enquanto correm contra o tempo até os heróis resolverem tudo;
  • Coincidências bizarras e forçadas que você só aceita e não pensa muito sobre isso.

É uma fórmula que o diretor já usou à exaustão e que não se importa em repetir em Moonfall. Se por um lado não há problema algum em repetir uma estrutura que sabidamente funciona, também não há como negar que ver a mesma estrutura ser usada sem qualquer tentativa de inovar ou explorar esses clichês de formas diferenciadas não só torna tudo repetitivo como dá a sensação de que estamos vendo o mesmo filme de novo e de novo.

Não por acaso, Moonfall: Ameaça Lunar traz um enorme déjà vu em relação ao próprio Independence Day. Basta substituir a invasão alienígena pela queda da Lua na Terra e estamos falando do mesmo longa. São os mesmos dramas e dilemas dos personagens e as mesmas soluções e viradas de roteiro. E aí não se trata mais de seguir uma receita ao pé da letra: é a mais pura preguiça e falta de criatividade.

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De nada adianta você pintar um brigadeiro de branco, jogar confeitos coloridos ou cobri-lo de bolinhas douradas, pois ainda é um brigadeiro. E é justamente isso que Emmerich tenta fazer em seu novo filme: colocar pequenos adornos e firulas dentro do mesmo filme que ele vem fazendo há 25 anos.

Ainda que tenha bons momentos aqui e ali — a onda de gravidade e a perseguição no meio da cidade são cenas muito boas —, Moonfall é um enorme pastiche desse cinema catástrofe que Emmerich tanto adora. E fica cada vez mais claro que não é um gênero no qual ele se especializou, mas a única coisa que sabe fazer.

O problema é que, depois de a gente passar tanto tempo vendo exatamente as mesmas coisas, os grandes momentos não têm mais o mesmo impacto. As grandes ondas criadas pela proximidade da Lua já se tornaram um lugar-comum tão óbvio que não chegam nem perto de impressionar.

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Quantas vezes já vimos cidades sendo arrasadas por um tsunami no cinema? E meteoros destruindo prédios e construções militares? Isso sem falar de todo o caos social que acompanham desastres assim. Mas como se impactar com essas coisas quando o filme só repete o que já vimos tantas outras vezes?

Aliás, a impressão que fica com Moonfall é que o próprio diretor parecia saber que não seria capaz de criar catástrofes maiores do que aqueles que ele apresentou em seus longas anteriores, como 2012, e decidiu fazer um filme catástrofe em que a destruição e o caos são apresentados muito superficialmente.

Com exceção de algumas poucas cenas envolvendo a família dos protagonistas em sua busca por refúgio, quase não há momentos de coisas explodindo e sendo destruídas, e o filme foca muito mais no aspecto militar e espacial da coisa.

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Era melhor não ter tentado

Para ser justo, Moonfall: Ameaça Lunar até tenta trazer algo novo para seu roteiro. Ele ousa criar um plot twist em seu ato final para justificar todas as teorias da conspiração que ele valida que é tão absurdo que seria melhor que ele nem tivesse tentado. É algo tão maluco e exagerado, misturando deuses astronautas com elementos esotéricos, que é até difícil segurar a risada quando as explicações são dadas.

Não vou entrar em detalhes para evitar spoiler, mas a coisa é maluca não apenas por ser uma ideia absurda, mas por ela não fazer sentido algum dentro do próprio roteiro — tanto que um dos personagens questiona alguns desses pontos, o que força a inserção de mais explicações tão ilógicas quanto.

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Basicamente, a responsável por tirar a Lua de órbita fez isso para acabar com a humanidade. Então por que não atacou a Terra ao invés do satélite? Pois bem, nem queira saber a resposta.

Como se isso não bastasse, essa solução mambembe também serve para dar um boost nos personagens. A trama chega num ponto em que encurrala tanto os heróis que não tem como tirá-los daquela situação sem apelar para um deus ex machina — e acaba criando uma solução quase esotérica para isso. E, mais uma vez, a explicação é “porque sim” e você só aceita.

Discurso perigoso

Como se não bastasse essa sensação de que estamos vendo o mesmo filme que o diretor insiste em lançar desde 1996, esse anacronismo dá a Moonfall um discurso muito perigoso. Emmerich parece estar tão preso no passado que não percebe o quão problemático é glamourizar teórico da conspiração no mundo de hoje.

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Em um momento em que as teorias de grupos como o QAnon trazem consequências reais para o mundo, fazer um filme em que coloca o conspiracionista como o herói e o responsável por revelar ao mundo a verdade é chancelar esse pessoal que, na realidade, já vem se demonstrando perigoso.

Por mais simpático e inocente que o personagem de John Bradley seja no filme, ele representa um tipo de pensamento que está bem longe de ser alívio cômico fora das telas.

Isso só mostra o quanto Emmerich também parece estar descolado da realidade. De tanto pensar em formas de acabar com o mundo, ele deixou de encarar como estão as coisas de verdade por aqui.

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Grande, mas sem sal

No fim, Moonfall: Ameaça Lunar não é um filme ruim, mas sofre muito da falta de criatividade de seu diretor. Ele é tão limitado quanto o próprio Emmerich.

Sem trazer nada de novo, repete tudo aquilo que a gente já viu e já conhece do gênero. E as poucas tentativas de surpreender se perdem dentro da sua própria falta de lógica — e que bastaria alguém pensar um pouco mais nos argumentos propostos para ver que nada daquilo faz sentido.

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É claro que ninguém vai ver um filme catástrofe procurando um Shakespeare, mas Moonfall não consegue entregar nem mesmo aquela farofa bem temperada que a gente espera de quem praticamente criou o estilo. Sem grandes momentos e repetindo todos os clichês possíveis, ele é, no máximo, aquela farinha seca e sem sabor.

Roland Emmerich parece ter se acomodado tanto com o título de mestre da catástrofe que ele próprio se tornou uma. De referência, passou a ser caricatura. Virou refém de si mesmo.

Moonfall: Ameaça Lunar está em cartaz nos cinemas de todo o Brasil; garanta seu ingresso na Ingresso.com.