Crítica: Apanhador de Almas tem boa intenção, mas falta personalidade
Por Jaqueline Sousa |

Quatro amigas entram em uma casa com um destino traçado: testemunhar um ritual sobrenatural que pode alterar completamente a vida de cada uma delas. Afinal, o que poderia dar errado durante o processo? Para as jovens do filme Apanhador de Almas, a resposta é simples e trágica: muita coisa.
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Apostando na onda de sucesso que o terror vem ganhando nos últimos anos, Apanhador de Almas chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (18) para contar a história de um grupo de jovens aprendizes de bruxas que não são nenhum um pouco parecidas com a eterna Sabrina, a Aprendiz de Feiticeira.
Com uma energia pesada e misteriosa, o longa estrelado por Klara Castanho (De Volta aos 15), que faz sua estreia no gênero nas telonas, promete, desde sua primeira cena, uma aventura macabra, sombria e grotesca envolvendo um grupo de quatro amigas que, durante um eclipse solar, decidem visitar a casa de uma mulher misteriosa para presenciar um ritual.
Chegando lá, cada uma leva sua bagagem pessoal para encarar as barreiras entre a vida e a morte. No entanto, elas acabam perdendo o controle da situação quando o ritual é inesperadamente interrompido e uma criatura vinda de outra dimensão é invocada, forçando-as a tomar uma decisão perversa que pode resultar na morte de três delas. Apenas uma pode sobreviver, o que coloca o grupo em uma missão para salvar a própria pele.
Entre a vida e a morte
Brincando com as barreiras do pós-vida, Apanhador de Almas começa com o coração no lugar certo. A premissa instiga o espectador a tentar entender o que as amigas Emilia (Klara Castanho), Olivia (Duda Reis), Isabella (Priscila Sol/Larissa Ferrara) e Mia (Jessica Córes) estão buscando na casa de Rea (Ângela Dip), a bruxa que as recebe para presenciar o ritual misterioso.
Há um clima pesado no ar que colabora com a construção do universo que a dupla de diretores Fernando Alonso e Nelson Botter Jr (O Pergaminho Vermelho) imaginou em colaboração com a roteirista Tarsila Araújo (Os Ruminantes). O problema é que o longa não é ambicioso o bastante para sustentar a proposta que apresenta ao longo de pouco mais de uma hora e meia de duração.
Desde o princípio, nada fica muito claro. Não sabemos muito bem o que aquele grupo de bruxas aspirantes quer, ou qual é a bagagem pessoal que cada uma levou até ali. A confusão é incômoda e, em outros casos do gênero por aí, não chegararia a ser um empecilho. Afinal, às vezes, a beleza da coisa é justamente não entender o que estamos presenciando e, sim, apenas senti-la (David Lynch entendeu isso como ninguém).
Contudo, Apanhador de Almas não tem força para sustentar isso, o que acaba transformando o filme em um apanhado de situações que não despertam qualquer tipo de sensação no espectador. O próprio grupo de protagonistas não recebe qualquer tipo de aprofundamento psicológico ou comportamental que justifique suas ações. Há questões pessoais mencionadas, mas não são trabalhadas o bastante para que a gente se importe com elas à medida que o caos explode na tela.
O comando da dupla de diretores também não se esforça muito para tirar o melhor das atrizes que dão vida às protagonistas, o que acaba prejudicando o nosso envolvimento com seus dramas pessoais. A presença de Rea, a bruxa que acompanha as jovens durante o ritual, também não entrega o mistério e a perturbação que o longa diz ter, fazendo com que as performances sejam caricatas demais (e não de um jeito camp).
Além disso, aquela antecipação amedrontadora do gênero, que nos coloca à flor da pele esperando um susto que pode vir ou não, deixa um pouco a desejar. O filme tem seus momentos mais enigmáticos, com sombras macabras que se escondem e uma iluminação sugestiva, mas é justamente a falta de ousadia que impede o verdadeiro horror de brilhar. Não há personalidade o bastante para sustentar o todo.
Em busca de essência
Apanhador de Almas tem seus méritos por apostar no protagonismo feminino no gênero de terror, formato que anda ganhando novos olhares no cinema mundial com a ascensão de cineastas como Julia Ducournau (Titane) e Coralie Fargeat (A Substância). Aqui no Brasil, ainda temos a diretora Gabriela Amaral Almeida com O Animal Cordial (2017), que conquistou os entusiastas do gênero com uma estética e enredo para lá de macabros.
Diante desse cenário, é interessante ver como Apanhador de Almas, mesmo com seus problemas de ritmo e desenvolvimento, olha para a presença feminina no terror, trazendo um gostinho de brasilidade que deixa o espectador se sentindo em casa.
Todavia, o filme ainda tem dois olhares masculinos por trás e uma certa dificuldade de mostrar que aquelas quatro jovens bruxas são, bem, amigas. A dinâmica entre elas parece forçada, como se elas tivessem se conhecido há dois minutos atrás e não soubessem nada além do nome de cada uma. Infelizmente, isso prejudica ainda mais o desenrolar do drama vivido por elas à medida que o grupo percebe que algo de muito errado está acontecendo na casa de Rea.
Com o desenvolvimento superficial, o dilema mortal enfrentado pelas jovens perde a intensidade que deveria ter na trama, dificultando ainda mais a criação de empatia com o público, algo importante para gerar um vínculo maior com aquilo que estamos vendo na tela.
No final das contas, Apanhador de Almas até tem boas ideias para explorar uma história de terror em território nacional, trazendo mulheres para o centro do show de horrores e vendo como elas lidam com as provações macabras que aparecem no caminho. Contudo, a execução truncada e confusa da trama se sobressai aos pontos positivos da produção, fazendo com que o longa vá perdendo seu potencial em meio a uma narrativa sem essência própria para se sustentar sozinha.
Apanhador de Almas estreia no dia 18 de setembro nos cinemas brasileiros.
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