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Crítica | A Química que Há Entre Nós quase funciona, mas não soa verdadeiro

Por| 26 de Agosto de 2020 às 09h22

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Adolescência é um período complexo e todo mundo que já passou por ela sabe bem disso. É importante conversar com pessoas dessa idade com um misto de compreensão e alerta, mas sabendo que a rebeldia faz parte, pois os clichês sobre a idade só são clichês porque se repetem. A Química que Há Entre Nós (novo filme original do Prime Video) entende bem isso, mas não consegue lidar bem com a linguagem ao ser direta demais sobre o assunto, de um jeito que obviamente não faz muito sentido, afinal, quando foi que você viu um adolescente dizendo “nós adolescentes” e refletindo sobre a adolescência como um adulto?

Isso, provavelmente, é uma herança do livro no qual o filme foi baseado, mas não justifica o roteiro, que poderia ter optado por outras saídas mais verossímeis. A Química que Há Entre Nós passa muito, mas muito longe do nível de discussão que a série Sex Education traz, por exemplo, sem ser direta no roteiro. Com isso quero dizer que o cinema nos permite muitas formas de dizer que a adolescência é complicada sem necessariamente ter que proferir isso, palavra por palavra.

Atenção! A partir daqui, a crítica pode conter spoilers.

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Química?

Há pouco de química na relação entre Grace (Lili Reinhart) e Henry (Austin Abrams) e muito disso se deve ao roteiro. A princípio, A Química que Há Entre Nós é apenas mais um clichê adolescente de como duas pessoas aparentemente distintas podem se apaixonar ao serem obrigadas a passarem por um período de convivência (cursando a mesma disciplina, fazendo algum trabalho juntos...), o de sempre, mas um clichê aceito porque sabemos que os moldes de ensino se repetem todos os anos, permitindo que as mesmas histórias se repitam entre os colegiais.

O início de tudo, quando Henry senta ao lado de Grace no que parece o prólogo de uma repreensão, lembra bastante o momento em que Judy (Natalie Wood) e Jim (James Dean) se encontram na delegacia em Juventude Transviada. Essa referência, se de fato existe, só piora a situação para A Química que Há Entre Nós, já que tem algo de muito errado quando um filme de 1955 reflete mais sobre os adolescentes de hoje que uma obra realmente contemporânea.

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Ainda assim, A Química que Há Entre Nós tem uma história interessante e repleta de ensinamentos, sobretudo aqueles inseridos de forma comicamente mecânica pela irmã de Henry, Mabel (J.J. Pyle), que fala de amor como quem fala de química (claro!). Acontece que, embora seja real a parte química e mesmo que ajude um adolescente a passar pela crise de um final de relacionamento, isso não é suficiente. Nossas emoções (quero crer) são mais do que ações e reações químicas.

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Imprevisível previsível

A atuação de Lili Reinhart é o elemento que sustenta a trama de A Química que Há Entre Nós ao conseguir dar dimensões a uma personagem transpassada pelo luto de um amor em plena adolescência, enfrentando a dualidade de viver presa ao passado e querer aproveitar o presente, que, no entanto, está mergulhado em traumas, questionamentos e, inclusive, uma sequela física. A Judy de Reinhart é, provavelmente, o melhor aspecto do filme e isso é acentuado ainda mais pelo personagem de Abrams, que é convincente pela intensidade dos sentimentos, geralmente exacerbados na adolescência, mas perde muito da veracidade ao parecer tão intelectualizado e tão incoerentemente inocente.

Aliás, a intelectualização dos personagens parece ser, inclusive, uma tentativa de atingir um nicho mais específico de adolescentes, não tão cults ao ponto de construir um indie mais monótono, como acontece com o recente Viena and the Fantomes, mas também não pop e clichê o suficiente para se igualar à maioria dos romances teen, que geralmente apresentam as mesmas estruturas repetidas à exaustão. A Química que Há Entre Nós é um meio termo entre indie cult e romance mainstream, medida que funcionaria muito melhor com um roteiro mais interessante.

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Não é previsível que eles não acabarão juntos e a noção de Judy, de que não é dever de Henry a consertar, quebra as expectativas de que um romance pode curar tudo. Além disso, é bonito como o filme mostra que a superação do fim é difícil, mas que há compreensão de ambas as partes. Ainda assim, soam estranhas e pouco verossímeis as reações de Henry. A somatória do conjunto, enfim, é de uma cartilha sobre amor para estudantes do ensino médio. Uma cartilha com cara de que foi escrita por adultos, mas disfarçada de reflexão adolescente-para-adolescentes.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech