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A Polícia pode exigir o desbloqueio do meu celular?

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Yura Fresh/Unsplash
Yura Fresh/Unsplash

De acordo com dados fornecidos pela Anatel tendo como base o mês de dezembro de 2021, terminamos o ano passado com 253,3 milhões de celulares no Brasil, o que dá a marcante média de 118,38 celulares a cada 100 habitantes. Literalmente, temos mais celulares do que pessoas no país!

Pandemia, PIX, menos dinheiro em circulação e a concentração das nossas vidas nos smartphones explicam, de certa forma, o notável aumento de furtos e roubos de aparelhos celulares.

Em festas e shows nas grandes cidades, não raramente criminosos são pegos com dezenas de celulares subtraídos, tanto é que há casas noturnas que têm como política, na saída, exigir que seu público desbloqueie o celular, como comprovação de que o aparelho que está “de saída” do estabelecimento realmente pertence àquele que está se retirando.

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Tendo como pano de fundo esse panorama e aproveitando a conexão que o tema possui com o que explicamos em outro artigo sobre a filmagem de abordagem policial, desperta curiosidade se a solicitação de desbloqueio do celular durante uma ação policial é legal.

A autoridade policial pode obrigar alguém a desbloquear o celular?

A exemplo do que pontuamos no outro artigo acima mencionado, devemos ter como norte para uma boa análise dessa questão o Princípio da Legalidade (artigo 5º, II da Constituição Federal), que determina que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Pois bem, se não há lei que obrigue o cidadão a desbloquear seu celular durante uma abordagem policial, certo é que ninguém poderá ser compelido a fazê-lo, acaso receba tal solicitação ou ordem ilegal.

Ademais, não bastasse o Princípio da Legalidade que já autoriza concluir pela negativa acaso sejamos instados a desbloquear o celular a pedido da autoridade policial, nossa Constituição Federal contempla proteção à intimidade, vida privada, consagra o Princípio da Ampla Defesa e assegura que não se tenha que produzir prova contra si próprio.

Portanto, havendo coação, intimidação e até mesmo agressão para que o abordado venha a desbloquear seu aparelho celular em verificação policial de rotina, restará configurado o abuso de poder, nos termos da lei.

O policial pode consultar o IMEI do aparelho?

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Questão intrigante é se o desbloqueio se limitar à consulta do IMEI do aparelho, preservando-se a intimidade do usuário e o sigilo dos seus dados. E nesse caso ... havendo por parte do agente público a desconfiança de que o aparelho possa ser produto de furto ou roubo, tem ele o direito de consultar o IMEI digitando *#06#.

Tendo em vista os princípios já explicados acima, a resposta não nos parece muito simples, pelo que convém considerarmos alguns cenários:

  1. Se o aparelho estiver desbloqueado, defendemos que não há problema em que a polícia digite a combinação *#06# a fim de se obter o IMEI e verificar se há registro de furto ou roubo do aparelho. Em caso positivo, deve haver a apreensão do produto, podendo o abordado vir a ser preso em flagrante por crime de receptação. Se vier a confessar ter ele mesmo furtado ou roubado o aparelho, a menos que tenha acabado de cometer o crime, não será caso de flagrante, mas deverá responder inquérito policial e posterior ação penal pelo crime contra o patrimônio praticado.
  2. Se o aparelho estiver bloqueado, conforme explicações acima, não há obrigação para que o abordado realize o desbloqueio, podendo se negar a digitar a senha;
  3. No entanto, não podemos desconsiderar a possibilidade de que o aparelho esteja bloqueado e possa ser desbloqueado mediante reconhecimento facial. Nesse caso, desde que não se submeta o abordado à imobilização forçada, entendemos que se a autoridade policial tiver sucesso ao apontar a câmera frontal do aparelho para a face do abordado, obtendo o desbloqueio do aparelho, a verificação do IMEI será lícita;
  4. Por fim, há ainda a possibilidade de que mesmo sem a cooperação do abordado, venha a autoridade policial a conseguir verificar o IMEI, que em alguns aparelhos está registrado na bandeja que se destina a acomodar o sim-card (chip da operadora) ou em etiqueta aposta no compartimento da bateria do aparelho. Nesses casos, por certo que a verificação do IMEI terá sido válida, legitimando eventual apreensão do aparelho e prisão se se tratar de aparelho proveniente de crime.

Em todas as situações hipotéticas acima descritas, deve ficar claro que a consulta aos aplicativos e aos demais dados do aparelho é vedada.

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Afora a questão do IMEI, que simplesmente dá conta da origem do aparelho, se lícita ou ilícita, qualquer prova obtida sem autorização judicial ou alheia à vontade do abordado deve ser tida como ilícita, vindo a ser desconsiderada.

Exemplo disso ocorreu com um taxista do Rio de Janeiro, que enquanto transportava uma jovem de 15 anos de idade teve o celular vasculhado por policiais militares, que nele encontraram fotografias de adolescentes de calcinha e sutiã, tendo sido acusado de exploração sexual de adolescente. Porém, diante da ausência de autorização judicial e discordância dele frente à análise do seu aparelho celular por parte dos policiais, houve o reconhecimento de que a abordagem policial foi abusiva, motivando a anulação da prova.

Quando o celular pode ser verificado?

Uma vez apreendido o bem do acusado ou réu, mediante autorização judicial para tanto, admite-se a perícia em aparelho celular a ele pertencente a fim de coletar provas que bem possam contribuir com a instrução criminal.

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Portanto, somente através de prova pericial oficialmente decretada é que pode haver a verificação de aparelho celular apreendido por suspeita de ter sido empregado na prática de crime

E se o juiz de direito exigir a senha do celular?

Pelas mesmas razões e com base nos mesmos princípios já apontados acima, nem mesmo se a exigência partir de juiz de direito, há obrigação de que o acusado ou réu revele a senha do seu celular. Não poderá impedir a apreensão do aparelho, muito menos que seja periciado. No entanto, a senha, propriamente dita, é direito que se mantenha em sigilo.

Concluindo, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, assegurando-se a intimidade e vida privada, de modo que legítima a negativa quanto à senha de celular perante pedido ou solicitação de toda e qualquer autoridade.