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Crítica | Sintonizados no Amor contenta-se em ser muito pouco

Por| 12 de Dezembro de 2020 às 15h30

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MarVista Entertainment
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A temporada de filmes de Natal continua na Netflix, que ampliou o catálogo de comédias românticas em meio a neve com Sintonizados no Amor, adquirida com exclusividade pela plataforma de streaming e apresentando um elenco recheado de rostos desconhecidos com gostinho de Sessão da Tarde. Com 86 minutos e um enredo previsível (como todo fã do gênero espera e assiste sem culpa), o filme entrega o tão esperado e fofo final feliz, mas dessa vez saindo um pouco do clima de Natal e entrando nas festas de Ano Novo.

Não é a toa se algumas pessoas sentirem que já ouviram falar desse filme antes. Apesar de ser um recente lançamento da MarVista Entertainment e distribuído pela Netflix, a tradução para o português lembra o clássico romance dirigido por Nora Ephron, Sintonia de Amor (Sleepless in Seattle, no nome oficial) com Tom Hanks e Meg Ryan. A premissa, por outro lado, apresentando dois amigos bem próximos que não se relacionam romanticamente, também pode lembrar a comédia When Harry Met Sally... também de Nora Ephron e estrelado novamente por Meg Ryan.

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Mas diferente de ambas as obras da cineasta especializada num bom romance, Maggie Quinn (Natalie Hall) e Jack Russo (Evan Williams) não são meros estranhos que se conheceram através de um programa de rádio ou numa carona para Nova York, em vez disso, os amigos são apresentadores de um programa local numa estação de Chicago, nos Estados Unidos, e se conhecem há tanto tempo que mal conseguem se lembrar.

Atenção! A partir daqui o texto pode conter spoilers do filme. Leia por sua conta e risco.

Apresentando um programa sobre relacionamentos e romance, Jack e Maggie dividem suas experiências e detalhes vidas afetivas com os ouvintes, revelando as mais íntimas informações sem esboçar um pingo de preocupação com tamanha exposição. Isso não parece preocupar os amigos até a dona da rádio trazer uma proposta quase irrecusável: trazer o programa para ir ao ar em todo o país, e não apenas em Chicago. Mas para isso, há uma condição: os dois devem apresentar seus respectivos companheiros atuais para suas famílias em uma transmissão ao vivo, arriscando tudo sair muito bem ou muito mal.

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Para alguém que expõe tantas confidências numa rádio local, isso não parece ser um problema, mas para Jack e Maggie, acaba sendo. Isso porque ambos possuem a mesma opinião quando se trata de apresentar a pessoa com quem estão namorando para as famílias: sem há uma desculpa, seja o relacionamento recente, ou o evento ideal ainda não ter acontecido. No fundo, todo mundo sabe que é porque não superaram os sentimentos que sentem um pelo outro desde a infância e deixam isso atrapalhar qualquer tipo de relacionamento, menos os protagonistas.

Ao serem dispensados na mesma data e com os dias contando para o evento de Ano Novo, Jack possui a brilhante (ou não) ideia de fingir namorar a melhor amiga e evitar que a transmissão ao vivo para seus fãs vá por água abaixo. Por se conhecerem há tanto tempo, a proposta não parece ser a das piores, mas é claro que a mentira acaba trazendo para à flor da pele sentimentos e emoções não vividos há muito tempo.

Sob uma ótica externa, não há muito o que errar num enredo que embora não apresente surpresas, promete arrancar suspiros, sorrisos e ainda ganhar o público, que torcerá para o casal ficar junto no final; mas infelizmente, acontece. Jack e Maggie se conhecem há muito tempo e possuem suas histórias bem exploradas, bem como sua relação e amizade, tornando impossível não esperar um final feliz entre os dois. Os atores um trabalho tão bom em construir essa relação que o espectador até esquece dos coadjuvantes, que não foram desenvolvidos em nenhum momento da história, usados apenas como um degrau para a evolução da história do casal — e isso não é necessariamente um erro.

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O problema aqui fica por conta do roteiro e talvez o tato da direção em deixar as informações jogadas na tela menos grosseiras. Não fica claro quando Maggie e Jack voltam a desenvolver um sentimento além da amizade um pelo outro (como acontece, por exemplo, em A Proposta, com Sandra Bullock e Ryan Reynolds), as coisas simplesmente acontecem de uma hora para a outra, e o filme se apoia demais na rápida compreensão do público em acompanhar esses eventos.

Se Evan Williams e Natalie Hall não transmitissem tamanha química entre seus personagens, o relacionamento em questão ficaria totalmente na mão, já que faltou sensibilidade em desenvolver a história dos dois aqui.

Infelizmente, o filme não economiza em abrir parênteses para assuntos dificilmente falados serem discutidos na tela, como a pressão psicológica passivo-agressiva e a enorme invasão de privacidade no processo de tornar-se uma celebridade, ou no mundo atual com tantas redes sociais, um digital influencer. Sintonizados no Amor até deixa críticas subentendidas sobre tudo o que uma pessoa deve abrir mão para alcançar a tão desejada fama (que muitas vezes não vem necessariamente acompanhada de um sucesso financeiro), mas deixa escapar uma oportunidade única de explorar mais isso.

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Além disso, por focar demais na história entre o presente e o futuro do casal protagonista, o filme deixa a desejar quando toca em assuntos do passado — afinal de contas, Maggie e Jack se conhecem desde crianças; e possuem uma relação tão íntima que seus pais administram juntos um bar e restaurante noturno chamado Magnolia (cujo único intuito aqui é ser palco para a festa de final de ano da rádio em que os amigos trabalham).

Maggie perdeu a mãe há cinco anos e isso não é discutido em quase nenhum momento do longa, a não ser quando o assunto de alguma forma ajuda no desenvolvimento do relacionamento com Jack. Este, por sua vez, decepcionou a melhor amiga quando adolescente em um baile da escola, trocando-a de última hora para acompanhar uma garota popular do colégio; diferente de Dash & Lily, que pressiona essa tecla de superar os problemas do passado quase que toda hora, Sintonizados no Amor parece não ligar muito para o desenvolvimento do arco de seus personagens, tratando apenas do que foi apresentado ao público desde o início do filme até o final.

Um aspecto quase bizarro do filme também é como os personagens tratam Chicago como se fosse uma cidade do interior de poucos habitantes, quando na realidade é uma das mais populosas e grandes falando de área geográfica dos Estados Unidos. Por outro lado, esse tratamento com o local acaba criando um clima intimista, quase familiar, como se a cidade fosse uma caixinha de surpresas a ser explorada em que todos os cidadãos se conhecem.

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Isso lembra um pouco também uma característica muito presente nos filmes de Woody Allen, que sempre tratou as cidades em que são ambientados seus filmes como se fosse um personagem. Embora Sintonizados no Amor tenha sido filmado em Ottawa, capital do Canadá, o espectador pode esperar sentir-se abraçado pelas belas paisagens, tradicionais café e rigoroso inverno que marca a passagem do Natal para o Réveillon, escapando da realidade do calor brasileiro nessa época do ano e viajando mentalmente para o gélido e aconchegante frio estrangeiro durante os 86 minutos de filme.

Sintonizados no Amor já está disponível no catálogo da Netflix.