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Crítica | A Hora da Sua Morte não é tão interessante como poderia ser

Por| 27 de Fevereiro de 2020 às 10h25

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Diamond Films
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O terror tem seu próprio tipo de espectador: quem gosta do gênero (e não é muito exigente) geralmente é capaz de suspender crenças e se divertir com quase qualquer história mais ou menos bem contada. É por isso que esse gênero tem tantas fórmulas que se repetem exaustivamente ao longo dos anos. Às vezes, só queremos ver novas mortes em contextos diferentes (e aqui há espaço para questionarmos sobre a banalização da violência, mas esse é um tópico para outro texto).

Os filmes mais comerciais do gênero, no entanto, contentam-se com alguns sustos e evitam brincar muito com o estômago dos fãs, criando uma espécie de versão soft do subgênero splatter (que consiste em ter uma trama voltada para o surgimento de mortes bastante gráficas, repletas de sangue e violência). A Hora da Sua Morte parece encaixar-se nesse subgênero, com um gore bastante suave, daquele tipo que dá uma agonia, mas termina rápido o suficiente para não precisar desviar o olhar.

Como se fosse um eco de Premonição (James Wong, 2000), A Hora da Sua Morte lida com a ideia de que não é possível escapar do seu destino e de que qualquer tentativa de fugir dos seus momentos finais será recompensada com algum castigo macabro.

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Atenção! A partir daqui a crítica pode conter spoilers.

Obviedades

Quando falamos de filmes que, querendo ou não, enquadram-se em gêneros específicos com muita clareza, queremos dizer que a obra faz uso de fórmulas de roteiro, perfis de personagens, estrutura narrativa e o que mais possa criar as características necessárias para dar ao espectador treinado todas as pistas. Isso, embora possa deixar a trama óbvia demais para o gosto de algumas pessoas, serve como uma linha guia para os fãs de terror: a estrutura pode ser idêntica às de muitos outros filmes, mas o que importa em um splatter, as mortes, essas devem surpreender.

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A Hora da Sua Morte é o primeiro longa de Justin Dec, que assina roteiro e direção demonstrando ter muito conhecimento sobre a fórmula aplicada, mas pouca criatividade (ou liberdade para colocar as ideias em prática). A primeira morte demonstra que, assim como em Premonição, o assassinato é causado por algo completamente sobrenatural e aparentemente onipotente. O recurso é excelente, pois abre espaço para que as mortes possam ser tão bizarras quanto o desejado, mas dificilmente veremos barreiras sendo forçadas em um filme com apelo comercial tão grande. Sendo assim, contentamo-nos com a versão soft do gênero.

Com exatamente uma hora e meia de duração, A Hora da Sua Morte tem a estrutura clássica de um roteiro pensado em três atos de meia hora cada: em um primeiro momento a personagem principal toma conhecimento do aplicativo amaldiçoado e a primeira virada acontece quando ela se desespera ao ter uma visão em seu quarto. A segunda parte consiste em tentar livrar-se da maldição: descobrir alguma coisa que não vai funcionar e que conduz os personagens ao terceiro ato. A terceira parte mostra os personagens reunidos como família e realmente dispostos a qualquer coisa para driblar a morte.

Tudo isso é bastante previsível, mas a genialidade de um diretor de terror é tornar o previsível novo, como fez repetidas vezes a franquia Pânico. Justin Dec infelizmente não atinge esse patamar com seu filme. Para além de uma boa premissa que utiliza fórmulas bastante canônicas, A Hora da Sua Morte desenvolve pouco o que poderia ser muito mais autoral.

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Sustos e medos

O fim de Courtney (Anne Winters) dá o tom do que está por vir: as mortes serão bastante violentas, a ponto de talvez chocarem, mas serão pouco gráficas. Os recursos que Dec usa para deixar essas sequências mais soft não só tiram o peso gráfico da imagem, mas enfraquecem o filme que, sem um roteiro mais forte, se vê com cada vez menos apelo diante do espectador: mortes em desfoque, coisas que acontecem em meio a sombras demais ou rápido demais (e acompanhadas de jump scares), maquiagem digital e CGI...

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A aparição de elementos em segundo plano agrega qualidade às sequências que prezam mais o medo do que o susto: por conhecermos a estrutura narrativa, sabemos que alguém vai morrer, gerando medo ao ver uma figura semelhante à Morte, como se pudéssemos antecipar um sentimento de uma dor futura. Infelizmente, as aparições só tinham sucesso em despertar algo mais assustador quando vistas de longe. Mesmo que vistos por pouco tempo e sob iluminações precárias, as demais aparições eram esteticamente genéricas e pouco convincentes, quase caricaturais.

No limiar da comédia

A maioria dos filmes mais assustadores não contém sequer um alívio cômico e, mesmo quando arriscam na comédia, temos alívios cômicos apenas, como ocorre com o personagem Rod (Lil Rel Howery) em Corra! (Jordan Peele). Filmes B costumam flertar com gostos duvidosos e podem ser ao mesmo tempo engraçados e gore, combinação essa que lhes garante o status de cult. Em filmes medianos, comerciais e esquecíveis a longo prazo, como é o caso de A Hora da Sua Morte, a inserção da comédia é um alerta de que o próprio filme não se leva tão a sério, um convite para que o espectador seja mais concedente com o que está assistindo.

A Hora da Sua Morte tem diversos diálogos e personagens pouco verossímeis, mas nada é tão claramente cômico como o Pe. John (P.J. Byrne). Esse personagem, no entanto, não deve ser subestimado: apesar de caricato, Pe. John é a perfeita encarnação da ideia de um padre que é nerd com sua própria religião, como uma versão católica de The Big Bang Theory. Realmente fiquei me perguntando se existem padres que têm esse estereótipo de nerd.

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A Hora da Sua Morte é um bom entretenimento para quem está acostumado a ver o mesmo filme repetidas vezes e gosta do gênero, ainda que não impressione fãs de terror e tampouco seja isca para o grande público. Não duvido, no entanto, que se Justin Dec conseguir um projeto com maiores liberdades criativas talvez possamos ver um terror de muito mais qualidade.