Empresa americana quer fornecer luz do Sol após o anoitecer — isso faz sentido?
Por João Melo • Editado por Melissa Cruz Cossetti |

Uma empresa dos Estados Unidos quer fornecer luz solar a painéis instalados na Terra mesmo após o anoitecer. Para viabilizar essa ideia, a Reflect Orbital propõe lançar uma constelação de satélites capazes de refletir a luz do Sol de volta ao planeta.
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Com esse mecanismo, a companhia promete oferecer luz solar sob demanda, permitindo que usinas fotovoltaicas continuem operando após o pôr do Sol.
O plano é iniciar com um satélite de teste de 18 metros, chamado Earendil-1, com lançamento previsto para 2026. Em seguida, a empresa pretende colocar 4 mil satélites em órbita até 2030.
Detalhes da reflexão da luz solar
A Reflect Orbital planeja posicionar seus satélites a cerca de 625 quilômetros de altitude, equipados com espelhos de 54 metros de diâmetro. A proposta é que esses espelhos reflitam a luz solar de forma semelhante ao reflexo de um relógio que projeta um ponto de luz em uma parede.
Quando a superfície refletora está próxima, o ponto é intenso e concentrado, mas, à medida que a distância aumenta, a luz se espalha e enfraquece.
Segundo Michael J. I. Brown, professor associado de Astronomia na Universidade Monash, e Matthew Kenworthy, professor associado de Astronomia na Universidade de Leiden, isso ocorre porque o Sol não é um ponto de luz, mas ocupa cerca de meio grau de ângulo no céu.
Assim, um feixe refletido por um espelho plano também se dispersa nesse mesmo ângulo.
“O que isso significa na prática? Vamos considerar um satélite refletindo a luz do Sol a uma distância de aproximadamente 800 km – porque um satélite a 625 km de altura nem sempre estará diretamente acima, mas refletindo a luz solar em um ângulo. A área iluminada do solo teria pelo menos 7 km de diâmetro”, explicam os especialistas.
Mesmo com o uso de espelhos curvos ou lentes, não seria possível concentrar o feixe em uma área menor devido à dispersão natural da luz solar.
"Essa luz solar refletida seria brilhante ou fraca? Bem, para um único satélite de 54 metros, ela seria 15 mil vezes mais fraca do que o Sol do meio-dia, mas ainda assim muito mais brilhante do que a Lua cheia", completam os docentes.
Teste do balão da Reflect Orbital
Em 2024, o fundador da Reflect Orbital, Ben Nowack, realizou um teste com um refletor transportado por balão de ar quente. O espelho plano, de cerca de 2,5 metros de diâmetro, direcionou um feixe de luz para painéis solares e sensores.
A equipe mediu 516 watts por metro quadrado a uma distância de 242 metros — aproximadamente metade da intensidade da luz solar ao meio-dia, que chega a cerca de 1.000 watts por metro quadrado.
Os pesquisadores Brown e Kenworthy destacam, no entanto, que ampliar esse experimento para o espaço é algo muito mais complexo.
“Se os satélites estivessem a 800 km da área de interesse, o refletor precisaria ter 6,5 km por 6,5 km – 42 quilômetros quadrados. Não é prático construir um refletor tão gigante, então o teste com balões tem algumas limitações”, observam os professores.
Objetivos, desafios e consequências
A Reflect Orbital afirma ter como meta gerar 200 watts por metro quadrado — cerca de 20% da luz solar do meio-dia. Porém, considerando o tamanho proposto dos satélites, seriam necessários 3 mil deles para atingir essa intensidade. E, devido à velocidade orbital, esses satélites iluminariam um mesmo ponto da Terra por apenas alguns minutos.
Mesmo assim, a ambição da empresa é enorme: Nowack planeja lançar 250 mil satélites a 600 km de altura, um número superior ao de todos os satélites ativos e detritos espaciais atualmente catalogados.
Além dos desafios técnicos e financeiros, o projeto enfrenta críticas. O aumento do lixo espacial e o risco de poluição luminosa estão entre as principais preocupações.
Uma constelação de espelhos desse tipo poderia dificultar observações astronômicas e alterar ritmos biológicos de animais sensíveis à luz.
“Embora a Reflect Orbital planeje iluminar apenas áreas específicas, os feixes também varreriam outras regiões à medida que os satélites se deslocam. O céu noturno poderia ser preenchido por flashes mais brilhantes que a Lua cheia”, alertam Brown e Kenworthy.
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Fonte: The Conversation