Como Ayrton Senna ajudou a criar o icônico Honda NSX?
Por Redação |

A lenda do Honda NSX, o supercarro que desafiou a hegemonia europeia nos anos 1990, está intrinsecamente ligada a outra lenda: Ayrton Senna. Embora a associação seja conhecida, a profundidade da sua contribuição técnica é frequentemente subestimada.
A participação de Ayrton Senna no desenvolvimento do superesportivo Honda NSX foi muito além de uma simples consultoria de marketing; foi uma intervenção de engenharia decisiva, que alterou fundamentalmente a dinâmica e o comportamento do carro.
Senna participou diretamente do desenvolvimento da primeira geração do modelo lançado pela montadora japonesa em 1990 e, por isso, recebeu uma unidade para curtir enquanto a McLaren usava os motores Honda nas pistas da Fórmula 1.
Confira, com o CT Auto, quais foram exatamente os aspectos técnicos da colaboração, e como o feedback do tricampeão mundial de Fórmula 1 foi crucial para transformar o NSX em um ícone automotivo.
O Projeto NSX e a parceria com a McLaren-Honda
O projeto NSX (New Sportscar Experimental) nasceu com a ambição da Honda de criar um supercarro que combinasse o desempenho de uma Ferrari com a confiabilidade e a usabilidade de um carro de produção japonês. A base técnica já era avançada para a época, estabelecendo novos padrões na indústria.
- Chassi: O NSX foi o primeiro carro de produção em massa a utilizar um chassi monocoque inteiramente de alumínio, uma tecnologia até então restrita a carros de corrida, visando baixo peso e alta resistência estrutural.
- Motor: O coração do projeto era um motor V6 de 3.0 litros, posicionado em layout central-traseiro, equipado com o inovador sistema VTEC (Variable Valve Timing and Lift Electronic Control), que otimizava o desempenho tanto em baixas quanto em altas rotações. A potência chegava aos 247 cv.
- Suspensão: O sistema de suspensão era do tipo double wishbone (braços duplos triangulares) nas quatro rodas, fabricada em alumínio forjado para reduzir a massa não suspensa e aprimorar o contato dos pneus com o solo.
A vitoriosa parceria da Honda como fornecedora de motores para a equipe McLaren na Fórmula 1 abriu a porta para que seu principal piloto, Ayrton Senna, fosse convidado para testar e validar os protótipos finais do NSX.
Intervenção de Senna no acerto dinâmico
O momento crucial da participação de Senna ocorreu durante testes no circuito de Suzuka, no Japão. Após algumas voltas com o protótipo, o piloto deu um feedback direto e inesperado aos engenheiros da Honda. Ele afirmou que, embora o carro fosse ágil e o motor excelente, o chassi não era rígido o suficiente. Em suas palavras, a estrutura parecia "frágil" e flexionava sob altas cargas laterais, comprometendo a previsibilidade e a precisão em curvas de alta velocidade.
Essa crítica vinda de um piloto com a sensibilidade de Senna foi levada com extrema seriedade. A equipe de engenharia da Honda retornou à fase de desenvolvimento e implementou mudanças significativas baseadas diretamente em sua análise:
- Aumento da rigidez estrutural: Utilizando análises de computador e testes práticos, os engenheiros reforçaram pontos específicos do monocoque de alumínio. O resultado foi um aumento de aproximadamente 50% na rigidez torcional e de flexão do chassi, sem um ganho de peso proibitivo.
- Recalibração da suspensão: Um chassi mais rígido exige um acerto de suspensão completamente diferente. Senna participou de novos testes, ajudando a refinar as taxas de compressão e retorno dos amortecedores, a dureza das molas e a geometria da suspensão. O objetivo era encontrar o equilíbrio perfeito entre o comportamento em pista e o conforto para uso em estradas.
- Ajustes finos: O piloto também forneceu sugestões para o acerto do diferencial de deslizamento limitado e a resposta da direção, aprimorando a capacidade de tração na saída de curvas e a comunicação entre o volante e as rodas.
Legado da consultoria e impacto no mercado
A intervenção de Ayrton Senna elevou o Honda NSX de um ótimo carro esportivo para um supercarro de referência mundial. A versão de produção final era um veículo que não apenas rivalizava, mas em muitos aspectos superava seus concorrentes diretos, como a Ferrari 348, especialmente em termos de dirigibilidade e facilidade de uso em alta performance.
Pontos moldados pela influência de Senna
- Precisão e resposta do chassi: O carro tornou-se famoso por sua direção telepática e pela forma como comunicava os limites de aderência ao motorista, um resultado direto do aumento da rigidez estrutural.
- Previsibilidade no limite: A plataforma rígida e a suspensão bem calibrada tornaram o NSX um carro extremamente previsível e controlável, inspirando confiança no motorista para explorar todo o seu potencial.
- Equilíbrio dinâmico: O acerto final, lapidado por Senna, entregava um equilíbrio exemplar entre agilidade, estabilidade e conforto, algo raro em supercarros daquela época.
A participação de Ayrton Senna não foi, portanto, um mero endosso. Foi uma consultoria técnica de altíssimo nível que refinou o produto final, garantindo que a engenharia de ponta do NSX se traduzisse em uma experiência de condução superlativa.
O resultado foi um carro que redefiniu o segmento e solidificou seu lugar na história como uma obra-prima da engenharia automotiva, com o toque de um dos maiores pilotos de todos os tempos.
Senna, porém, não conseguiu usufruir do esportivo por muito tempo, pois a montadora pediu o carro de volta assim que a parceria com a McLaren terminou, em 1992.
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