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Especialista fala sobre pontos polêmicos do projeto de lei do streaming no BR

Por| 08 de Outubro de 2019 às 19h50

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O Senado recebeu na segunda-feira (7) uma audiência sobre a comunicação audiovisual sob demanda, que discute o projeto de lei 57/2018, do senador Humberto Costa (PT-PE). O texto cria novas regras para serviços como Netflix e Amazon Prime Video, como o estabelecimento de cotas para produção nacional e taxa progressiva de até 4% sobre o faturamento bruto. Para falar esclarecer melhor o assunto, falamos com o advogado Alexandre Gleria, sócio do escritório ASBZ Advogados e especialista em Direito Regulatório.

A principal mudança que o PL traz é com relação à Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (CONDECINE), tributo incidente sobre veiculação, produção, licenciamento e a distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas com fins comerciais, assim como em determinadas transações com o exterior decorrentes da exploração de obras cinematográficas e videofonográficas. “Na atual legislação que regulamenta a CONDECINE, não há previsão clara que estabeleça a cobrança do tributo para serviços de streaming”, diz Gleria.

Com relação aos maiores pontos discussão, Gleria cita que o PL traz:

  • Desincentivo às empresas de streaming de constituírem estabelecimento no Brasil, o qual pode gerar emprego, renda e outros tributos no país (mesmo havendo punição para as companhias estrangeiras que operem com clientes brasileiros que não cumpram a legislação, a legitimidade e efetividade de tal medida é questionável)
  • Desincentivo às empresas de streaming que focam em conteúdo específico, como as estrangeiras que exploram conteúdo de caráter técnico e científico, as quais provavelmente terão inviabilizadas sua operação no Brasil pelo não cumprimento de vários requisitos previstos na legislação (podendo, nesse caso, prejudicar a democratização e acesso à ciência e tecnologia);
  • Discrepância de tratamento entre vertentes distintas dos serviços de streaming, produzindo lacunas na legislação desde o início de sua criação;
  • Ausência de clareza entre o vínculo de instituição da CONDECINE e sua finalidade (o que pode dar ensejo a questionamentos da constitucionalidade da exação);
  • Muitos pontos dependentes de regulamento, tornando por ora a nova legislação inexequível, etc. Existem diversos outros itens que também fazem com que a legislação seja temerária, os quais não serão citados em benefício da objetividade;
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Como veremos abaixo, alguns participantes da audiência questionaram também a ausência de dados mais concretos para definir melhor os parâmetros do PL. Gleria destaca que os pontos exemplificados acima são até mais relevantes que a falta dessas informações e lembrou que o Brasil está prestes a sofrer grandes mudanças econômicas em breve.

“Outro ponto para reflexão seria se, num contexto de reforma tributária iminente, faria sentido perder tanto tempo com a discussão de uma regra extremamente específica — que poderá trazer ônus e burocracia ao setor em questão e à administração pública, como o Judiciário, que deverá receber demandas a respeito do assunto.”

Netflix falou sobre a proposta

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Na audiência realizada na tarde de segunda-feira (7), os participantes se manifestaram a respeito do projeto de lei, representando seus grupos. Paula Pinha, Relações Governamentais e Políticas Públicas da Netflix, lembrou que 3% a primeira produção Netflix nacional, de 2016, foi um dos cinco shows mais assistidos na Nova Zelândia, Dinamarca e Canadá e hoje tem 50% de suas visualizações fora do país.

Ela afirma que além de injetar verba no mercado local, a plataforma global leva a cultura nacional para outras regiões. A projeção é “de investimento de R$ 350 milhões em conteúdo brasileiro que será disponibilizado para o mundo todo”.

Para a Netflix, a cota no serviço sob demanda não tem o mesmo impacto como em uma grade de programação convencional e poderia não somente prejudicar o setor como também a própria experiência do usuário. Já sobre a tributação, a companhia concorda que as empresas que geram receita no território nacional precisam contribuir e “estamos abertos à discussão sobre o modelo ideal para a tributação sobre o vídeo sob demanda”.

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Já Rojer Garrido de Madruga, presidente do Congresso Brasileiro de Cinema, diz que seria “muito mais fácil simplificar toda a burocracia cobrando em cima do faturamento”, dando como exemplo países europeus como Espanha e Itália, cobram até 5% sobre os serviços de streaming.

MPAA e Claro NET também opinaram

José Maurício Fittipaldi, da Motion Picture Association of America (MPA), lembrou que estamos prestes a viver uma “segunda onda” do streaming muito em breve que o texto apresentado pelo senador Humberto Costa não representa a realidade nacional.

“É baseado na experiência europeia. Praticamente copia e transpõe sem atentar para as particularidades do mercado local. Mas isso não pode servir como parâmetro para medir o sucesso da regulação. A diretiva europeia que trata do assunto é do final de 2018 e os Estados membros não são obrigados a implementá-la por completo até setembro de 2020 — como, de fato, não o fizeram ainda. Então, não há dados para comprovar que esse caminho é o melhor.”

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Fernando Magalhães, da Claro Brasil (NET), afirma que atualmente há uma bem estabelecida rede de alimentação de conteúdo trabalhando em conjunto com produtores nacionais independentes. Isso, em parte, seria fruto até da experiência que a NET tem com o serviço por demanda NOW, que funciona há 11 anos. Ele questiona o PL, tanto na criação dessa cota quanto com a taxação. “A gente precisa de uma lei adicional? A gente precisa criar mais estímulos para uma coisa que está funcionando e já distribui uma quantidade relevante de conteúdo nacional?”

Magalhães disse ainda que não o mercado por enquanto não precisa dessa intervenção. “Em relação à taxação, nós temos hoje dinheiro de sobra que não está sendo usado pela Condecine. A gente precisa onerar ainda mais os serviços que estão sendo lançados? Ou será que não é melhor fazer o caminho contrário, tanto no serviço por assinatura ou quanto pro vídeo sob demanda?”

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Como dá para notar, o assunto ainda vai dar muito o que falar, pois, agora, a proposta aguarda o parecer do relator, senador Izalci Lucas (PSDB-DF). Depois, o texto passará pelas comissões de Educação, Cultura e Esporte (CE), de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) e de Constituição e Justiça (CCJ).