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Por que você não deveria enviar as fotos dos seus filhos para aplicativos de IA

Por  • Editado por Melissa Cruz Cossetti | 

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Pexels/Ketut Subiyanto
Pexels/Ketut Subiyanto

Em datas comemorativas como aniversários e o Dia das Crianças, é comum ver nas redes sociais muitas fotos e vídeos de filhos ainda pequenos, postados em forma de celebração ou seguindo "trends" nas redes sociais. Com a popularização dos aplicativos de inteligência artificial (IA), essa prática tem se estendido a ferramentas que editam ou transformam esses conteúdos e não só aos chatbots mais famosos.

No entanto, a recomendação de especialistas ouvidos pelo Canaltech, e até mesmo das próprias ferramentas de IA, é de não enviar fotos de crianças a esse tipo de aplicativo.

O compartilhamento de imagens de menores com sistemas de IA significa fornecer dados pessoais que podem ser usados para treinar modelos, impactando a privacidade e até a reputação da pessoa no futuro.

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O que dizem as ferramentas de IA

O Canaltech consultou o ChatGPT, da OpenAI, e o Gemini, do Google, sobre como as ferramentas de edição de vídeo das duas empresas — o Sora e o Veo 3 — lidam com fotos de crianças enviadas pelos usuários.

Tanto o ChatGPT quanto o Gemini afirmaram que as empresas não assumem a propriedade nem os direitos autorais sobre as imagens enviadas, mas informaram que os conteúdos podem ser utilizados para treinar os modelos de IA.

“A OpenAI pode usar parte dos dados enviados para melhorar seus sistemas, a menos que você esteja em uma conta ou plano com política de exclusão de dados de treinamento (como o ChatGPT Team, Enterprise ou API com data control). No ChatGPT gratuito ou Plus, as conversas e uploads podem ser analisados de forma anônima para treinar modelos — o que inclui imagens”, explicou o ChatGPT.

A resposta do Gemini foi na mesma linha, com o acréscimo de que o uso das fotos é autorizado quando o usuário aceita os Termos de Serviço do Veo 3.

“Sua foto pode ser usada para ensinar o modelo de IA a entender melhor como são as pessoas, os movimentos, a iluminação e as características faciais. Embora o Google normalmente utilize dados de forma anonimizada ou agregada, a imagem original é processada, e as características faciais e o contexto da criança são absorvidos pelo modelo”, informou a IA do Google.

As duas IAs também alertaram sobre o risco de vazamento de dados — algo a que até grandes empresas estão sujeitas —, o que poderia fazer com que as imagens caíssem nas mãos de pessoas mal-intencionadas.

Além disso, citaram a possibilidade de uso indevido das fotos nas redes sociais, incluindo a criação de deepfakes a partir desse conteúdo. No fim, ambas desaconselharam o envio de imagens de crianças a aplicativos de IA.

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Alerta para a perda de controle dos dados da criança

O Dr. Coriolano Camargo, presidente da Comissão de Direito Digital da OAB-SP, alerta para o fato de que a foto de uma criança compartilhada com um app de IA pode ser usada para fins que muitas vezes os pais desconhecem.

“Essas imagens podem ser manipuladas, gerando versões falsas ou até sexualizadas, o que configura grave violação dos direitos da criança, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O problema é que, uma vez na nuvem, é praticamente impossível ter controle total sobre como essas imagens serão usadas e manipuladas”, disse o advogado em entrevista ao Canaltech.
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Outro ponto de atenção é a análise biométrica feita por alguns sistemas de IA, que medem pontos do rosto e criam um molde numérico capaz de reconhecer a pessoa de forma única.

“Diferente de uma senha, esse molde não pode ser trocado. Se vazar, ninguém consegue mudar de rosto. Em se tratando de crianças, o cuidado precisa ser redobrado, pois o uso indevido pode afetar a privacidade e a segurança por muitos anos”, explica Eduardo Mendonça, pesquisador de plataformas e mercados digitais do Data Privacy Brasil, organização focada na promoção de informações sobre proteção de dados pessoais e direitos digitais.

Riscos à privacidade a longo prazo

Os especialistas também ressaltam que imagens de crianças compartilhadas com sistemas de IA podem ter impactos duradouros na privacidade, segurança e reputação, criando uma pegada digital permanente.

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“Quando uma IA é alimentada com imagens fornecidas pelo usuário, elas podem ser usadas a longo prazo não apenas para treinamento, mas também para criar novos materiais. Por exemplo, se amanhã um sistema gerar um conteúdo inapropriado usando o rosto de um filho, como um falso nude, isso seria extremamente danoso”, alerta o Dr. Luiz Augusto D’Urso, advogado especialista em Direito Digital.

Como a LGPD aborda o tema

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) determina que o tratamento de dados de crianças exige o consentimento específico de pais ou responsáveis — o que geralmente ocorre quando se aceita os Termos de Uso e Serviço das plataformas.

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Uma vez que as empresas recebem essa autorização e as imagens, tornam-se responsáveis por garantir a segurança e a transparência no uso dos dados.

“Isso significa que os pais têm o dever de autorizar o uso, mas, se a empresa utiliza essas imagens de forma indevida ou além do consentimento dado, a responsabilidade é dela, podendo ser responsabilizada civil, administrativa e até criminalmente”, explica Camargo.

Os especialistas também chamam atenção para o artigo 14 da LGPD, que define que o tratamento de dados de crianças deve ser feito visando o bem-estar e a criança.

Além do cuidado dos pais ao não enviar fotos de filhos para plataformas de IA, os profissionais defendem que é necessária uma revisão das leis brasileiras sobre o tema.

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“Os usuários devem ter cautela, não enviar dados pessoais ou imagens de filhos para IAs desconhecidas, e o poder Legislativo precisa trazer regulamentações mais rigorosas para prevenir crimes envolvendo imagens de crianças”, conclui D’Urso, professor de Direito Digital no MBA de Inteligência e Negócios Digitais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Uma espécie de protocolo seguro para editar fotos de crianças e bebês, sugerido pelas próprias plataformas de IA, inclui usar programas offline de edição de fotos, ter boas práticas de armazenamento e backup, além de remover metadados (dados invisíveis de localização, câmera, data, etc.) antes de compartilhar em redes sociais (de preferência, sempre para um público mais restrito e controlado pelos pais).

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Fonte: LGPD