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Análise | State of Decay 2 traz boa experiência de survivor, mas é repetitivo

Por| 21 de Maio de 2018 às 09h10

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Undead Labs/Microsoft Studios
Undead Labs/Microsoft Studios

Faz dois dias que estou vivendo em uma comunidade com duas pessoas que nunca vi na vida e com meu irmão, Garret. Ele foi mordido por um zumbi e agora está infectado pela praga do sangue. Koehl, uma militar, e Pagán, um médico, se dispuseram a nos ajudar a encontrar a cura, mas por enquanto eles só ficam sentados me mandando buscar por itens em uma cidade infestada por mortos-vivos.

Entre idas e vindas, uma estranha me chama no rádio e pede por ajuda. É Taniqua. Ela está sozinha e sua casa cercada por zumbis. Corro em seu socorro e elimino aqueles corpos fétidos que se recusam a ficar sete palmos abaixo da terra. Instantes depois, descubro que Taniqua vivia com outras pessoas, mas todas morreram enquanto tentavam lidar com uma horda. Só sobrou ela.

Forte e destemida, a moça sabe se defender muito bem e conhece aquela cidade como a palma de sua mão. Não demora muito para que eu me abra com ela e diga que estou com outras pessoas em uma base. Cansada de viver sozinha, ela pergunta se pode se unir à gente. Na tela, surgem duas opções: posso trazê-la para o grupo ou simplesmente desconversar e dizer que ela está por conta própria. Penso por um instante e escolho aceitá-la. “Por que não?”. Afinal de contas ela viria a calhar e me ajudaria a explorar melhor o mapa. Faz sentido, certo?

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Tudo depende

Ler esse relato das minhas primeiras horas jogando State of Decay 2 pode passar a impressão de que o novo jogo da Undead Labs é simplório e nos leva a escolhas que de tão óbvias parecem naturais. A verdade, porém, é que o jogo nos convida a todo instante a fazer escolas cujos desdobramentos são difíceis de serem previstos.

Aceitei Taniqua para meu grupo, mas não demorou nem um dia inteiro para ela armar um barraco daqueles com Garret e Pagán. A coisa toda foi tão feia que o pessoal ficou depressivo e exigiu que a moça fosse exilada para evitar outras confusões.

Curioso, tentei compreender o que estava acontecendo ali. Analisando a ficha de Taniqua, vi que ela é levemente musculosa, o que explica ela conseguir lidar bem com inimigos, e tem dedo verde, aumentando a produtividade da hortinha da base. Por outro lado, um de seus defeitos é ela ser preguiçosa; por isso, acaba irritando mais outros membros do que o normal. Junte a isso à inflexibilidade e gênio forte de Garret e temos um verdadeiro barril de pólvora em uma base que deveria ser pacífica. Repentinamente, trazê-la para meu grupo pareceu não ter sido uma boa ideia.

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Assistindo a alguns gameplays para ver como outras pessoas lidaram com essa situação, percebi que nem Taniqua, nem Garret, nem Pagán existiam no mundo daquelas pessoas. Claro, os personagens em si estavam ali, mas suas aparências e, acima de tudo, personalidades eram completamente diferentes.

Isso acontece porque State of Decay 2 cria os personagens e suas personalidades de maneira procedural, isto é, aleatoriamente. A consequência disso são interações, reações e regras de convivência completamente distintas para cada pessoa que inicia um novo jogo. Pode ser que a sua Taniqua, que certamente não terá esse nome, não seja tão esquentadinha como a minha e que recrutá-la acabe sendo, sim, uma boa ideia. Tudo é muito incerto, tal qual deve ser num mundo apocalíptico dominado por zumbis.

Gerenciador apocalíptico

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Apesar desse sentimento de incerteza ser muito bem-vindo em um jogo de sobrevivência, State of Decay 2 acaba pecando por utilizá-lo em excesso. E isso fica evidente desde os primeiros minutos de gameplay. Por descuido ou por acreditar que todo mundo jogou o primeiro título, ele pouco instrui os sobreviventes que adentram neste mundo pela primeira vez.

Abandonados à nossa própria sorte, temos de descobrir a duras penas como funciona o inventário, como é a dinâmica do nosso assentamento, como os personagens se relacionam e como a escassez de itens essenciais como comida, remédio, combustível, munição e afins afeta tudo isso. O tutorial falha miseravelmente nisso e só depois de pelo menos quatro horas é que começamos a perceber como funcionam as mecânicas e as engrenagens que movem o jogo.

Quando isso acontece, State of Decay 2 se apresenta como um grande gerenciador apocalíptico. Tudo depende de quão habilidoso você é para gerenciar a sua comunidade, o seu povo, e estabelecer alianças que facilitem a sua vida. E há inúmeras maneiras de fazer isso.

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Você pode ser um líder bondoso, sempre preocupado em coletar os suprimentos necessários para que todo mundo fique feliz e saudável. Também dá para ser um tirano que está pouco se lixando para tudo isso e que se recusa a se unir a outros grupos, criando conflitos e matando “gente como a gente” que poderia muito bem ajudar nesses tempos de trevas.

Além das relações, também é preciso gerenciar as instalações que o local precisa para prosperar. Aqui cabe a você decidir se seu povo está precisando de uma enfermaria para tratar dos doentes, uma torre de vigia para manter os zumbis longe dali, uma horta para fornecer alimento e remédios, ou coletor de chuva ou gerado para juntar água e e gerar energia para melhorar a vida do pessoal. Há pelo menos uma dezena de possibilidades, e esses são exemplos que ilustram bem que de simples State of Decay 2 não tem nada.

O jogo é bem complexo, cheio de detalhes, e é preciso dar conta de tudo como se você realmente estivesse em um apocalipse zumbi, preocupando-se com cada nuance para manter todo mundo vivo até que um dia as coisas melhorem. E isso pode acontecer enquanto os personagens que você começou a jogar estão vivos, jovens e saudáveis ou não, já que eles tanto podem morrer de velhice ou virarem zumbis depois de terem sido atacados. Em todos os casos, o jogo sempre prossegue com novas gerações de sobreviventes, que levam seu legado adiante.

Sair, coletar, matar, voltar, repetir

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Ao mesmo tempo que State of Decay 2 intriga por toda a aleatoriedade e esquema de gerenciamento que funcionam por “baixo dos panos”, longe das vistas do jogador, ele também decepciona pela quantidade de bugs e pela repetitividade velados por essas características.

Não raramente os personagens e os zumbis literalmente entram dentro de pedras e ficam empacados em objetos do cenário. Aqui e acolá também pude ver alguns mortos-vivos voadores, caindo do céu e atravessando paredes.

Também dá para perceber alguns problemas relacionados à jogabilidade como um todo, sobretudo nas batalhas. É muito comum, por exemplo, estar ao lado de um inimigo, tentar acertá-lo com um golpe e ver o personagem atingir o vento mesmo que seu bastão, martelo ou machado tenha visivelmente atravessado ele.

São problemas pontuais que incomodam um pouco e passam a sensação de que faltou polimento e pelo menos mais um ou dois meses de desenvolvimento, mas que não chegam a comprometer tanto State of Decay 2 quanto sua repetitividade.

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Sem uma trama propriamente dita, depois de oito ou dez horas de jogo, o título da Undead Labs se torna maçante. Essencialmente, ele se resume a sair de casa, coletar itens, matar zumbis e voltar.

Claro que há algumas tarefas mais desafiadoras, como destruir os núcleos pestilentos. Ela consiste em dar fim a um amontoado melequento e resistente de corpos de zumbis enquanto hordas e mais hordas vêm tentar impedi-lo. É impossível fazer isso sozinho, então estar acompanhado e muito bem equipado com explosivos, coquetéis molotov, armas de fogo e munição é obrigatório.

Nesse caso específico, a experiência de ter a cooperação de amigos para concluir a missão é bem bacana. Ao todo, você pode chamar mais três jogadores para entrarem na sua sessão e combinar um plano de ação: por exemplo, dois podem atacar o núcleo pestilento enquanto outros dois protegem a retaguarda para que tudo acabe o mais rápido possível. Missão concluída, cada um recebe pontos de influência, a moeda de troca no game, e é isso.

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Infelizmente o modo cooperativo online não permite juntar a galera para agilizar a coleta dos tais pontos e a evolução da comunidade. Você está preso com seus parceiros e todos só podem andar em bando. Caso alguém se distancie mais do grupo, acaba sendo retirado da sessão.

No fim das contas, nem a mais desafiadora das tarefas nem o elemento que poderia tornar State of Decay 2 mais dinâmico e divertido funcionam muito bem. A sensação é que estamos presos num loop infinito de sair, caçar, matar e voltar.

Apesar dos pesares...

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Mesmo com esses problemas, State of Decay 2 não é um jogo ruim, não. Longe disso. Ele é uma clara evolução do primeiro título da série, lançado no já longínquo ano de 2013 para Xbox 360 e PC. Exemplo disso é que agora temos à nossa disposição três mapas diferentes do tamanho do único mapa de State of Decay. No papel, então, este é um game com pelo menos o triplo do tamanho do anterior.

Outro elemento que recebeu um tapa foram os gráficos. Tudo bem, mesmo no Xbox One X eles estão longe de serem comparados a gráficos como os de Dying Light, The Last of Us e outros títulos do gênero, mas houve uma melhoria significativa se comparados aos de State of Decay. Os personagens estão menos caricatos e engessados e mais bem acabados e articulados. O draw distance do mundo aberto também surpreende e alguns cenários conseguem arrancar uns suspiros da gente.

Mais do que isso, a sensação em si de estar em um apocalipse zumbi foi bastante aprimorada. Embora frustre no começo, a incerteza e a dificuldade de reunir e lidar com pessoas diferentes são elementos que fazem parte de um mundo como esse. A todo instante você se pergunta "será que isso vai dar certo?". Quando se pega o jeito, a gente até consegue sair com mais segurança e sentir um certo prazer ao ouvir os braços e pernas dos morto-vivos sendo fatiados por um machado e a cabeça explodindo com uma paulada mais forte.

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O grande destaque, todavia, fica mesmo para a forma como o jogo exige que gerenciemos nossa comunidade, as relações e até mesmo nossos personagens. Fora as inúmeras formas de fazer o assentamento prosperar, há uma árvore de habilidades que nos deixa personalizar e tornar cada personagem único.

Por outro lado esse brilho todo é um pouco ofuscado pelos bugs e pela repetitividade do título. Em relação às falhas, é quase certo que elas serão solucionadas em futuras atualizações; já a repetitividade e a falta de uma trama mais densa e consistente devem mesmo ficar para um eventual State of Decay 3.

No fim das contas, dá para falar com tranquilidade que State of Decay 2 oferece uma boa experiência de sobrevivência. Tropeça, sim, aqui e acolá, é verdade, mas não chega a ser um zumbi fétido e feioso.

*State of Decay 2 está disponível para Xbox One e Windows 10 e pode ser jogado gratuitamente pelos assinantes do Xbox Game Pass. No Canaltech, ele foi analisado no Xbox One X em cópia digital gentilmente cedida pela Microsoft.