Publicidade
Economize: canal oficial do CT Ofertas no WhatsApp Entrar

Por que incentivar jovens brasileiros na astronomia?

Por| Editado por Renato Santino | 21 de Janeiro de 2022 às 11h00

Link copiado!

Yuting Gao
Yuting Gao

A ciência vem perdendo espaço não apenas nos investimentos, mas também no discurso. É impossível que esse conhecimento perca importância e relevância para a sociedade, mas no Brasil ele vem sendo não só esquecido, mas também minado, inclusive pelas autoridades.

A desinformação e o discurso anticiência, que ficaram ainda mais evidentes na pandemia da covid-19, vem ganhando espaço. Há muitas consequências desse novo tempo (e pensamento) do país. Além dos cortes crescentes no investimento em educação e da fuga de cérebros para outras nações, uma mentalidade que afasta os jovens da formação científica já pode ser percebida.

Uma das áreas é a astronomia. A área, historicamente, sofre com falta de investimentos, mas a situação atual é inédita. Segundo o coordenador do radiotelescópio Bingo e Professor do Instituto de Física da USP, Elcio Abdalla, é preciso voltar a atrair os jovens para olhar os céus, prática que vem de tempos imemoriais e que nos ajudou desde o início da agricultura até as grandes navegações, entre outros momentos históricos importantes, incluindo a invenção do GPS.

“O discurso anticiência não pode deixar que os brasileiros se afastem deste conhecimento, afinal os jovens serão os pensadores do futuro e a autonomia científica do Brasil dependerá também deles. O conhecimento dos céus tem revolucionado as sociedades desde o início dos tempos e, sem o interesse dos jovens em astronomia, o Brasil pode, novamente, ficar para trás na produção deste conhecimento, tão importante quanto estratégico para o futuro e a melhoria do país”, analisa Abdalla.

Continua após a publicidade

Como a astronomia influencia a humanidade?

O coordenador explica que é impossível dizer em detalhe por conta da profundidade do assunto, mas já na antiguidade havia um grande interesse prático no estudo dos céus. Quando começamos a virar astrônomos? Ele afirma que pode-se dizer que, em certo grau, desde que começamos a plantar e revolucionamos a sociedade com a agricultura, prática que nos permitiu abandonar o nomadismo e ter mais tempo para pensar, começar a tentar entender e a explicar como o mundo funcionava.

Para a agricultura funcionar, o ser humano começou a perceber que as plantas cresciam melhor e com melhor proveito em certas condições meteorológicas. Foi observando os céus que percebemos que a regularidade das estações do ano permitia antever a melhor fase para o plantio e a melhor fase para a colheita. Foi a observação dos dias referentes aos solstícios e aos equinócios. O solstício de verão corresponde ao dia mais longo, e o de inverno ao dia mais curto. Nos equinócios de primavera e de outono, temos o início destas estações. Estes dias são conhecidos há muito tempo. O plantio e a colheita estão diretamente ligados à vida e sua época é definida pela observação astronômica.

Outro exemplo de como a astronomia é parte de nós: muitos povos viveram e até hoje vivem em meio a desertos. Andar em um deserto sem ter ideia de direção pode significar a morte. Os guias das caravanas precisavam adquirir conhecimento astronômico para se guiarem pelas estrelas. Os árabes se especializaram nesta arte, e o céu foi escrutinado em detalhes por eles. Mas não apenas por eles. As grandes navegações a partir do século XV basearam-se em grande parte nestes conhecimentos.

Continua após a publicidade

O calendário, essencial para uma sociedade complexa, é mais uma demonstração da presença da astronomia no dia a dia. O imperador Júlio César trouxe o primeiro calendário correto, o calendário juliano, que, com a pequena correção feita 1.500 anos mais tarde por Copérnico tornou-se o Calendário Gregoriano, é usado hoje universalmente — inclusive por nós, todos os dias.

Estes são apenas três casos que nos dão uma ideia da importância da astronomia. Hoje, a observação dos céus nos permitiu, entre outros, e apenas para dar um exemplo, o utilíssimo GPS.

Desafios, oportunidades e objetivos

O conhecimento do Setor Escuro do Universo (95% do Cosmos) é uma das áreas mais misteriosas que o ser humano ainda não conseguiu desvendar. “Se até hoje, com o conhecimento que temos, conseguimos revolucionar as sociedades de tantas formas, saber mais sobre essa parte do universo pode ser revolucionário. E, aqui no Brasil, temos a oportunidade de participar nessas descobertas com o Bingo, radiotelescópio inédito do país, que será instalado no Sertão da Paraíba e foi apelidado de ‘Diamante do Sertão’”, observa Abdalla.

Continua após a publicidade

O objetivo principal é explorar novas possibilidades na observação do universo a partir do céu brasileiro. A proposta é estudar a energia escura e também o fenômeno Fast Radio Bursts [“rajadas rápidas de rádio”, em tradução livre], ainda pouco conhecido e estão entre os fenômenos mais energéticos do Universo. Emitem, por vezes em milissegundos, o equivalente a toda produção de energia pelo Sol em três dias.

Assim, contribuirá com a visão do Hemisfério Sul para um trabalho sobre o fenômeno que já vem sendo realizado por meio do Chime (Canadian Hydrogen Intensity Mapping Experiment) no Hemisfério Norte. No futuro, além de uma compreensão sofisticada do Universo, teremos fontes mais complexas de energia limpa, viagens para fora da Terra, hoje já realidade, prevenção de quedas de asteroides, também hoje quase uma realidade, e busca de vida fora do planeta Terra.