Publicidade

Esta explosão pode mostrar que é possível extrair energia de buracos negros

Por  • Editado por  Patricia Gnipper  | 

Compartilhe:
ESA/Hubble, M. Kornmesser
ESA/Hubble, M. Kornmesser

Embora nada possa escapar do horizonte de eventos de um buraco negro, pode ser que alguns eventos extraiam a energia inerente a esses objetos, convertendo-as em fenômenos altamente energéticos. Essa é a hipótese demostrada por uma equipe no ano passado, e agora os autores descrevem como tal mecanismo pode ocorrer em um sistema binário, formado por um buraco negro e uma estrela de nêutrons.

Para este estudo, os cientistas usaram como exemplo o evento que ficou conhecido como GRB 190114C — uma explosão de raios gama extraordinária ocorrida em uma galáxia a 4,5 bilhões de anos-luz de distância, detectada em janeiro de 2019. Com cerca de um trilhão de elétron-volts, ela é considerada a mais poderosa de seu tipo dentre as já detectadas até hoje, e já foi descrita como a “maior explosão no universo desde o Big Bang”.

O que poderia causar tal evento? De acordo com o astrofísico Remo Ruffini, um dos autores do novo estudo, "sua luminosidade nos raios gama, durante o tempo do evento, é tão grande quanto a luminosidade de todas as estrelas do universo observável”. Desde a detecção, alguns pesquisadores propuseram hipóteses possíveis, como o próprio Ruffini fez em 2020. Segundo ele, essa explosão foi alimentada por buracos negros de massa estelar, através de "um mecanismo até agora desconhecido".

Canaltech
O Canaltech está no WhatsApp!Entre no canal e acompanhe notícias e dicas de tecnologia
Continua após a publicidade

Buracos negros supermassivos ativos nos centros das galáxias podem ter campos magnéticos poderosos, e os astrônomos estão cada vez mais confiantes que esses campos podem conduzir partículas do plasma no disco de acreção para os polos do buraco negro, produzindo assim os jatos relativísticos. Mas esse processo em si não parece utilizar a energia cinética do buraco negro, além de se tratar de um objeto muito diferente dos buracos negros de massa estelar.

Entretanto, há pistas sugerindo que buracos negros estelares podem atuar como uma espécie de acelerador de partículas. Isso pode ocorrer porque, assim como qualquer outro objeto no universo, buracos negros possuem rotação e momento angular, herdados da estrela progenitora (a estrela que colapsou para formar o buraco negro). Evidências também sugerem que esses “aceleradores de partículas” cósmicos estão envolvidos nas explosões de raios gama, como a grandiosa GRB 190114C.

De acordo com a equipe de Ruffini, no artigo de 2020, esse processo começa com um sistema binário formado por uma estrela de carbono-oxigênio no final de sua vida e uma estrela de nêutrons. Quando a estrela moribunda explode em supernova, o material ejetado pode ser rapidamente sugado pela estrela de nêutrons companheira. A companheira então passa do ponto de massa crítica e colapsa em um buraco negro, que lança uma explosão de raios gama. Enquanto isso, o núcleo da estrela que explodiu colapsa em uma segunda estrela de nêutrons.

Agora, em um novo artigo a equipe se concentra em explicar o mecanismo específico que resulta nessa explosão de raios gama de alta energia. Segundo o estudo, as linhas de campo magnético herdadas da estrela de nêutrons-mãe do buraco negro extrai energia rotacional da ergosfera — a região exterior e próxima ao horizonte de eventos de um buraco negro em rotação, onde o campo gravitacional do buraco negro gira junto com ele, criando uma zona de "arraste" do espaço-tempo.

À medida que o material expelido pela supernova continua a cair no buraco negro recém-formado, explosão de raios gama de 1,99 a 3,99 segundos é produzida. Mais material caindo no buraco negro resulta na formação de jatos e radiação gama na faixa de gigaeletronvolt, graças à extração da energia rotacional do buraco negro. Este objeto em rotação interage com o campo magnético circundante e “cria um campo elétrico que acelera os elétrons a energias ultra-altas, levando a radiação de alta energia e raios cósmicos de energia ultra-alta”, explica Ruffini.

Diferente dos jatos relativísticos nos buracos negros supermassivos, que apresenta um mecanismo de emissão contínua, a proposta da equipe de Ruffini libera as explosões em intervalos. A cada vez que um “quantum” de energia do buraco negro é acumulado para produzir a emissão de raios gama, ocorre uma liberação, repetindo-se uma após a outra. Para o pesquisador, “podemos usar a energia rotacional extraível de um buraco negro para explicar as emissões de alta energia das explosões de raios gama e núcleos galácticos ativos”.

Continua após a publicidade

Apesar a confiança dos autores, o tema ainda pode causar alguma controvérsia, uma vez que outras equipes demonstraram outros mecanismos para explicar o mesmo tipo de eventos. De qualquer forma, as observações das explosões de raios gama, realizadas graças aos equipamentos modernos, proporcionaram modelos que a astrofísica não podia fornecer décadas atrás. Descobrir qual deles está correto parece ser questão de tempo.

Fonte: Science Alert