Cientistas atingem marco na fusão nuclear, mas não conseguem repetir experimento
Por Daniele Cavalcante • Editado por Rafael Rigues |
Em agosto de 2021, um experimento de fusão nuclear produziu 10 quatrilhões de watts de potência em 100 trilionésimos de segundo. Agora, um artigo prova que os pesquisadores conquistaram um grande marco naquela ocasião: alcançar algo chamado “ignição”. O problema é que eles não sabem como fazer isso outra vez.
- Fusão nuclear: próximos reatores podem dar um salto com estes materiais
- Este reator de fusão nuclear produziu 10 vezes mais reações que o esperado
A ignição de um reator de fusão nuclear é o momento quando a reação produz mais calor do que o necessário para mantê-la, ou seja, ela se torna sustentável, independente de uma fonte de energia externa. Até hoje, este é um dos maiores desafios dos experimentos desse tipo. Foi a primeira vez que os cientistas do National Ignition Facility, localizado na Califórnia, conseguem realizar a façanha.
No artigo, os autores descrevem uma análise recente em que o experimento de 2021 foi “julgado” com base em nove versões diferentes do critério de Lawson — um conjunto de observações criado em 1955 pelo físico John Lawson para ajudar cientistas a saberem se a ignição ocorreu.
Segundo o artigo, a equipe do reator não apenas atingiu, como superou os requisitos das nove versões diferentes do critério de Lawson. Isso foi realizado ao usar uma cápsula de combustível de trítio e deutério em uma câmara de urânio empobrecido, revestida de ouro, contra a qual foram disparados 192 lasers de alta energia.
A fusão nuclear ocorre quando as forças impostas sobre a cápsula de combustível são o suficiente para esmagar os átomos e fundi-los em um novo elemento. Esse processo libera uma quantidade enorme de energia — e é assim que as estrelas como o Sol conseguem brilhar tão intensamente. É diferente do processo de "fissão" usado nos atuais reatores nucleares, quando átomos são "partidos", liberando energia no processo.
O problema é que, diferente das estrelas, não há gravidade e pressão o suficiente nos nossos reatores para uma fusão ocorrer de modo tão simples como acontece nos “sóis” universo afora. Para contornar esse problema, os cientistas precisam conter o gás aquecido, transformado em plasma, no centro da câmara, por meio de um campo magnético.
Na teoria, o processo deveria produzir mais energia do que a quantidade usada para ativar os lasers. Esse ponto nunca havia sido atingido, até o experimento da equipe da National Ignition Facility em 2019. A má notícia é que eles depois tentaram replicar o resultado em quatro experimentos semelhantes, mas só conseguiram produzir metade da energia.
Mudanças quase imperceptíveis, como diferenças na estrutura de cada cápsula e a intensidade dos lasers, podem afetar os resultados. “Se você começar de um ponto de partida microscopicamente pior, isso se refletirá em uma diferença muito maior no rendimento final de energia”, disse Jeremy Chittenden, do Imperial College London.
Ainda não se sabe quais foram as alterações nos quatro experimentos posteriores ao de agosto de 2021. A equipe ainda tenta determinar quais são as condições iniciais necessárias para repetir o êxito daquela ocasião, mas, até lá, não há garantias de que a fusão nuclear do National Ignition Facility conseguirá distribuir energia à população.
O artigo foi publicado no Physical Review Letters.
Fonte: Physical Review Letters; via: ScienceAlert