Copilotos de IA: da automatização à cointeligência
Por Luiz Othero |

Nos últimos anos, a discussão sobre inteligência artificial tem sido dominada por um vocabulário que, basicamente, é centrado na automatização. Substituir tarefas manuais, cortar custos, acelerar fluxos e adequar processos fazem parte de uma narrativa que, por mais relevante que seja no âmbito corporativo, representa apenas uma fração do real potencial da IA.
Como tenho defendido recorrentemente nesta coluna, não acredito exatamente no potencial da IA separada do humano; defendo, efetivamente, que o real valor da tecnologia está no seu poder transformativo quando aliada à capacidade humana, de modo que se possa, assim, trazer uma real disrupção para as organizações.
Dentro desse contexto, a criação de copilotos de IA – em resumo, sistemas projetados para aumentar a capacidade humana – podem representar uma virada de chave, atribuindo valor a um fator mais do que fundamental nessa equação: a colaboração.
Neste artigo, irei aprofundar mais a discussão sobre os copilotos de IA e por que eles podem ser extremamente importantes na evolução da implementação de IA nas organizações. Acompanhe a leitura!
O prefixo “co”
Em primeiro lugar, é interessante notar que a implementação e construção de copilotos de IA tende a mudar a lógica acerca da utilização e percepção da tecnologia: ao invés de retirar o humano da equação – um grande receio por parte dos profissionais e que ainda persiste –, eles podem ampliar sua capacidade de ação. O termo, inclusive, parece uma feliz escolha, já que, como apontei no início do texto, sugere colaboração, a introdução de um parceiro cognitivo.
E, conforme os anos passam, as companhias também passam a entender sua valorização. De acordo com um relatório da DataIntelo, o mercado global de copilotos de IA aplicados a fluxos de trabalho foi avaliado em US$ 3,2 bilhões em 2024, com a expectativa que atinja US$ 28,3 bilhões até 2033, uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de impressionantes 28,6%.
Segundo análise presente no estudo, a crescente necessidade de eficiência operacional e produtividade em todas as organizações são fatores que impulsionam esse mercado, demandando a integração dos copilotos às operações diárias. Nesse sentido, a integração de tecnologias avançadas de Machine Learning e processamento de linguagem natural permite não só que copilotos forneçam, por exemplo, recomendações personalizadas e aprimorem a produtividade, mas também maior qualidade na tomada de decisões.
Um exemplo dentre vários da utilização desses assistentes se deu no hospital Chi Mei Medical Center, em Taiwan, que tem se utilizado de copilotos de IA – construídos a partir do Azure OpenAI, da Microsoft – para dar suporte a médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde em tarefas administrativas e de documentação. Para isso, foi necessário a integração de sistemas de IA com bases de dados hospitalares – informações de medicações, resultados de exames, histórico médico –, a fim de possibilitar uma visão consolidada e ampla acerca dos pacientes.
Desde o fim de 2023, diversos copilotos foram lançados e utilizados no hospital, com resultados interessantes:
- Farmacêuticos dobraram o número de atendimentos diários: de 15 pacientes para
30; - Enfermeiros reduziram o tempo de documentação de transferências de leito e notas
de admissão de 10 a 20 minutos para 5 minutos; - Médicos passaram a levar 15 minutos na produção de relatórios, atividade que,
anteriormente, consumia cerca de 1h do dia.
E, para além de resultados numéricos, que remetem quase que unicamente à produtividade, a utilização de copilotos contribuiu para a humanização dos pacientes. Segundo Hung-Jung Lin, CEO do centro médico, ao permitir a compilação de informações de bancos de dados fragmentados – não só prontuários médicos, mas sobretudo dados sobre histórico econômico e familiar e relatórios de assistentes sociais, informações que podem passar despercebidas nas consultas –, a utilização de IA “lembrou aos profissionais como demonstrar empatia”.
Cointeligência e o aumento das capacidades
Exemplos como o citado acima destacam e reforçam a importância justamente da colaboração, em um contexto em que a máquina aumenta as capacidades do ser humano. Esta proposição, inclusive, conversa diretamente com a ideia de cointeligência, um conceito desenvolvido pelo professor Ethan Mollick, da Wharton School e um dos maiores pensadores sobre IA generativa aplicada, e que é tema central de seu livro “Co-Intelligence: Living and Working with AI”, publicado em 2024.
Para Mollick, a verdadeira força da IA não está em substituir, mas em trabalhar de forma conjunta com humanos; dessa forma, o valor surge na interação, no “entre”, o que demanda também – como tenho defendido em outras colunas – uma preparação por parte do profissional, de modo que ele saiba explorar, questionar e refinar suas respostas e decisões com IA. Em resumo, entende a cointeligência não só como um aumento, mas um novo tipo de inteligência coletiva que nasce desta integração humano-máquina.
A ideia de cointeligência se liga diretamente ao conceito de IA aumentada (augmented AI ou AI Augmentation), o qual se refere à expansão das capacidades e da inteligência humanas, indo além da automatização, potencializando a criatividade, tomada de decisão e eficiência.
Assim, quando pensamos na IA autônoma, são trajetórias que se complementam e que desenham um futuro da tecnologia, ambas partindo de bases tecnológicas similares, mas com impactos sobre sociedade e negócios bastante distintos.
Enquanto uma traz a abordagem da colaboração e inteligência coletiva, a partir dos copilotos, a outra aponta para um cenário em que a máquina assume mais responsabilidades, com o fator humano exercendo um papel de coordenação – como tende a ser o caso dos agentes de IA, dentro de um contexto de coexistência das duas.
Logo, diante do que foi apresentado neste artigo, fica claro que os copilotos de IA não representam apenas mais uma etapa na curva de implementação da tecnologia, mas um novo paradigma de colaboração, sobretudo no âmbito corporativo. Enquanto agentes autônomos caminham para transformar a forma como processos são e serão conduzidos, os copilotos se apresentam como uma ponte entre a tecnologia e o humano, com ganhos consideráveis não só de eficiência, produtividade e criatividade mas também, em alguns casos – como o exemplo do hospital de Taiwan –, de empatia.
O futuro da inteligência artificial não será uma escolha entre aumento e autonomia, mas a convivência estratégica entre ambos, cabendo às organizações e aos profissionais, portanto, compreender onde cada uma das abordagens pode gerar mais valor.