5G, transformação digital e energia elétrica
Por José Otero |
Nos últimos anos, os governos incorporaram o conceito de transformação digital em suas agendas de desenvolvimento. Este termo tornou-se um elemento essencial de qualquer discurso de política pública centrado no desenvolvimento econômico, na oferta de serviços públicos e na geração de recursos. No entanto, o que significa transformação digital raramente é explicado com precisão, apesar das muitas promessas a ela associadas.
Uma interpretação simples sugere que a transformação digital se refere à digitalização de processos para torná-los mais eficientes. Portanto, conceitos como a Internet das Coisas, o metaverso, os territórios inteligentes e a economia 4.0 são componentes-chave desta transformação. Esta mudança de paradigma nos processos operacionais é apoiada por diversas tecnologias, como automação, Big Data, análise, computação em nuvem, cibersegurança (incluindo o uso de blockchain) e diferentes tipos de inteligência artificial.
O principal objetivo da transformação digital é aumentar a eficiência através do uso da tecnologia, o que por sua vez aumenta a produtividade.
No entanto, nem todas as transformações digitais são iguais. Aquelas que ocorrem no setor privado tendem a ser mais controladas e podem ser implementadas gradativamente, divisão por divisão dentro de uma empresa. No setor público, o processo é muito mais complexo e lento. Primeiramente, devido à existência de diferentes níveis de governo, é necessário que a transformação ocorra dentro de órgãos e entidades do mesmo porte, sejam federais, estaduais ou municipais. Em segundo lugar, as iniciativas que integram estes níveis devem ser coordenadas para que a informação flua e se integre corretamente entre as jurisdições.
Do ponto de vista prático, para que a transformação digital seja eficaz, devem existir redes de telecomunicações resilientes, capazes de transportar grandes quantidades de dados. O ecossistema 5G atende a esses requisitos, pois requer não apenas antenas, mas também grandes investimentos em fibra óptica e, eventualmente, na integração de redes de satélites. Para cumprir as três grandes promessas da 5G – velocidade de dados, Internet das Coisas industrial e baixa latência – é necessária a atribuição de frequências de espectro em bandas baixas, médias e milimétricas.
Um aspecto positivo da 5G é que, segundo a empresa de consultoria Mobile Experts, esta tecnologia deve reduzir o custo de transmissão de dados em até 80%, o que tornaria mais barato o uso de aplicações com uso intensivo de dados, como realidade virtual, análise ou hologramas. Ou seja, a tecnologia seria um catalisador para a transformação digital, diminuindo os custos de digitalização. O aspecto negativo é que o aumento da densidade da rede, devido à maior utilização de bandas médias e milimétricas, a proliferação de redes MIMO e o aumento exponencial de dispositivos conectados poderá traduzir-se num aumento considerável do consumo de energia elétrica, atingindo até 300%, segundo consultorias como 451 Research, McKinsey & Company e Analysys Mason. No entanto, o aumento do consumo de energia não se limita à 5G, uma vez que aplicações como a blockchain e a inteligência artificial também irão impactar em um futuro próximo.
Um estudo da Universidade de Cambridge mostra que o uso do Bitcoin consome cerca de 100 a 120 TWh por ano. Além disso, além da mineração de criptomoedas, espera-se que o blockchain desempenhe um papel fundamental na segurança cibernética, o que também terá implicações no consumo de energia. Da mesma forma, as aplicações generativas de inteligência artificial também aumentarão o consumo. E não podemos esquecer do impacto da virtualização e do aumento da utilização da computação em nuvem, que irá impulsionar a proliferação e o crescimento de centros de armazenamento de dados, cada um com grandes necessidades energéticas.
Como já temos acompanhado crises energéticas em diversos países, vamos nos voltar para o que os investidores procuram? Simples: um quadro jurídico que respeite as instituições governamentais e não seja dominado pela discricionariedade regulamentar. Procuram também infraestruturas em boas condições, sobretudo em áreas de interesse para os seus investimentos.
Para atrair investidores, são necessários grandes investimentos em infraestruturas civis e de telecomunicações, especialmente em antenas 5G e fibra óptica. Da mesma forma, é fundamental alocar espectro em faixas médias e milimétricas. Estas são as condições mínimas que um país deve cumprir se quiser atrair capital de grandes fornecedores de tecnologia. Infelizmente, o número crescente de apagões elétricos na América Latina tornou-se um dos maiores obstáculos à adoção de tecnologias que permitiriam a transformação digital. Sem um serviço elétrico estabilizado, a transformação digital não será possível.
A implantação da fibra óptica é fundamental para a digitalização dos serviços e é essencial para a expansão da 5G. Contudo, tal como as redes de telecomunicações são aprimoradas para tornar o país mais atraente para o investimento estrangeiro, é igualmente necessário melhorar as redes elétricas. Caso contrário, as redes de telecomunicações serão subutilizadas e pouco atrativas para investidores que procuram mercados com estabilidade na oferta de serviços.
Sem um sistema elétrico fiável e estável, qualquer esperança de um país se tornar uma potência digital será um mero sonho.