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Crítica | Next Gen: Ação de primeira com resultado robótico

Por| 14 de Setembro de 2018 às 13h17

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Netflix
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Em um mundo cada vez mais refém do amanhã, onde a próxima geração de smartphones pode ter o poder de chamar mais atenção do que um incêndio em um dos maiores museus de história natural e antropologia das Américas, Next Gen surge como uma crítica negativa escancarada ao vício por tecnologia. Com esse viés, a criação de um vilão único e óbvio livra os verdadeiros culpados e acaba transformando essa animação da Netflix no simples jogo do bem contra o mal, onde o mal é Justin Pin – uma espécie de Steve Jobs possuído por um capiroto do futuro – e o bem é Mai – uma adolescente, obviamente, retrô.

Entre essa dualidade, está 7723, um robô que tem muitas semelhanças com o Baymax (de Operação Big Hero), seja nas características físicas ou, especialmente, nas questões de amizade – o que inclui a investida para que ele (o robô) auxilie a protagonista em uma espécie de vingança. O problema é que, aqui, a vingança não é inicialmente contra o culpado pela morte do próprio irmão, mas contra uma colega de escola que pratica bullying.

Cuidado! Daqui em diante a crítica pode conter spoilers!

Reflexões com toques sádicos e coragem real

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É exagerando nessa abordagem e na impulsividade de Mai que Next Gen traz algumas reflexões válidas e cria, dentro dessa camada de hiperexposição, um paralelo justamente com o bullying, dialogando sobre o quão prejudicial é esse tipo de violência (seja física ou psicológica) – ainda mais por ser praticado dentro de uma relação de poder desigual. Para uma mente em formação, já maltratada por um desligamento paterno, carente de mãe (por esta ser envolvida demais com os robôs) e encharcada de hormônios, pode ser o pavio mais do que necessário para atitudes extremas.

Mas a animação, que é coproduzida por Estados Unidos, Canadá e China (com algumas poucas falas em mandarim inclusive), prefere não discutir a fundo essa questão. Assim como não procura profundidade em qualquer outro aspecto. Enquanto não há sutileza na abordagem futurística, revelando um mundo tecnologicamente homogêneo, o roteiro escrito por Kevin R. Adams e Joe Ksander (os próprios diretores) tenta centralizar outras temáticas – amizade, memória e violência – e acaba por dizer muito sobre nada. Aliás, ao discursar sobre os efeitos da violência para conter a violência, Adams e Ksander constroem algumas cenas sádicas, como aquela em que 7723 destrói um pobre robozinho em um campo de futebol e, logo depois, promovem uma desnecessária chuva de partes e membros do falecido (mesmo ponto onde exagerou Carros 2, da Pixar).

Por outro lado, há coragem real já nos créditos iniciais, que apresentam a infância e o desenvolvimento da personagem (de onde vem todo o ódio reprimido) ao som do rock alternativo da banda Bikini Kill. A música é Rebel Girl e sua tradução remete a uma garota rebelde que é o início de uma revolução, de um posicionamento perante uma maioria:

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“Quando ela anda, a revolução está vindoQuando ela fala, eu escuto a revoluçãoEm seus quadris, há revoluçãoEm seu beijo, eu provo a revolução”(trecho da música em tradução livre)

As excelentes sequências de ação, as referências e o resultado

Ainda, as sequências de ação são excepcionais, desde a inicial, quando 7723 enfrenta tudo o que aparece para entregar a mochilinha da rebel girl, à final, quando a luta entre o carismático robô e a monstruosa máquina de Justin Pin dá-se como uma referência à batalha entre RoboCop e RoboCain, em RoboCop 2.

São exatamente a ação e as referências que dão destaque a Next Gen. Os planos abertos da cidade, particularmente os noturnos, encontram correspondentes no clássico Blade Runner, o Caçador de Androides – com direito à exposição de unicórnios (o animal símbolo do filme de Ridley Scott) –; a visão investigativa dos robôs em muito se assemelha a do RoboCop, mas com o acréscimo do sensor de calor de O Predador; há referências visuais a Clube da Luta; e a mais descarada: o Justin Pin Exterminador do Futuro.

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Mas a verdade é que tudo cai no clichê e no previsível durante o filme. A rivalidade entre Steve Jobs e Steve Wozniak dá vida às caricaturas Justin Pin e Dr. Tunner Rice, algo que é praticamente tal e qual na aparência, além de ser de uma polarização excessiva. Não é difícil prever a vilania de Pin e, por mais que exista alguma surpresa na revelação que abre o último ato, há um quê de requentado de cada revolução das máquinas já realizada em filmes – deixando de ser referência para ser uma solução mais do mesmo.

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A animação tenta emocionar, mas falha por não criar empatia com a sua protagonista. Ela, uma menina que tinha potencial para ser uma representação complexa da adolescência – como demonstrou a abertura do filme –, acaba se tornando o clichê do adolescente revoltado que aprende com os erros e modifica outrem ao seu redor. E o filme em si, que tem tantas referências interessantes e cenas de ação tão fantásticas, acaba sendo uma ironia de si mesmo: embora seja corajoso em alguns pontos, como na citada abertura e na utilização de palavrões “bipados”, Next Gen constrói uma história onde até a escova de dentes é um robô e finda com um resultado bastante robótico.