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Missão: Impossível – Efeito Fallout é o primeiro grande representante de uma era

Por| 27 de Julho de 2018 às 20h00

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Missão: Impossível – Efeito Fallout é o primeiro grande representante de uma era
Missão: Impossível – Efeito Fallout é o primeiro grande representante de uma era

Desde 1996, quando Brian de Palma (salve) dirigiu Missão: Impossível, Tom Cruise demonstrou que o seu Ethan Hunt tinha fôlego para muito mais. Com 34 anos de idade, o ator colocava uma faca entre os dentes, dispensava dublês em diversas sequências de ação e construía, junto ao diretor, cenas que se tornariam imortais para o cinema de gênero.

Dessas, a mais icônica é aquela em que, dependurado com o auxílio de Krieger (Jean Reno) sobre sensores de alarme, Ethan evita que uma gota de suor que escorre pela lente dos seus óculos estrague os planos de sua equipe. Com aquele filme, nascia um misto de ação e thriller com uma tensão cheia de planos detalhes que De Palma sabia utilizar como poucos.

Mas foi quatro anos depois, em 2000, que o mundo percebeu a fragilidade que um filme tão bem alicerçado pode ter quando não há uma compreensão do seu significado. Assim, para intensificar a ação, John Woo — um mestre de sua época (que ficaria datado) — assumiu a direção. O roteiro, por outro lado, era um arremedo de qualquer coisa; uma história boba de gato e rato que envolvia ciúmes e uma referência bizarra ao A Outra Face — filme de 1997 com John Travolta e Nicolas Cage e que (oh) fora dirigido por Woo.

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É vida que segue que se diz? Pois, para Ethan Hunt, a vida seguiu em silêncio após a forçada autorreferência de Woo. Até que, seis anos depois, J.J. Abrams assumiu o terceiro capítulo da franquia ainda inconstante e recolocou tudo nos eixos. Nada brilhante, mas os personagens voltaram a respirar sem aparelhos. Na sequência, a leveza do diretor Brad Bird (de Ratatouille e Os Incríveis) deu ao quarto episódio (Missão: Impossível – Protocolo Fantasma) mais confiança.

Até que chegou Christopher McQuarrie e botou ordem na casa como se dissesse: “Se é para fazer uma sequência, que ela tenha unidade.” McQuarrie não somente definiu um caminho uniforme a seguir como conseguiu unir o que cada diretor que o antecedeu tinha de melhor. Dessa forma, Missão: Impossível – Nação Secreta surgiu como um prelúdio, uma base para o atual.

A reconstrução de um gênero

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E a base foi tão bem sedimentada que McQuarrie reconstruiu o cinema de gênero com Missão: Impossível – Efeito Fallout: a ação recebeu mais camadas dramáticas (sem despencar para melodramas ou clichês); Ethan Hunt foi descentralizado da trama apesar de obviamente ser o protagonista; as mulheres receberam uma importância que vai da femme fatalle de Vanessa Kirby com sua Viúva Branca ao desenvolvimento da fantástica Ilsa Faust (Rebecca Ferguson) — que repete a sua participação; os alívios cômicos exagerados deram lugar a um Benji Dunn (Simon Pegg) mais contido e sem perder a sua personalidade; Ving Rhames com seu Luther Stickell recebeu muito mais importância (como poderia ter acontecido há tempos); e o vilão deixou de ser episódico e unidimensional para ser de uma complexidade rara em filmes de ação — tão rara que o último que alcançou a profundidade de Solomon Lane (o espetacular Sean Harris) deve ter sido o Hans Gruber de Alan Rickman no primeiro Duro de Matar, 1988 (30 anos atrás).

Pode parecer exagero, mas o aprisionado e anarquista Solomon revela-se uma ameaça tão verdadeira (graças à atuação assustadora de Harris) que a ameaça nuclear se torna iminente. O olhar focado daquele homem, que mesmo preso mete medo (sic) — auxiliado também por closes certeiros em seu diálogo mais fervoroso com Ethan —, só consegue ser comparado, dentro do filme, à expressão sempre firme de Tom Cruise.

O tornozelo e o bigode

E é uma loucura constatar que Cruise ainda evita o uso de dublês na maioria das cenas. Não exatamente pela dificuldade destas, que são realmente difíceis sem nenhum obstáculo a mais, mas por sua idade. O ator, que recentemente completou 56 anos, parece que bate guaraná em pó, açaí, catuaba e ovo de codorna em meio litro de café expresso antes das filmagens. Tanto que, em uma das cenas, quebrou o tornozelo e seguiu sem cortes, mancando, mas firme no corpo do seu Ethan (e atrasou as filmagens depois, claro). Ele (Cruise), apesar de não ser um ator dramaticamente de grande expressão, é, sem dúvida, um ator que jamais se limita a um “piloto automático”. Sua intensidade é perceptível, inclusive, na forma como ele trinca a mandíbula nos momentos mais nervosos da trama.

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McQuarrie, do mesmo modo, entrega-se ao filme com tanta competência que as cenas de ação dirigidas por John Woo em 2000 são instantaneamente esquecidas. Aquela movimentação coreografada de Woo dá espaço à inquieta câmera de McQuarrie, que, mesmo imparável, consegue ser muito bem compreendida. Essa mesma câmera, posicionada para diversos contra-plongées (abaixo do nível dos olhos e voltada para cima), engrandece a personagem de Henry Cavill (o intimidante de tão grande e forte August Walker) e fortalece à excelente atuação do atual Superman. As más línguas dirão que a força está no bigode (o mesmo que desgraçou o buço do ator em Liga da Justiça), mas a verdade é que uma performance, especialmente de um ator menos expressivo do que o próprio Sean Harris, depende bastante da direção de elenco — que, aqui, é impecável.

O primeiro grande representante

A verdade é que Missão: Impossível – Efeito Fallout não para, assim como o tempo (diria Cazuza). A ação é praticamente ininterrupta e se, ao final, a lembrança for de que o filme começou lento e depois engrenou, trata-se de um problema de perspectiva: O último ato é tão intenso que não somente o início do filme como muito do que já foi realizado dentro do gênero da ação parecerá morno.

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Em uma época que os blockbusters buscam lucro em cima de lucro, um filme de ação ir aos cinemas com quase duas horas e meia de duração é de muita coragem. Missão: Impossível – Efeito Fallout perde, sim, uma sessão diária em cada sala que estiver sendo exibido, mas ganha em um processo histórico. Em tempos que o cinema de gênero vem ganhando mais e mais espaço (vide o terror), a ação ganha o seu primeiro grande representante.