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O que é o experimento da dupla fenda e o apagador quântico de escolha?

Por| Editado por Patricia Gnipper | 06 de Outubro de 2022 às 12h44

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Quantum Mechanics/YouTube
Quantum Mechanics/YouTube

O experimento da dupla fenda foi um dos mais importantes para a mecânica quântica por demonstrar a função de onda e de partícula dos fótons de luz e dos elétrons. Mas uma versão em particular do experimento sugere algo assombroso: fótons podem alterar o passado. Será?

Experimento da dupla fenda

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Durante muito tempo, cientistas travaram uma “disputa” sobre a natureza da luz. O modelo da luz como partícula (ou "modelo corpuscular da luz"), proposto por Isaac Newton no séc. XVII, explicou de modo satisfatório os fenômenos observáveis. Assim, essa se tornou a teoria aceita por muito tempo.

Entretanto, no século XIX, o inglês Thomas Young realizou a famosa experiência da dupla fenda. Trata-se de uma placa opaca com dois orifícios e uma segunda placa mais afastada, onde uma luz emitida é projetada. Os padrões exibidos na projeção mostram um padrão de onda.

Isso ocorre porque, ao passar pelas fendas, a luz é difratada, produzindo um efeito ondulatório. Ao se chocar com o segundo painel (anteparo), forma-se um padrão de ondas de interferência construtivas e destrutivas (a interferometria é o estudo do modo como as ondas se sobrepõem, ou seja, são combinadas de modo que podem interagir).

O experimento de Young mostra nitidamente os padrões de interferências no anteparo, resultado da interação entre as ondas formadas em ambos os orifícios. Isso parecia colocar um ponto final na história, mas o séc. XX surpreendeu a todos com a mecânica quântica.

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Dualidade onda-partícula

O modelo de ondas não conseguia explicar o fenômeno da emissão fotoelétrica, que atormentava cientistas no final do séc. XIX. Então, Albert Einstein propôs um modelo de pacotes de energia (quantum) para resolver o problema, o que lhe garantiu o Prêmio Nobel e abriu as portas para a mecânica quântica. A luz voltou a ser considerada uma partícula.

Porém, as coisas ainda ficariam mais estranhas. Clinton Davisson e Lester Germer fizeram o experimento da dupla fenda com elétrons, usando uma placa de cristal de níquel. Eles observaram que os elétrons passando por uma única fenda na forma de partículas e por duas fendas na forma de onda.

A conclusão é que a luz e os elétrons (e até mesmo moléculas) agem como ondas e como partículas. Porém, o comportamento observado depende de algo bem específico: a observação.

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O problema da escolha

Uma das lições que os físicos aprenderam com esse experimento e suas variações é que, na mecânica quântica, a luz (e elétrons) “escolhe” ser onda ou partícula. Mas não se engane pelo termo: não existe uma consciência capaz de tomar decisões, embora também nada seja aleatório.

A escolha está diretamente relacionada à observação. Assim como na metáfora do gato de Schrödinger, a luz é onda e partícula ao mesmo tempo, até que observemos — nesse instante, ela “decide” se apresentar em uma de suas possíveis formas.

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Também é preciso ter cuidado com a palavra “observar”, empregada aqui. Novamente, a matéria e a luz não têm consciência e não sabe que estamos olhando para elas, esperando algo acontecer. Observação nesse contexto implica em detectores que emitem fótons, que por sua vez interagem com o feixe de luz usado no experimento.

Com isso, o observador está interferindo no experimento, levando a luz a “escolher” se vai se apresentar como luz ou como partícula. E, sabendo disso, os cientistas criaram versões do experimento de dupla fenda que tentam “confundir” os fótons de luz.

Se o experimento original for realizado com dois feixes de luz, não podemos saber em qual orifício cada fóton passará. Significa que, sem essa informação, os padrões no anteparo são de ondas. Entretanto, se colocarmos um detector para observar por qual fenda cada fóton passa, o padrão no anteparo será de partículas.

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Isso acontece com os detectores colocados tanto na frente, quanto atrás das fendas. Não importa o que os cientistas façam: se eles observarem os fótons, o padrão de onda não surgirá.

Aqui as coisas já ficam bizarras, porque, até então, supunha-se que os detectores do outro lado das fendas não pudessem interferir no padrão de ondas. Essa suposição vem da ideia de que o padrão de interferência só se forma após a luz passar pelas duas fendas.

Esse novo teste ficou conhecido como experimento da escolha atrasada, pois a luz escolhe o padrão de partículas mesmo com a observação sendo feita após a formação de interferência das duas ondas.

Como esse padrão de ondas desaparece com a presença do detector do outro lado das fendas? Por que ele interfere na função de onda dos fótons, mesmo após os feixes de luz passarem pelos orifícios? Calma, pois fica ainda mais esquisito.

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Borracha quântica

Uma variação chamada de borracha quântica parece sugerir que os fótons podem mudar a escolha feita no passado. Para demonstrar isso, os cientistas adicionaram um aparato complexo no experimento de dupla fenda.

O teste é feito com dois feixes de luz, emitindo em direção aos dois orifícios, sem que os cientistas possam deduzir por qual fenda cada fóton passará. Após a parede contendo as fendas, há dois cristais de beta borato de bário, um para cada abertura.

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Esse cristal divide quaisquer fótons em dois, cada um com metade da energia do original. O detalhe crucial é que essa dupla de fótons é emaranhada, ou seja, todas as suas características são compartilhadas, independente da distância. Se um deles sofrer alguma alteração, o outro também sofrerá.

Um fóton desse par deve continuar até atingir o anteparo, para criar o padrão de interferência (onda). Lembre-se, quando não sabemos por qual fenda os fótons passaram, veremos o padrão de ondas.

O outro fóton da dupla de “gêmeos” emaranhados viaja para detectores bem afastados do anteparo. Se o detector A acender, significa que o fóton que o atingiu passou pela fenda A. Se o detector B acender, é porque o seu fóton passou pela fenda B. Agora, sabemos exatamente por qual orifício cada fóton está passando, sem interferir com o fóton que viaja rumo ao anteparo.

A ideia é entender como o comportamento desafiador dos fótons funciona, mas o resultado foi curioso. Sem os detectores, o padrão é de ondas. Com detectores denunciando por onde os fótons passaram, mesmo bem afastados, o padrão é de partícula.

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Há duas implicações nesse experimento: uma delas é que fótons emaranhados “transmitem” informação entre si, como se estivessem “confabulando” para apresentar determinado padrão no anteparo. Isso aconteceria até mesmo se o detector estivesse a bilhões de anos-luz de distância.

E aqui está a segunda implicação bizarra: o fóton que formará o padrão no anteparo sempre chega ao seu destino antes de o detector ser acionado pelo seu gêmeo emaranhado. Ainda assim, ele “sabe” que o cientista descobrirá por qual das fendas o feixe passou, e apresenta função de partícula.

Uau! Significa que o fóton no detector transmitiu uma informação retroativamente? Ou fóton no anteparo conseguiu prever que seu gêmeo seria detectado? Isso seria fascinante.

Mas vamos tornar tudo ainda mais inacreditável.

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Apagando o passado

O experimento da borracha quântica apagadora de passado mostrou que o processo acima pode ser revertido, confundindo os detectores. No próximo experimento, os cientistas adicionaram os detectores C e D que “apagam” a informação dos detectores A e B.

Conforme mostra o diagrama acima, os fótons chegam aos detectores por meio de dois refletores (vamos chamá-los de A1 e B1). Apesar de direcionar fótons para A e B, eles também deixam metade dos fótons atravessá-los.

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Desde modo, alguns fótons (ainda emaranhados com aqueles que estão atingindo o anteparo) chegam aos refletores mais distantes (chamaremos de C1 e D1). Estes refletem os fótons em direção aos detectores C e D, mas não sem antes atravessar um último refletor (E).

Aqui está o segredo do experimento. Este último refletor também reflete metade dos fótons, e deixa outra metade atravessá-lo. Com isso, os cientistas não têm mais nenhuma informação de qual fenda cada fóton atravessou. Os detectores estão piscando, mas não informam nada.

O resultado: os fótons gêmeos indo para o anteparo mostram padrão de onda. Pior ainda, eles fazem isso antes de sequer um detector acender. Confira abaixo a explicação completa, com animações que ajudam na compreensão (em inglês).

Isso não é estranho? Nenhum desses detectores devia interferir nessas escolhas, já que eles acendem após os fótons gêmeos atingirem o anteparo. Quando apenas A e B revelam por onde a luz passou, o padrão de partículas aparece. Quando C e D entram em ação, temos o padrão de ondas.

É simplesmente fabuloso (e desconcertante) imaginar que os fótons gêmeos se comunicam retroativamente, como se aqueles nos detectores A e B dissessem, do futuro, algo como “ei, o observador sabe de onde viemos, ajam como partículas!”, ou, na segunda etapa do experimento, “ok, o observador perdeu a informação e não sabe mais de qual fenda viemos, podem agir como ondas”.

Ficam então duas perguntas, ainda não respondidas pela ciência: por que a detecção dos fótons emaranhados interfere na escolha de seus gêmeos no anteparo? E como essa escolha acontece antes da detecção ocorrer? A única coisa que podemos dizer com isso é que a física quântica sempre vai nos surpreender e nos maravilhar.