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Conheça o peixe ancestral "rebelde" que ficou na água ao invés de subir à terra

Por| Editado por Luciana Zaramela | 21 de Julho de 2022 às 16h39

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Alex Boersma/CC BY-ND
Alex Boersma/CC BY-ND

Cientistas da Universidade de Chicago descobriram o fóssil de um tetrápode, classe ancestral de toda a vida terrestre, que voltou para a vida marinha ao invés de se aventurar para a terra, como seus parentes. Os tetrápodes se aventuraram a sair da água há cerca de 365 milhões de anos, dando origem aos anfíbios, pássaros, répteis e mamíferos — incluindo nós, humanos.

O novo fóssil responde a uma pergunta curiosa e, até agora, meramente especulativa: e se os nossos ancestrais não houvessem escolhido a terra e tivessem virado as costas, voltando a nadar em mar aberto? Diferente de seus parentes, que utilizavam as barbatanas para se impulsionar no solo aquático e, depois, na terra, o tetrápode divergente tinha barbatanas especializadas para a natação.

Um estudo sobre o fóssil (cuja reconstrução óssea você pode ver no vídeo abaixo) foi publicado no periódico científico Nature na última quarta-feira (20).

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Descobrindo a "variante"

A descoberta do espécime aconteceu, na verdade, em 2004, numa expedição para o Ártico canadense. Os ossos fossilizados estavam embutidos na rocha, com fragmentos de mandíbula de 5 cm e padrões de escamas brancas. Isso já indicava se tratar de um tetrápode, mas suas características únicas sequer eram sonhadas. Foi apenas em 2020, com tomografias computadorizadas e raios X, que se notou a natureza extraordinária do peixe ancestral.

Após dificuldades sofridas pela pandemia de covid-19, os cientistas retornaram ao laboratório, podendo então serrar pedaços da rocha e avaliar a barbatana com mais clareza. Notando se tratar de uma espécie nova, era preciso escolher um nome: Qikiqtania wakei. A palavra Qikiqtaaluk, ou Qikiqtani, é o termo da língua Inuktitut para a região onde o fóssil foi encontrado. Já wakei homenageia o cientista já falecido David Wake, que contribuiu muito para a biologia evolucionária.

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Nas escamas do Qikiqtania, é possivel ver indícios claros de que ele vivia submerso: há canais sensoriais para detectar o fluxo da água ao redor do corpo, mandíbulas que indicam atividade predatória e presas para morder e sugar a comida para a boca. Mas o destaque fica mesmo é com a barbatana peitoral do animal, que tem um osso úmero — que nós, humanos trazemos na parte anterior do braço. No Qikiqtania, seu formato é único.

Em tetrápodes primitivos, como o Tiktaalik, o úmero tem uma crista na parte de baixo e uma série de protuberâncias características, onde os músculos se prendem. Esses calombos indicam que os bichos viviam no fundo de lagos e córregos, usando as barbatanas para se impulsionar até o topo, eventualmente atingindo a terra.

No Qikiqtania, os calombos estão ausentes, e o úmero é fino e no formato de um bumerangue. O restante da barbatana é grande, se parecendo com um remo. Isso indica que era feita para nadar, e não rastejar. A Ilha Ellesmere, no Canadá, onde o fóssil foi encontrado, já foi um local quente e repleto de rios e córregos, há centenas de milhões de anos. Hoje, é gelado e inóspito, em sua maioria.

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Importância da descoberta

A descoberta, de acordo com os cientistas, não é importante apenas porque mostra mais uma nova e intrigante espécie, mas também pela demonstração clara de que a evolução não é uma escada linear até chegar nos humanos ou outros animais do topo de suas cadeias alimentares. A evolução é como uma árvore, se ramificando para diversas direções diferentes. É um sistema complexo e repleto de diversificações biológicas.

Além disso, os pesquisadores lembram que o fóssil foi encontrado em terra Inuíte, agradecendo a ajuda e generosidade das comunidades da Baía Resolute e do Fiorde Grise, os Caçadores Iviq e Armadilheiros de Grise Fiord, e o Departamento de Herança e Cultura de Nunavut. Segundo eles, as expedições paleontológicas na terra mudaram, verdadeiramente, a maneira com a qual entendemos a vida na Terra.

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Fonte: Nature, The Conversation