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Museu da Diversidade Sexual abraça tecnologia e inova com guia-robô

Por| 27 de Dezembro de 2019 às 16h38

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Museu da Diversidade Sexual abraça tecnologia e inova com guia-robô
Museu da Diversidade Sexual abraça tecnologia e inova com guia-robô

No fim do primeiro semestre de 2019, o Museu da Diversidade Sexual (equipamento do Governo do Estado de São Paulo administrado pela organização social de cultura APAA) inaugurou a exposição Devassos no Paraíso: o Brasil mostra sua cara, que contou a trajetória da construção das sexualidades e expressões de gênero no Brasil desde o período colonial. A exposição teve como inspiração o livro Devassos no Paraíso, do escritor, jornalista, dramaturgo, tradutor, cineasta e defensor da comunidade LGBTQIA+, João Silvério Trevisan. A obra foi publicada originalmente em 1986, e um grande diferencial dessa exposição foi um guia-robô, com a personalidade do próprio Jão Silvério.

O site do próprio Museu da Diversidade Sexual conta que, no ano de 2019, a Revolta de Stonewall, que deu início às lutas pelos direitos civis da população LGBTI nos Estados Unidos, está completando 50 anos, e foi a partir deste marco que o museu em questão lançou luz à história da comunidade no Brasil, desde o olhar de estranhamento do colonizador português aos costumes dos nativos no século XVI até fatos mais recentes, como a eleição de parlamentares declaradamente LGBTQIA+.

Tendo isso em mente, a proposta da exposição foi um mergulho na obra e pesquisa de João Silvério Trevisan, contando com suportes visuais, como documentos, matérias de imprensa, depoimentos em vídeo e ilustrações de Laerte e Paulo Von Poser. Tal como a obra que lhe inspirou, a exposição percorreu o caminho da construção da sexualidade e das expressões de gênero no Brasil, passando pelos povos originários, pelos colonizadores, pelos povos escravizados e pelos imigrantes, por figuras icônicas como Carmen Miranda, Madame Satã e Daniela Mercury, pelas travestis brasileiras fazendo a vida em solo europeu e pela perseguição e violência sofridas pelas travestis em solo brasileiro, o tratamento das sexualidades desviantes como caso de saúde mental, o fundamentalismo religioso e o ativismo.

De acordo com Ivan Romero, um dos idealizadores do projeto, sendo o Brasil um país ainda extremamente homofóbico e transfóbico, a existência de um museu que debata a temática da sexualidade e promova a arte e a cultura LGBTQIA+ é um marco no sentido de conscientizar a população e contribuir para a luta por reconhecimento e validação das vivências da comunidade, e os marcos da operação desse museu, que envolvem projetos para além da sede na capital, visam o enraizamento da possibilidade de uma sociedade mais informada, igualitária e tolerante.

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Exposição inova com guia-robô

A tecnologia foi desenvolvida pelo laboratório de inovação Certsys Labs, com base em uma persona real e ainda viva, sob a premissa de guiar o público durante a exposição, interagindo com os visitantes sobre a história do ativismo LGBTQIA+ no país, além de trazer curiosidades sobre a vida de Trevisan, inspiradas em seu livro que dá nome à mostra. É válido observar, também, que esse guia-robô também apresenta uma interface de voz, o que possibilita a acessibilidade do conteúdo para deficientes visuais. O projeto contou com a colaboração do Escritório Piloto da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - USP, que ficou responsável por testar os fluxos de conversa do chatbot.

A equipe conta que todo o trabalho para desenhar os fluxos de conversa foi realizado em conjunto com o próprio historiador e por responsáveis pelo conteúdo da exposição. Para acionar o chatbot, os visitantes só precisavam usar um QR Code disponível ao longo dos módulos da mostra, o que trouxe informações complementares aos documentos, imagens, ilustrações e depoimentos em vídeo.

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Frente a isso, Ivan conta ao Canaltech que a ideia quando do desenvolvimento do robô era que fosse uma ferramenta adicional às usadas na exposição, uma com a qual os visitantes pudessem interagir e experienciar a temática de forma diferenciada. "Assim, o bot foi desenvolvido de forma a trazer novas informações e promover um meio não só textual ou gráfico, mas também conversacional".

Ivan afirma que a equipe que desenvolveu o chatbot era composta por desenvolvedores e designers e, para que esse robô conseguisse de fato representar a persona do João Silvério e tivesse um caráter informativo e educaional, essa equipe precisou conhecer bem a história e a realidade da comunidade LGBTQIA+. Esse processo envolveu entrevistas, leituras e trocas de informações com a equipe do Museu e com o João Silvério. Como na equipe havia membros da comunidade LGBTQIA+, esse processo foi particularmente relevante num sentido pessoal e foi possível aproveitar de experiências pessoais no sentido de trazer humanidade ao chatbot.

O desenvolvedor do projeto ressalta, ainda, que o processo de ideação passou por entrevistas com o próprio João Silvério, além de pesquisas históricas e sociológicas e sessões de mapeamento de fluxo, sempre com o foco na experiência do usuário. Segundo ele, uma vez concluído esse processo, passaram ao desenvolvimento do software e dos atributos gráficos e ao final, realizaram alguns testes e concluíram a implementação com a disponibilização de QR Codes ao longo da exposição, sendo que esse processo todo levou cerca de um mês.

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“É incrível imaginar que uma exposição baseada em um livro pode ter seu autor como um guia fixo, só que não pessoalmente. A criação deste chatbot parte da imersão no estudo aprofundado da obra do João Silvério, que possibilitou desenvolvermos uma ferramenta interativa extremamente didática para o público que visitar o museu, contribuindo para dar ainda mais visibilidade ao espaço e ao movimento LGBTI+”, conta Ruan Rossato, desenvolvedor de inteligência artificial e cientista de dados da Certsys.

Segundo Ivan, os educadores e organizadores do museu reportaram que a experiência do público com o Bot foi muito positiva. Citaram alguns exemplos de visitantes que, após interagirem com o robô, trouxeram perguntas e debates que levaram a momentos educacionais bastante frutíferos. Além disso, alguns usuários expressaram gratidão e sentimentos positivos ao chatbot durante a conversa e se sentiram tocados pela experiência de conversar e aprender pelo bot. Essa abordagem também gerou uma maior participação do público jovem com o conteúdo da exposição.

Tecnologia em favor de projetos LGBTQIA+

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Uma vez questionado sobre como, daqui em diante, é possível usar mais tecnologia em favor de movimentos políticos sociais LGBTQIA+, Ivan aponta que já há importantes exemplos do uso de tecnologias em prol de movimentos sociais, como o caso da Beta, um bot feminista que tem conseguido promover ações de pressão política somente usando o Facebook Messenger.

"Conforme as populações marginalizadas e minorizadas conseguem entrar em espaços de aprendizado, pesquisa e desenvolvimentos de novas tecnologias, outros olhares sobre como essas tecnologias devem ser usadas são trazidos à mesa. Dessa forma, é possível esperar grandes avanços no campo da aplicação militante à tecnologia", vislumbra Ivan, que aproveita para concluir que as possibilidades são inúmeras.

Por fim, em relação a futuros projetos, Ivan revela que ainda não há nada formalizado, mas ao início do trabalho com o museu buscam entender o real desafio em persistir a história da comunidade e usar a tecnologia para criar registros criativos. "Uma das possibilidades era um jogo em realidade aumentada envolvendo os territórios de eventos marcantes da história LGBTQIA+ com imagem e som trazendo de volta toda a história e luta da comunidade", declara.