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Quem é Luke Cage e por que sua série é tão importante para o momento atual?

Por| 12 de Setembro de 2016 às 19h15

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Quem é Luke Cage e por que sua série é tão importante para o momento atual?
Quem é Luke Cage e por que sua série é tão importante para o momento atual?

Luke Cage está quase chegando à Netflix. Porém, mesmo já tendo aparecido com destaque na primeira temporada de Jessica Jones, muita gente segue ainda sem entender quem é o personagem e por que diabos ele merece protagonizar uma série. Ao contrário do Justiceiro, que realmente roubou a cena na segunda temporada de Demolidor, Cage foi bastante discreto em sua participação e, ainda assim, vai estrelar seu próprio seriado.

É claro que os contextos são outros. Tanto que essa série do Luke Cage foi anunciada juntamente com todas as demais que foram lançadas ou ainda estão a caminho da Netflix. Pelo menos nesse universo de streaming, ele será um dos membros-fundadores dos Defensores, algo que não acontece nos quadrinhos. Porém, mesmo com essa origem um pouco diferente, uma coisa se mantém bastante fiel às HQs: a relevância do personagem como representante de um contexto social bastante conturbado — e essa temática segue tão em alta quanto na época de sua criação, na década de 1970.

Heróis das ruas

Para entender um pouco de quem é o Luke Cage e a sua importância dentro do universo Marvel é preciso, antes, voltar para a sua criação e o contexto no qual ela está inserida. O herói surgiu em 1972 em uma revista própria, batizada de Luke Cage, Hero for Hire — literalmente Luke Cage, Herói de Aluguel. E, embora tenha sido uma das primeiras publicações protagonizadas por um herói negro, ele não foi o primeiro personagem focado nessa questão racial. Antes dele, a própria Casa das Ideias já tinha apresentado o Pantera Negra e o Falcão, ambos coadjuvantes das histórias do Quarteto Fantástico e do Capitão América, respectivamente.

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O primeiro visual do Luke Cage é um amontoado de estereótipos dos anos 1970, mas ainda icônico

A estreia desses heróis era bastante simbólica, pois representa um momento conturbado nos Estados Unidos. O início dos anos 1970 marca exatamente os primeiros anos das grandes conquistas dos negros no país, os quais haviam garantido direitos civis e direito a voto depois de muita luta pelo fim da segregação racial. O próprio Pantera Negra da Marvel é uma alusão ao grupo que lutava exatamente por essas conquistas sociais. Por isso, tanto quanto hoje, representatividade era algo que estava muito em alta na época.

Dentro dessa realidade, surge o Luke Cage que a gente conhece. Só que, ao contrário dos demais heróis negros citados, ele não usava um uniforme colorido e nem lutava contra grandes vilões. O grande destaque o personagem quando foi criado era a sua abordagem muito mais urbana. Ao invés de encarar grandes ameaças, a sua preocupação era com criminosos no bairro. E, mais do que isso, ele era um herói de aluguel, ou seja, alguém que só atuava mediante pagamento — ainda que, na prática, ele sempre abrisse mão de seu cachê.

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Isso ajudou muito a construir a popularidade do personagem entre a própria comunidade negra. Mesmo abusando de vários estereótipos, muito por conta da inspiração no gênero de filmes blaxploitation, ele ainda era “gente como a gente”, ou seja, um herói com o qual seu público conseguia se reconhecer com muita facilidade. Seja da adolescência envolvida com as gangues do Harlem e a redenção em busca de uma vida digna à prisão injusta.

E foi exatamente na cadeia que ele acabou ganhando seus poderes após participar de um experimento envolvendo uma variante do soro do super-soldado usado no Capitão América. O curioso é que essa origem remete a outra crítica política e social dos Estados Unidos da época, se referindo diretamente aos experimentos de sífilis realizados com presidiários em Tuskegee, os quais tiveram tratamento negado apenas para que médicos estudassem o efeito da doença quando não controlada. Nas HQs, ao invés de deformar o corpo do herói, o soro em questão lhe garantiu invulnerabilidade, fornecendo-lhe um corpo à prova de balas.

Essa origem mostra bem o quanto Luke Cage nasce desse caldeirão em ebulição. Mesmo com sua visão estereotipada — seu uniforme original parece um cafetão dos anos 1970 —, sua história carrega toda a tensão política e social da época, sendo quase um reflexo disso na cidade. Os problemas que ele enfrenta são um exemplo disso, expondo os revezes reais que as comunidades negras viviam no dia a dia.

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E isso é algo que a série da Netflix quer resgatar. Assim como nas HQs, o seriado também vai se passar no bairro do Harlem e manter essa pegada urbana, com problemas do cotidiano para serem resolvidos. É claro que há muita fantasia em torno de tudo, mas a raiz continua a mesma.

A tiara e as pulseiras serão referenciadas na nova série, mesmo que rapidamente

A sua origem também bebe muito da obra original. Ainda não sabemos os detalhes de como o personagem vai ganhar sua invulnerabilidade, mas a sua participação em Jessica Jones já nos revelou algo relacionado a experimentos e vimos algumas rápidas cenas sobre isso em alguns dos trailers — com direito a uma rápida referência ao uniforme clássico.

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O Poderoso e seus amigos

Embora hoje o personagem responda apenas pelo nome de Luke Cage, isso nem sempre foi assim. Nos quadrinhos, era óbvio que ele precisava de um alterego para atuar no combate ao crime (ainda que todo mundo conhecesse sua identidade). Foi quando ele passou a atuar sob o nome de Poderoso, ou Powerman, no original.

Durante todo esse tempo, ele se aliou ao Punho de Ferro — o qual também vai ganhar uma série na Netflix — para dar continuidade ao Heróis de Aluguel e ficou assim por um bom tempo, sempre se aliando com outros heróis para histórias aqui e ali.

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Luke Cage e Punho de Ferro sempre tiveram uma amizade bem forte nos quadrinhos. Será assim nas séries?

E, depois de passar um bom tempo no ostracismo, o personagem retornou já sem o visual caricato, mas com uma pegada ainda mais urbana. No início dos anos 2000, o autor Brian Michael Bendis repaginou o personagem e deixou de lado aquele uniforme de cafetão para deixá-lo com roupas civis, fortemente inspiradas no movimento hip-hop, sobretudo por conta dos acessórios.

Essa influência estará mais uma vez na série. Além de não exagerar nas roupas, mantendo-as dentro de um “normal”, a Netflix já revelou que a ideia é fazer com que o seriado faça um grande apanhado da história do gênero musical, com cada episódio trazendo o título de uma música do estilo, além de diversas outras referências relacionadas a esse universo e seus reflexos sociais.

Ainda nesse período, Luke Cage engatou um relacionamento com Jessica Jones e passou a atuar em outros grupos dentro da Marvel, sendo inclusive um dos membros dos Vingadores. Porém, mesmo lutando ao lado do Capitão América, Homem de Ferro e Homem-Aranha, ele nunca deixou de lado essa raiz urbana e seguiu sempre ao lado de personagens como Demolidor, Punho de Ferro e outros menos conhecidos ainda, como a Misty Knight.

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Já em relação à sua galeria de vilões, o herói nunca teve ninguém muito marcante, até porque a temática de suas histórias envolvia muito mais questões do cotidiano em bairros marginalizados, como gangues e drogas, do que grandes ameaças propriamente ditas. Isso não quer dizer, porém, que elas não existam.

Na série da Netflix, por exemplo, o grande antagonista será o chamado Cottonmouth, um personagem que, nos quadrinhos, sempre foi retratado como um chefão do crime organizado e do tráfico de drogas. Nessas histórias, inclusive, o vilão acaba tendo uma parcela de responsabilidade na prisão de Cage. Além disso, seu conflito com o personagem começa após ele tentar tornar Cage um de seus lacaios, sem sucesso.

Aliás, uma rápida informação curiosa: o Cage do nome de Nicholas Cage não é herança de família — que, na verdade, é Copolla. O ator escolheu o nome artístico inspirado exatamente no Luke Cage dos quadrinhos.

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Luke Cage hoje

Só que todo esse contexto relacionado a questão sociais não é algo que ficou lá atrás. Mesmo depois de mais de 40 anos de sua criação, o contexto no qual veremos a estreia de Luke Cage é tão delicado quanto quando o personagem foi criado, o que faz com que o timing da Netflix seja perfeito.

De maneira semelhante ao que aconteceu na década de 1970, os Estados Unidos estão vivendo um novo levante negro em várias de suas principais cidades, sobretudo por conta da discriminação social e da violência de forças policiais contra essa comunidade. Ao longo dos últimos anos, vimos vários casos de jovens negros que foram mortos e de manifestações em protesto a esse excesso de força. O movimento Black Lives Matter ganhou muita força — atraindo até mesmo celebridades, como a cantora Beyoncé — e até tivemos conflitos que acabaram resultado na morte de pessoas.

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Assim, trazer um herói negro cuja história se situa exatamente nessa área mais fragilizada tem muito a dizer. Durante a última Comic-Con, por exemplo, o produtor executivo da série destacou exatamente isso em sua fala. Segundo Cheo Hodaki Coker, o seriado teve um timing muito bom e que o mundo está pronto para ver um negro que seja à prova de balas.

Pode parecer estranho ver esse tipo de declaração em uma época em que temos tantos jovens negros sendo mortos por ações policiais — e não apenas nos Estados Unidos —, mas vamos combinar que a imagem realmente tem um peso simbólico muito grande. Basta se lembrar do trailer no qual Cage simplesmente avança enquanto é alvejado por tiros para fazer uma leitura crítica disso. É um momento que, independentemente de seu contexto, carrega uma mensagem muito grande. É dizer que, não importa o quanto se atire, aquele ideal vai seguir em frente. E, para um jovem negro que convive com essa realidade — assim como aquela que a série certamente vai mostrar — todos os dias, trata-se de algo muito significativo. Caindo no mais clichê das frases, é lembrar que nem todos os heróis usam capas e muito menos um uniforme colorido.

Luke Cage chega à Netflix no dia 30 de setembro com todos os seus 13 episódios sendo liberados de uma só vez. A série traz Mike Colter reprisando o papel do Poderoso, além de Mahershala Ali como Cottonmouth, Rosario Dawnson como Claire Temple e até mesmo a atriz brasileira Sônia Braga.