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Especial | Como a pandemia afetou a indústria musical [parte 2]

Por| 30 de Setembro de 2020 às 22h00

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Na primeira parte deste especial, falamos sobre como começou a reviravolta na indústria musical mundial quando foi declarada a pandemia do novo coronavírus. Como a indústria sentiu (e vem sentindo) o baque, como os artistas precisaram se reinventar e como essa movimentação mudou os rumos de um setor que era bastante dependente de apresentações físicas, como eventos e shows ao vivo.

Afinal, depois que a internet lançou a tábua da salvação com as lives, a roda não parou de girar — mas como em tudo que exige desafio, nem sempre o chão está coberto por flores. Nesta segunda parte do especial, abordaremos a questão das lives: afinal, como os artistas ganham dinheiro com elas? E o público, responde bem ou cansa rápido?

Vem com a gente entender melhor como a transformação digital pegou os artistas — para nunca mais largar.

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Capítulo 4: como ganhar dinheiro com lives?

É preciso conseguir acesso direto aos fãs. Para tanto, artistas estão usando canais próprios no YouTube ou páginas no Instagram, Facebook e outras redes sociais, como o Twitch. Nada de novo no front, mas com a pandemia, esse modelo se expandiu vertiginosamente — e graças a esse movimento, até mesmo gravadoras estão facilitando a realização das lives ao ceder equipamentos como empréstimo. As plataformas também estão trabalhando com novas formas de monetização, incluindo assinaturas aos canais dos artistas para que fãs possam acessar, no momento das lives e fora delas, conteúdo exclusivo e até mesmo interagir com seus ídolos.

Artistas grandes estão recebendo apoio de pessoal até mesmo de fora da indústria do entretenimento. Shows, eventos grandes, lançamentos de discos e singles… tudo isso passou a envolver uma gama gigantesca de participantes, o que inclui operadoras de telefonia, instituições de pagamentos, marcas de automóveis, marcas de bebidas e uma infinidade de outras empresas que ou ajudam a realizar o evento cedendo seus serviços, ou patrocinam, como se fossem espetáculos físicos.

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Segundo Diogo Machado, do Sulco, para bandas e artistas pequenos, que não conseguem ainda um número de acessos expressivo nas lives, a arrecadação não chega a ser grande, mas é extremamente importante. "No nosso caso conseguimos um valor próximo ao de um show, o que foi incrível, mesmo não sendo o nosso objetivo (tocar pra arrecadar), mas sim o contato com o público, sentir a reação e poder levar nossa música".

Para isso, os músicos apostam nos QR codes e cada espectador pode contribuir como quiser. Ao apontar o celular para a câmera, ele é redirecionado a uma plataforma de pagamentos ou financiamento e pode "comprar ingressos" com valores pré-estabelecidos ou até mesmo fazer doações. Existem aplicativos como o LiveMe, a Twitch e o próprio YouTube que ajudam as pessoas a se apresentarem e a monetizarem em cima de suas transmissões ao vivo. Cada plataforma tem suas regras e termos de uso. Além disso, há plataformas como o PicPay que facilitam a transação financeira. Já o Patreon serve para arrecadar fundos para uma live ou um material que você queira gravar, por exemplo. Para financiamento coletivo, temos a plataforma brasileira Apoia-se.

O modelo de negócio das lives, segundo o Fórum Econômico Mundial, já passa de 50% do montante de arrecadação que move as engrenagens dessa indústria. As verbas chegam, principalmente, da venda de ingressos, patrocínios e doações para essas apresentações ao vivo pela internet.

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Já a música gravada ficou em segundo lugar, mas ainda assim soma uma quantia importantíssima para manter vivo o setor na economia. Ou seja: houve também aquecimento no mercado de streaming de músicas e vídeos musicais, bem como nos downloads de mídia digital e até mesmo de vendas físicas de LPs, pôsteres, camisetas, discos e todo produto relacionado a uma banda ou artista, ou até mesmo aparelhagens dedicadas a ouvir o produto dessa galera.

"Um item importante que aqueceu muito no caso da Audio-Technica foi nossa linha de icônicos toca-discos, com suas famosas agulhas e cápsulas que fizeram e fazem história e que tiveram e estão tendo uma busca elevada pelo ouvinte que agora passa mais tempo na sua casa e quer curtir seus discos de vinil com a qualidade que merece. Não deixa de ser uma válvula de escape nestes tempos de pandemia e quarentenas prolongadas.", pontua Alexandro Azevedo, Head de Business Development da Audio-Technica para o Brasil.

As estratégias de monetização variam e são adaptáveis, e pavimentaram novos caminhos para que profissionais do ramo descobrissem novas formas de fazer dinheiro. Por exemplo: a indústria de jogos requer música para fazer a trilha sonora dos games. A da televisão e dos filmes, idem. Do outro lado da balança, essas novas oportunidades de crescimento para músicos que trabalham de maneira remota nunca estiveram tão em alta como agora, na pandemia.

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Diferentes setores estão cruzando seus interesses para levar música às pessoas, em suas casas, de forma 100% digital. Um exemplo disso foi um show de rap ao vivo oferecido pelo game Fortnite, que conseguiu um público de quase 30 milhões de espectadores simultâneos e marcou a história, em uma aula de criatividade e inovação.

Se você é músico e quer divulgar o seu trabalho, mas ainda não sabe muito bem como fazer uma live bacana, Diogo deixa uma palavra de incentivo: "Comece do tamanho que você consegue, fazer um pouco é bem melhor que não fazer nada. Não se prenda totalmente aos conceitos e à necessidade de um bom equipamento, muitas das vezes seu público quer ouvir a sua mensagem e a sua voz. Existe menos concorrência onde é mais difícil chegar. Muitos ficarão no caminho por medo ou preguiça. Não seja essa pessoa."

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Capítulo 5: a reação do público

Durante esse "novo normal", se até fazer consulta médica passou a ser pela internet, consumir música, então, foi uma transição até mesmo natural (dentro de todas as limitações possíveis da palavra, dado o contexto pandêmico). Fazer um show no formato de live é complicado? O público reage bem? Sobre isso, Diogo tem uma opinião bem sólida e realista, mas... positiva:

"A execução de uma live depende do formato, se é com banda completa, acústica, voz e violão, etc. Na maioria das vezes, uma live com banda completa é bem complexa, pois envolve praticamente toda estrutura de um show presencial, com a adição de equipes de filmagem e transmissão, o que gera uma movimentação de pessoas e um custo ainda maior. As vantagens são de estarmos próximos ao público, levarmos a ele um momento de leveza e descontração.

As nossas experiências foram muito satisfatórias, pois nosso público tinha a expectativa de assistir ao show, de estar participando do nosso movimento e conseguimos um pequeno aporte de patrocinadores, que viabilizou o evento."

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Se da parte do músico (ou banda), é preciso suar para conseguir atingir esse objetivo, o público que consome música e é exigente com qualidade também está investindo em equipamentos para trazer os artistas para dentro de casa. Todo esse movimento fez com que outras indústrias fossem impactadas, a começar pelas operadoras: com o consumo desenfreado de banda de internet, agora que o pessoal está mais dentro de casa, muita gente viu chegar o momento de investir em um plano mais poderoso. As operadoras também investiram em novos pacotes e ofertas, além de estratégias para suportar o volume do tráfego de bytes durante a epidemia aqui no Brasil. E isso, aliado ao conforto, à qualidade sonora, gerou uma nova forma de se consumir música que, segundo muitos especialistas e profissionais do ramo, virou um modelo de negócio que não vai deixar de existir nem mesmo com o fim da pandemia.

"O ouvinte quer ter mais qualidade, pois as horas que passa utilizando o computador e/ou celular aumentaram e muito, então a busca pela melhor qualidade de áudio aliada ao conforto disparou. Os ouvintes dispararam na compra de produtos adequados a sua necessidade.", relata Alexandro."

Capítulo 6: ascensão e queda das lives — qual a lição para o futuro?

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Com novos modelos de negócio surgindo e dando certo enquanto as pessoas precisam se manter socialmente isoladas até que apareça uma vacina contra o coronavírus, a indústria já se movimenta em direção a novos modelos de negócio que possam vir como aprendizado. Distribuir e transmitir música digitalmente deu certo, mas como nem tudo é perfeito, muitos artistas esbarram na questão de direitos autorais e problemas técnicos. O streaming é altamente eficaz para chegar ao consumidor, mas donos de conteúdo ficam dependentes de plataformas de terceiros. O relacionamento entre artistas e plataformas pode vir a mudar no futuro: em geral, elas pagam os autores por uma proporção mínima sobre assinaturas (a exemplo do Spotify, cerca de 65% é revertido ao artista, com uma "comissão" determinada pelo número de vezes que uma faixa é ouvida. E no meio disso tudo, existe aquele velho fator já conhecido do ser humano: o "enjoar rápido", quando a novidade deixa de ser, propriamente, uma novidade.

Como tudo o que sobe, desce, o novo formato de lives e collabs também parece já ter chegado a seu pico, conforme observa Diogo, apontando para novos rumos: e a indústria precisa se reinventar novamente. "Este formato atual já está caindo em audiência, pois deixou de ser novidade. Consequentemente, isso tem diminuindo o interesse por parte dos patrocinadores das lives", analisa. Para ele, a tendência é que este formato não se sustente sozinho. No entanto, com criatividade e objetivos diferentes, as lives podem se reinventar como um produto exclusivo que o artista possa fornecer para quem queria pagar por uma experiência exclusiva — ou gratuita — para um lançamento, por exemplo.

Uma nova tendência que está surgindo é a hibridização do modelo de negócio. As lives já não possuem mais o teor de novidade que tiveram no início, e o público tem perdido seu interesse pelos eventos, que, apesar de ainda existirem em diversas plataformas e todos os dias, contam mais com auxílio de patrocinadores que com vendas ingressos e doações. Aliás, nem mesmo os patrocinadores já se empolgam mais como antes. Diante disso, começam a despontar, inclusive aqui no Brasil, os eventos híbridos, que aliam offline e online (como as partidas de futebol com 30% de torcida nos estádios, por exemplo).

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Tudo está acontecendo muito rápido, e os eventos híbridos, tais como as lives, também não são exatamente uma novidade. Assim como já acontecia com webinários, que eram transmitidos ao vivo enquanto apresentados com público presente, muito comuns no mundo corporativo, e as partidas de e-sports, os shows em palcos físicos transmitidos pela internet já começaram. Foi assim com o drive-in, está sendo assim com aluguel de estúdios para apresentações e, agora, com montagens de palcos profissionais — com direito a iluminação e sonorização profissional — que contam com número limitado de pessoas na plateia, dentro ou fora de seus carros, mas são, também, transmitidos pela internet. O legal desse novo modelo de negócio é que dá para captar e interpretar o sentimento de quem está ali, transmitindo a vibração em tempo real para quem está em casa.

Um exemplo disso é a 6ª edição do tradicional Festival BB Seguros de Blues e Jazz, que será apresentado por drive-in e na internet, de 26 de setembro a 14 de novembro. O evento é gratuito, com programação para todas as idades, e acontece em várias cidades brasileiras, passando por Curitiba, Belo Horizonte, São Paulo, Brasília, Porto Alegre e Recife, reunindo nomes nacionais e internacionais da música tanto em shows gravados, exibidos nos drive-ins, quanto ao vivo, nas redes sociais.

Mais eventos que misturam digital com físico estão tomando conta das redes sociais — com o público "na pista", mas sem aglomerações. Duda & Nando Reis se apresentaram nesse formato no último fim de semana, porém com telas de televisão formando uma plateia virtual. Veja como foi:

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E assim, nessa velocidade louca, músicos, técnicos e equipes vêm se renovando, dia após dia.

[Continua na parte 3]

Fonte: Com informações de: NBC, WEForum