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A assinatura eletrônica e digital nos contratos tem validade jurídica?

Por| 18 de Agosto de 2021 às 10h00

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Divulgação / Docusign
Divulgação / Docusign

Inicialmente, é válido ressaltar que a legislação vigente não exige formalidade instrumental como condição à validade de um contrato. Por outro lado, estabelece que para um negócio jurídico ter validade, é necessário a observância de alguns requisitos, quais sejam: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e, forma prescrita ou não defesa em lei.

Com a transformação digital e o surgimento reiterado do comércio eletrônico, surge a necessidade de uma norma que dê garantia e confiabilidade às relações jurídicas pactuadas no meio virtual, possibilitando segurança na relação entre empresas, fornecedores e clientes.

No Brasil, a assinatura eletrônica e digital é regulamentada pela Medida Provisória n° 2.200-2/2001, de 24 de agosto de 2001, que dá garantia jurídica aos documentos eletrônicos, atualmente válida, pois não incide na regra da Emenda Constitucional n° 32/2001, publicada em 11 de setembro de 2019.

Isso porque, de acordo com a Emenda Constitucional mencionada, as medidas provisórias perdem a eficácia se não forem convertidas em lei, no prazo de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período, por parte do Congresso Nacional, no entanto, aquelas editadas em data anterior à publicação desta emenda continuam em vigor até medida ulterior que a revogue.

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É o que ocorre com a Medida Provisória que regulamenta a matéria, ela continua produzindo efeitos, tendo em vista que foi publicada antes da vigência da Emenda Constitucional, portanto, atualmente vigente seu texto que dispõe sobre a possibilidade das assinaturas, vejamos:

Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória.

§ 1o As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - Código Civil.

§ 2o O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

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Ademais, Maurício de Souza Matte, defende como sendo 03 (três) requisitos para que a assinatura eletrônica tenha a mesma força probatória que a assinatura manuscrita, vejamos:

Para que uma assinatura eletrônica tenha a mesma força que a assinatura autográfica, é necessário que, de igual forma, sejam garantidos três requisitos:

  1. Identidade: que é a possibilidade de identificar naquela representação volitiva a autoria, ligando-a a alguém (ou computador), com garantias de certeza;
  2. Integridade: é quando temos certeza que o documento, durante o percurso entre o remetente ou destinatário, não foi adulterado, danificado, etc., ou que, acontecendo, seja possível identificar (assim como nos de papel – vestígios);e
  3. Perenidade: que se refere à durabilidade da validade ao longo do tempo.
    MATTE, Maurício de Souza. Internet. São Paulo: Ltr, 2001. P.71.

Logo, é válido dizer que as assinaturas eletrônicas, utilizadas geralmente nos contratos privados, são válidas, desde que admitidas pelas partes que irão assinar - e, para efeitos práticos, é importante que seja constado no contrato - aceita pelo órgão ou pessoa que o documento será oposto e que garanta a autoria de quem assinou o documento.

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Essa assinatura eletrônica é feita geralmente por meio de um terceiro desinteressado, ou seja, uma empresa que fornece serviços de assinatura, que através de um login e senha pessoal, faz a coleta da assinatura de forma digital, às vezes com dedo ou caneta touch, sendo adicionados outros dados, tais como, geolocalização, IP da máquina, foto, QR Code, visando comprovar que aquela pessoa que está assinando é realmente quem diz ser, para alcançar uma efetiva eficácia comprobatória do contrato.

Vale ressaltar que assinatura digital é uma espécie de assinatura eletrônica, e ajudam na geração de segurança às relações contratuais celebradas no meio virtual e através delas obter a certeza da identidade das pessoas que estão contratando, conforme elucidado.

A assinatura digital difere da assinatura eletrônica, mormente porque é decodificada por uma chave pública (certificado digital), associada aquele assinante, e garantida por uma autoridade de certificação no padrão da infraestrutura de chaves públicas (ICP-Brasil), amplamente adotada em sede de processo eletrônico (Lei 11.419/2006).

Isto é, quando um documento é submetido a uma assinatura digital, a entidade certificadora gera um arquivo eletrônico com os dados do titular da assinatura e o vincula a uma chave, para que seja atestada a sua identidade.

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Portanto, conclui-se que a legislação trouxe benefícios, quanto a possibilidade de assinar documentos eletrônicos com validade jurídica, conferindo à assinatura digital o mesmo valor de uma assinatura manuscrita, desde que observados os requisitos do negócio jurídico.

Quando esses contratos não são cumpridos surgem a necessidade de demandar judicialmente, para que se faça valer o que foi pactuado entre as partes, através do juízo competente.

Ocorre que, alguns Tribunais de Justiça, de primeira e segunda instância, vêm entendendo que por se tratar de um contrato celebrado entre as partes através da internet, com tecnologia de certificação digital, onde há presunção de validade e veracidade, embora válido, quando não há assinatura de 02 (duas) testemunhas, não produz a eficácia de um título executivo extrajudicial, pois não preenche os requisitos para tanto.

Essas decisões são fundamentadas na literalidade da legislação, que requer a necessidade de duas testemunhas instrumentárias para que seja enquadrada no rol de títulos executivos extrajudiciais, por outro lado, não é observado a função dessas assinaturas no contrato, que é de gozá-lo de presunção de veracidade, e por outro lado, as plataformas possuem mecanismos para tanto.

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No entanto, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que a forma de celebração de contratos vem mudando, deixando de ser apenas por meio de papel e passando a se concretizar por meio eletrônico. E tratando-se de um documento submetido a assinatura através de um terceiro desinteressado, a depender do caso, cumpre a função das testemunhas.

Diante disso, vem defendendo a possibilidade do contrato ser enquadrado como um título executivo extrajudicial, dessa forma, dando força executiva ao documento, vejamos decisão recente sobre o tema:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. EXECUTIVIDADE DE CONTRATO ELETRÔNICO DE MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE (CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA. TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. POSSIBILIDADE, EM FACE DAS PECULIARIDADES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE SER EXCEPCIONADO O DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73 (ART. 784, INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS DE OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS, RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO ELETRÔNICO. PRECEDENTES.

  1. Controvérsia acerca da condição de título executivo extrajudicial de contrato eletrônico de mútuo celebrado sem a assinatura de duas testemunhas.

  2. O rol de títulos executivos extrajudiciais, previsto na legislação federal em "numerus clausus", deve ser interpretado restritivamente, em conformidade com a orientação tranquila da jurisprudência desta Corte Superior.

  3. Possibilidade, no entanto, de excepcional reconhecimento da executividade de determinados títulos (contratos eletrônicos) quando atendidos especiais requisitos, em face da nova realidade comercial com o intenso intercâmbio de bens e serviços em sede virtual.

  4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil, inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade negocial vigente e, especialmente, à revolução tecnológica que tem sido vivida no que toca aos modernos meios de celebração de negócios, que deixaram de se servir unicamente do papel, passando a se consubstanciar em meio eletrônico.

  5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados.

  6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos.

  7. Caso concreto em que o executado sequer fora citado para responder a execução, oportunidade em que poderá suscitar a defesa que entenda pertinente, inclusive acerca da regularidade formal do documento eletrônico, seja em exceção de pré-executividade, seja em sede de embargos à execução.

  8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
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(STJ - REsp: 1495920 DF 2014/0295300-9, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 15/05/2018, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/06/2018)

É válido ressaltar que apesar de não haver formalmente grau de hierarquia no Poder Judiciário, as decisões tomadas em primeira e segunda instância, podem ser revistas, através de recurso interposto para os Tribunais Superiores, nesses casos, o Superior Tribunal de Justiça - STJ.

Assim, observa-se que apesar de ter uma legislação vigente dando validade jurídica a essas assinaturas, e apesar do judiciário reconhecer o documento como válido, não é um entendimento pacificado nas instâncias quanto à caracterização de título executivo extrajudicial.

E, por existir duas formas de assinatura, quais sejam, eletrônica e digital, que apesar de serem as duas realizadas por meio eletrônico, possuem formas de comprovação de autoria diversas, por isso é necessário que seja analisado com cautela cada caso, para que não corra o risco do documento não ser reconhecido como válido.