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Computador voador: conheça o Gripen, novo caça comprado pelo Brasil

Por| 23 de Dezembro de 2013 às 15h21

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Computador voador: conheça o Gripen, novo caça comprado pelo Brasil
Computador voador: conheça o Gripen, novo caça comprado pelo Brasil

N.E.: Além de redator do Canaltech, Muni Perez é ex-piloto da Força Aérea Brasileira (FAB) e sabe muito bem do que está falando!

Na quarta-feira (18), o governo anunciou o avião de caça vencedor da concorrência internacional para selecionar uma nova aeronave de combate para nossa Força Aérea. Para a surpresa de alguns, o vencedor foi o sueco Saab JAS 39 Gripen, ou somente Gripen.

Como a notícia está dando o que falar pela Internet, o Canaltech resolveu destrinchar a tecnologia dessa aeronave, que é a espinha dorsal da Força Aérea da Suécia e, apesar do seu pequeno tamanho e simplicidade, é uma arma altamente tecnológica, versátil e letal.

Primeiro falaremos um pouco da história da aeronave, bem como o motivo dela ter sido desenvolvida.

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1 - O programa Gripen

A Suécia, no contexto da guerra fria, sempre temeu uma invasão pela União Soviética, e por isso sempre desenvolveu domesticamente suas armas (aviões, tanques, submarinos e navios). Antes do Gripen, ela possuía duas aeronaves principais, o Saab 35 Drakken e o Saab 37 Viggen (aviões com aparência bem estranha, diga-se de passagem), que já estavam ficando velhos.

Drakken

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Viggen

Então o governo sueco começou a procurar um substituto para os dois modelos, e que pudesse ser um caça “multifuncional”, o que significa que ele deveria ser capaz de realizar diversos tipos de missão em um único voo: ataque ao solo, ataque ar-ar (outros aviões), ataque marítimo e reconhecimento.

Além de ser de emprego múltiplo, o novo caça deveria ser pequeno e capaz de operar em condições adversas. Bases de caças normalmente são enormes, com pistas extensas e uma grande infra-estrutura de apoio. Mas, no caso de uma vizinha gigante como a União Soviética, nenhuma base sobreviveria à fúria vermelha, então o avião deveria ser capaz de se virar a partir de rodovias, pistas improvisadas e com estrutura ínfima de apoio.

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Desse requerimento surgiu o Saab 39 Gripen, que tem apenas 14 metros de comprimento e que pode operar de pistas pequenas (trechos de rodovia) de apenas 800 metros, mesmo que cobertas de neve, e precisa de apenas 10 minutos e 6 pessoas para fazerem o reabastecimento, rearmar o avião e deixá-lo pronto para mais uma missão.

O avião foi desenvolvido pela Saab, mas teve participação de muitas outras empresas suecas, como a Eriksson, Volvo e Scania.

O modelo original é “antigo”, tendo seu primeiro voo em 1988 e sendo introduzido na Força Aérea da Suécia em 1997. Mas esse não é o modelo que o Brasil comprou. O nosso chama-se Gripen NG, de New Generation, que é uma evolução do Gripen original, e que traz diversas melhorias, tanto estruturais quanto tecnológicas.

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2 – Tecnologia de aviônicos e comunicação

O Gripen possui o que há de mais avançado no mundo da tecnologia militar (que por natureza é gerações mais avançada que a tecnologia para uso civil).

Fly-By-Wire

Um avião é controlado com a ajuda de partes móveis nas asas e no profundor (aquelas asas pequenas que ficam na parte de trás do avião), além do leme (a “cauda” onde fica o logo das companhias aéreas). Quando você viajar de avião e sentar perto da janela, tente observar uns pequenos pedaços se mexendo na parte mais externa da asa. Isso que faz o avião inclinar-se para os lados.

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O tradicional é essas partes serem controladas mecanicamente, através de cabos e sistemas hidráulicos. Mas em sistemas Fly-By-Wire, tudo é controlado pelo computador. Quando o piloto dá o comando para a aeronave virar, essa informação passa para um computador, que analisa se o avião conseguirá fazer esse movimento com segurança, sem danificar sua estrutura, pra então passar o comando para as superfícies de controle.

Outra vantagem é que o fly-by-wire elimina a estrutura física, reduzindo o peso e diminuindo as chances de falhas.

HUD, HMDS, telas multifuncionais e HOTAS

A cabine do Gripen foi desenvolvida para proporcionar ao piloto uma consciência situacional, que quer dizer que ele deve saber de tudo o que está acontecendo de uma maneira simples e rápida.

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A aeronave contém diversos sensores e radar, e todas as informações são coletadas e agrupadas em três telas enormes de LCD (as telas multifuncionais), que mostram dados sobre:

  • a aeronave: combustível, sistemas etc;
  • dados do vôo: velocidade, altitude, direção, posicionamento em relação ao horizonte etc;
  • dados da missão e radar: GPS, mapas do terreno, aeronaves inimigas, rotas, alvos

Telas multifuncionais

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Além das telas, possui um HUD – Heads Up Display, que é um sistema que mostra um resumo das informações de voo na parte de cima do cockpit, para que o piloto se concentre em voar a aeronave nas partes mais críticas do voo, sem precisar olhar para baixo para ver os instrumentos.

HUD

Além do HUD, possui um sistema chamado HMDS – Helmet Mounted Display System, que é um mostrador de informações no próprio capacete (Google Glass?). Além dos dados do HUD, ele aponta os alvos no terreno, pode exibir vídeos das câmeras infra-vermelhas, informações do radar, entre outras. Com isso o piloto tem acesso a todos os dados de voo e da missão mesmo quando está olhando para fora da cabine (procurando um inimigo ou alvo por exemplo).

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Outro recurso importante do avião é o HOTAS – Hands on Throtle and Stick, que é um conceito operacional de que o piloto não precisa tirar as mãos do manche (joystick) e nem do acelerador – em aviação chama-se "motor" (throtle), que é uma alavanca e não um pedal. Com isso, o piloto pode realizar quase todas as ações relacionadas a mexer nos computadores de bordo sem precisar tirar as mãos dos comandos.

Radares e sensores

O Gripen atual possui um radar chamado PS-05/A, de pulso doppler e que opera na banda X de frequências. O PS-05/A é capaz de detectar um alvo a 120 km de distância, e pode automaticamente rastrear múltiplos alvos tanto acima quanto abaixo do avião, no mar, na terra e no ar, e pode guiar diversos mísseis ar-ar (para atacar outros aviões) além do alcance visual do piloto simultaneamente.

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Isso é o radar do Gripen atual, ou “velho” Gripen. O do novo, Gripen NG, que será o nosso, virá com um radar ainda mais potente, que utiliza a técnica de escaneamento eletrônico ativo, que aumentará significativamente o alcance de detecção do mesmo e o campo de “visão” do radar.

Computadores e comunicações

Agora vamos ao que interessa. Você talvez não saiba, mas o que faz um avião ser bom hoje em dia é principalmente sua tecnologia, com seus sistemas de computadores e a capacidade de integração entre diversos tipos de armamentos (mísseis, bombas) e o sistema operacional do avião (isso mesmo, sistema operacional).

O código-fonte do Gripen é aberto para os operadores, e isso é excelente pois o principal fator que faz um míssil x ser compatível com aeronave y é o software. Então se o país não possuir o código-fonte da aeronave, só poderá comprar mísseis que já sejam compatíveis com a plataforma.

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É o que acontece, por exemplo, com os Estados Unidos e a tal da transferência de tecnologia (esse é um dos principais itens da transferência). Eles jamais ofereceriam para nós o código-fonte completo do F/A-18 Super Hornet, e caso quiséssemos comprar um míssil da Rússia (que são muito bons), não poderíamos, pois não seriamos capazes de integrar os sistemas do avião ao míssil. E mesmo o míssil que o Brasil fabrica, o Piranha, talvez não funcionasse no F-18. Mas tendo em mãos o código-fonte do Gripen, essa integração será rápida, e ficaremos livres para comprar armamentos de onde for melhor.

Ainda, o código dele é feito na linguagem de programação ADA, e é atualizado constantemente para trazer melhorias à aeronave e adaptá-la a novos tipos de missões. Com isso pode-se programar e mudar rapidamente as características do avião (como se fosse um aplicativo), de maneira que ele opere com maior performance na Amazônia (lugar com muita umidade), no Nordeste (ar quente e seco) ou no Sul (frio). Esses, claro, são exemplos básicos e superficiais das mudanças de configuração, é só para dar uma ideia do que se pode ser feito.

Além disso, ele é feito para trabalhar em rede, conectado. O Gripen está constantemente em comunicação com outras aeronaves, estações e unidades em terra e navios, enviando e recebendo dados dos sensores, radar e imagens através do sistema DataLink, e com isso todas as unidades das Forças Armadas ficam com uma consciência situacional elevadíssima (sabem o que está acontecendo e o que deve ser feito).

Claro que todos esses dados e as comunicações são criptografadas para evitar que sejam interceptadas pelo inimigo.

Além de ser um avião conectado, todos os seus componentes são monitorados por um computador, tornando a manutenção muito rápida e modular. Cada vez que a aeronave apresenta algum problema, o computador sabe exatamente qual a peça defeituosa, e o mecânico precisa apenas trocá-la, e não abrir o avião inteiro e procurar o problema. Isso reduz significativamente os custos de manutenção, e permite que os aviões fiquem disponíveis para voo por mais tempo.

3 – Armamentos

O Gripen é capaz de levar até 6.5 toneladas de armamentos, e inclui uma vasta gama de mísseis e bombas guiadas a laser, além de um canhão convencional.

Para combate aéreo (mísseis ar-ar), ele pode levar até 6 mísseis AIM-9 Sidewinder (americano), ou 4 MBDA MICA (francês) ou 6 IRIS-T (alemão), utilizados para atacar outras aeronaves - e claro, poderá ser programado para utilizar outros mísseis, como o K-77M russo. Para ataques ao solo, pode levar até 4 AGM-65 Maverick (americano) ou o KEPD 350 (sueco/alemão), que fazem um estrago. Para ataques marítimos, pode levar até 2 RBS-15F, que são mísseis anti-navio.

Além desses mísseis, ainda pode levar 4 bombas guiadas a laser modelo GBU-12 Paveway II (americana), ou duas bombas cluster Bk.90 ou ainda 8 bombas Mark 82 que são menores.

Com isso o Brasil tem um avião pequeno mas ágil, que é recheado com as últimas tecnologias e que poderemos absorver toda ela, além de termos acesso ao código-fonte do avião para melhorá-lo de acordo com as nossas necessidades, e por um custo operacional bem mais baixo que os concorrentes.

E o principal: poderá operar com facilidade de locais não preparados, para defender nossa Amazônia de interesses estrangeiros no caso de uma eventual guerra.

Além disso, boa parte dele (se não a totalidade) será montada aqui no Brasil pela Embraer, e a empresa absorverá muita tecnologia de ponta que poderá ser empregada tanto no desenvolvimento de novos aviões militares como de aviões comerciais.