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Novos cortes orçamentários na ciência podem destruir o avanço tech em 2018

Por| 18 de Dezembro de 2017 às 15h37

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Nós publicamos na semana passada sobre os cortes no orçamento de 2018 para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) como resultado da Emenda Constitucional nº 95 de dezembro de 2016, que estabeleceu um teto para os gastos públicos do Brasil nas próximas duas décadas. A matéria pode ser acessada aqui.

Entretanto, o assunto está rendendo pano para a manga, inclusive em mídias internacionais. No final de setembro, o gabinete da Presidência da República recebeu uma carta assinada por 23 ganhadores do Prêmio Nobel em diversas categorias, pedindo que o presidente Michel Temer mudasse de ideia quanto aos cortes orçamentários previstos para as ciências em geral.

Veja, abaixo, o conteúdo da carta e seus signatários, em tradução livre:

"Vossa excelência Presidente Michel Temer,

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Nós, os assinados abaixo ganhadores do prêmio Nobel, estamos escrevendo para expressar nossa forte preocupação sobre a situação da Ciência e Tecnologia no Brasil. O orçamento para pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações sofreu um corte de 44% em 2017, e um novo corte de 15,5% é esperado para 2018. Essa medida vai prejudicar o país por muitos anos, com o desmantelamento de grupos internacionalmente renomados e uma 'fuga de cérebros' que irá afetar os melhores e jovens cientistas.

Enquanto em outros países a crise econômica levou, às vezes, a cortes orçamentários de 5% a 10% para a ciência, um corte de mais de 50% é impossível de ser acomodado, e irá comprometer seriamente o futuro do país.

Nós sabemos que a situação econômica do Brasil está muito complicada, mas pedimos que reconsidere sua decisão antes que seja tarde demais."

Signatários:

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Nobel de Medicina: Harold Varmus (1989); Jules Hoffman (2011); Tim Hunt (2001); Torsten Wiesel (1981).
Nobel de Química: Martin Chalfie (2008); Johann Deisenhofer (1988); Robert Huber (1988); Ada Yonath (2009); Dan Shechtmann (2011); Venkatraman Ramakrishnan (2009); Jean-Marie Lehn (1987); Yuan T. Lee (1986).
Nobel de Física: Albert Fert (2007); David Gross (2004); Serge Haroche (2012); Claude Cohen-Tannoudji (1977); Andre Geim (2010); Robert B. Laughlin (1998); Frederic Duncan M. Haldane (2016); Klaus von Klitzing (1985); Arthur McDonald (2015); Takaaki Kajita (2015); Jerome Friedman (1990).

O apelo dos ganhadores do Nobel juntou forças a diversos movimentos de cientistas brasileiros, que se manifestaram afirmando que, se os cortes de verbas acontecerem como pretende a administração pública, a pesquisa científica no país correrá sérios riscos de ser inviabilizada, impedindo o progresso do saber científico e dos diversos projetos tecnológicos que desenvolvemos.

Helena Nader, biomédica por formação e responsável pela presidência da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) por seis anos, comentou sobre o perigo que os cortes representam para a ciência brasileira: "Estamos dizendo isso ao governo há mais de um ano. Tivemos várias reuniões com o presidente, mandamos várias cartas para os ministros Meirelles (do Ministério da Fazenda) e Dyogo Oliveira (do Ministério do Planejamento). O problema é que, no Brasil, ainda se encara educação e ciência como despesas, e não como investimento como faz o resto do mundo. Isso vai fazer com que todos os institutos de ciência e tecnologia ligados ao MCTIC fechem as portas. Nós não estamos defendendo nenhuma classe ou pedindo aumento de salário. Estamos pedindo que o financiamento seja mantido para termos um Brasil competitivo".

Entretanto, não adianta tentar persuadir a gestão pública a se importar com o progresso científico brasileiro partindo do princípio que os políticos não são capazes de entender o dano que os cortes orçamentários significam à produção do saber tecnológico que estão a destruir. Não é uma questão de mera desinformação e descuido.

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Há quem defenda o ponto de vista de que os desgastes na área da ciência vêm de longa data, iniciando com o constante e persistente sucateamento das universidades públicas que, nas décadas passadas, eram o pilar da maioria das pesquisas realizadas em solo brasileiro. Ao longo do tempo, a população do país foi obrigada a assistir passivamente aos cortes de investimentos e gestões de reitores extremamente ineficientes, como se houvesse de fato intuito de deixar de lado o avanço que a tecnologia proporciona, inclusive, à economia. 

Talvez isso aponte para um posicionamento de desistência por parte da gestão governamental em encarar avanço científico como responsabilidade do Estado. Num contexto mundial, que está voltado para associações entre equipes de pesquisadores sendo financiadas por empresas privadas, talvez o governo brasileiro esteja esperando que nosso avanço científico seja bancado pelo interesse de quem pagar melhor. E, assim como houve intuito em sucatear o serviço público de telefonia para justificar as privatizações, como alguns acreditam estar ocorrendo agora com os Correios, a Petrobrás e alguns serviços de mobilidade urbana, é necessário que a comunidade acadêmico-científica cogite a possibilidade de o sucateamento ser proposital.

O problema é que o desincentivo gera danos também na capacitação de pessoal para integrar as pesquisas, fazendo com que as mentes talentosas que conseguirem boa formação acadêmica sejam forçadas a desenvolver seus trabalhos de pesquisa científica em outras freguesias. É esse terrível fenômeno que a carta dos laureados pelo Nobel ao Predidente Temer se refere quando chama atenção para a "fuga de cérebros". E assim, infelizmente, exportaremos um produto que fará extrema falta ao mercado interno do saber no Brasil: a inteligência.

Fonte: Chemistry World