Governo cobrará explicações dos EUA sobre espionagem no Brasil
Por Fernanda Morales | 08 de Julho de 2013 às 12h04
Nos últimos dez anos, brasileiros e pessoas que transitam pelo país também foram alvos da espionagem eletrônica promovida pelo programa PRISM dos Estados Unidos, como informam os documentos vazados pelo ex-funcionário da Agência Nacional de Segurança norte-americana (NSA) Edward Snowden. Com base nos arquivos obtidos pelo jornal O Globo, o Brasil aparece em destaque entre as redes de telecomunicações mais vigiadas pelo programa.
Com suas extensas redes públicas e privadas, operadas por grandes empresas de telecomunicações, o Brasil aparece em destaque nos mapas da NSA na análise do tráfego de ligações telefônicas e internet, atrás apenas de China, Rússia, Irã e Paquistão. Ainda não se sabe a quantidade de dados e de pessoas que foram monitoradas pela agência norte-americana, mas os documentos indicam que a espionagem se deu em larga escala e constantemente.
A Agência Nacional de Segurança foi criada durante o período da Guerra Fria para monitorar a comunicação de outros países e, principalmente, decifrar códigos usados por outras nações. Logo após os atentados às Torres Gêmeas em Nova York, em 2001, a NSA passou por uma reformulação e tornou-se uma das grandes especialistas no emprego de tecnologias de inteligência em radares e satélites para a coleta de dados em redes de telecomunicações, internet e redes privadas.
Mesmo sendo um dos principais críticos do propósito da NSA enquanto ainda era senador dos Estados Unidos, Barack Obama optou por ampliar o sistema de monitoramento da agência durante seu governo e a NSA passou a operar em conjunto com outras 14 agências secretas. Estima-se que, juntas, as agências tenham gasto no último ano cerca de US$ 75 bilhões (R$ 168,9 bilhões).
Segundo os documentos revelados por Snowden no mês passado, a NSA mantém parcerias com grandes empresas de telecomunicação, internet e tecnologia do mundo com o objetivo de facilitar o monitoramento em larga escala das comunicações mundiais. Segundo o jornal The Guardian, responsável pela revelação do esquema de espionagem, empresas como Facebook, Google, Apple e Microsoft contribuíam com o PRISM garantindo acesso aos seus servidores, algo que foi negado veementemente pelas companhias por meio de comunicados oficiais.
Para ampliar o alcance do programa, a agência desenvolveu outros programas de espionagem com a ajuda de parceiros corporativos. Um dos programas paralelos é o Fairview, construído com a ajuda de uma rede de telecomunicações norte-americana que possui relações com outras teles do mundo inteiro, incluindo do Brasil. Com isso, a NSA consegue obter acesso a redes de comunicações em outros países, que por meio de acordos corporativos concedem acesso às suas redes para a operadora norte-americana.
Os documentos, por sua vez, não deixam claro qual companhia norte-americana está sendo utilizada no esquema de espionagem eletrônica da NSA e nem se as companhias brasileiras têm conhecimento sobre a maneira como suas informações estão sendo utilizadas. A única evidência que os arquivos apresentam é que o órgão utiliza o Faiview para espionar as redes de telecomunicações e internet no Brasil.
Explicações de Washington
Antonio Patriota, ministro das Relações Exteriores, afirmou neste domingo (7) que o governo brasileiro pretende cobrar explicações de Washington sobre o uso do programa PRISM para coletar dados dos brasileiros nos últimos dez anos, como foi revelado pelo O Globo. O ministro informou que o embaixador brasileiro em Washington e o embaixador norte-americano em Brasília já foram acionados sobre o caso.
"O governo brasileiro promoverá no âmbito da União Internacional de Telecomunicações o aperfeiçoamento das regras. O Brasil deverá propor às Nações Unidas a iniciativa de proibir abusos e invasão das informações dos usuários da rede de comunicações para garantir segurança cibernética que proteja os direitos dos cidadãos e preserve a soberania dos países", informou Patriota.
A respeito do conhecimento das operadoras brasileiras sobre o caso, Antonio Patriota afirmou que o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, já foi informado e está cuidando pessoalmente do assunto, e que deve fornecer mais detalhes em breve.
Interesse da NSA pelos dados brasileiros
Glen Greenwald, jornalista do The Guardian responsável pela divulgação dos documentos da NSA fornecidos por Edward Snowden, afirmou em entrevista ao Fantástico, da rede Globo, que o monitoramento das chamadas telefônicas e da internet no Brasil pode ter sido a melhor estratégia encontrada pelas autoridades norte-americanas para espionar outras redes e sistemas de países mais protegidos, como é o caso da China e do Irã.
"Não temos acesso ao sistema da China, mas temos acesso ao sistema do Brasil. Então estamos coletando o tráfego do Brasil não porque queremos saber o que um brasileiro está falando para outro brasileiro, mas porque queremos saber o que alguém na China está falando com alguém no Irã", explicou Greenwald. É que, como as redes de comunicação são todas interligadas, é possível que comunicações entre dois diferentes países passem também por aqui.
O governo brasileiro afirmou que Polícia Federal e Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) serão os responsáveis pela investigação das empresas de telecomunicações que operam no país para determinar se elas autorizaram a NSA a ter acesso a suas redes e coletar dados dos brasileiros.