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BGS lado B: o pavilhão para os desenvolvedores indies do evento

Por| 10 de Outubro de 2014 às 11h08

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Rafael Romer/Canaltech
Rafael Romer/Canaltech

Surfando no efervescente mercado nacional de games, a Brasil Game Show cresceu muito nos últimos anos. Em sua sétima edição, o evento é hoje 40 vezes maior do que era há cinco anos e até o próximo domingo (12) a expectativa é que 250 mil pessoas passem por lá.

Parte desse crescimento se deve ao investimento dos organizadores em sempre tentarem trazer alguma novidade para o público. Neste ano, uma das promessas foi a de um "pavilhão indie", espaço dedicado somente aos desenvolvedores independentes nacionais.

De acordo com organizador e criador da BGS, Marcelo Tavares, o objetivo foi não só fomentar o cenário indie, mas fortalecer o ecossistema do país como um todo. "É o que a gente precisa alavancar hoje no Brasil, o que falta é a produção local", disse em entrevista ao Canaltech. "A gente precisa criar algumas inciativas que se mantenham aqui".

Ao chegar no evento, no entanto, o espaço não passa a impressão de um "pavilhão" propriamente dito, como chamam os organizadores. Localizado ao fundo do imenso Expo Center Norte, em São Paulo, o local acaba ficando um pouco escondido atrás dos gigantes espaços dos parceiros "diamante" da feira, longe da maior parte do fluxo de visitantes que lotaram a BGS no primeiro dia de abertura para o público, nesta quinta-feira (09).

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Antes mesmo do começo da BGS, aliás, o pavilhão já tinha sido motivo de debate dentro das comunidades de desenvolvedores independentes do país. Vários estúdios resolveram ficar de fora da feira com base no custo de um estande no local, que seria alto demais e incompatível com o orçamento de desenvolvedores indies. Ao Canaltech, um dos estúdios indies presentes na BGS confirmou o valor de R$ 3 mil pelo estande.

"[Com] R$ 3 mil hoje você faz pouca coisa, você compra pouca coisa. Na feira, a gente está com lucro nenhum em cima dos indies, a gente cobrou o custo de participação do espaço", justificou Tavares. "Mas teve gente que não entendeu, nós não somos o Governo, não temos como fazer uma obra social nesse aspecto".

Parte do espaço dedicado aos desenvolvedores independentes da BGS 2014 (Foto: Rafael Romer/Canaltech)

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Mas o preço não desanimou a todos. Ao todo, a BGS traz cerca de dez empresas independentes com seus próprios espaços, com diferentes produtos e estágios de desenvolvimento: algumas já têm seus títulos publicados, outras ainda em estágio inicial de desenvolvimento e até representantes dos setores casuais e de advergames. Do "outro lado da rua" do pavilhão, por exemplo, fica o estande da "gigante-indie" Devolver Digital, reconhecida publisher americana responsável pelo lançamento de games independentes de sucesso, como Hot Line Miami, e referência de vários dos expositores do pavilhão.

Entre os estúdios canarinhos, um dos primeiros estandes do local é o do Duaik, estúdio responsável pelo jogo de aventura de plataforma 2D inspirado em lendas indígenas brasileiras da região do Xingu, Aritana e a Pena da Harpia.

Criado pelos irmãos Pérsis e Ricardo Duaik, Rafael Morais e Vitor Ottoni, o título foi lançado em agosto deste ano no Steam e em mídia física e foi bem aclamado por jogadores pela temática nacional da trama. Até agora, foram pouco mais de 13 mil cópias "distribuídas" - número que reúne tanto as cópias vendidas quanto os downloads piratas do game, segundo os devs.

O game passou por um desenvolvimento de três anos e sofreu com alguma turbulência pela falta de conhecimento da equipe sobre processos de negócio e burocracias de se manter uma empresa no país. Em 2012, o time chegou a conseguir o benefício da Lei Ruanet para financiar o projeto, mas acabou deixando o incentivo de lado temendo cometer algum erro legal no manejo de dinheiro público.

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A equipe avalia que o investimento na BGS foi, sim, alto para um desenvolvedor independente, mas deve se pagar em longo prazo pelas possibilidades de negócio da feira. Segundo eles, a estimativa total de gastos foi de cerca de R$ 4 mil para trazer o time para o evento. “Não é um valor fácil para se levantar, porém, dado um planejamento forte em cima desse dinheiro, você consegue revertê-lo”, afirmou Pérsis Duaik.

Duaik afirma, no entanto, que já no dia de abertura havia batido sua meta para a BGS. O foco da empresa no evento não foi só divulgar o game já lançado para um público mais amplo, mas também estabelecer contato com publishers e empresas de inteligência de mercado para os próximos passos da empresa. De acordo com ele, o desenvolvimento do próximo título da Duaik já está em fase de planejamento, mas ainda sem tema, gênero ou data de lançamento definidos.

"O Aritana foi pensado de uma forma que a gente simplesmente fez um jogo legal e recebeu conhecimento, a parte monetária não foi muito pesada", contou o desenvolvedor. "Conseguimos algum resultado, mas a gente não pode se dar ao luxo de fazer outro jogo nesse estilo, nosso próximo jogo precisa ter um estudo de desenvolvimento de projeto muito mais forte e esse estudo começa nas feiras".

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A realidade é bem diferente da do estúdio vizinho de pavilhão, o Garage 227, que ainda está no início de desenvolvimento de seu primeiro título, mas também optou pela BGS como plataforma para divulgar o trabalho. “A gente não quis fazer o jogo dos sonhos, a gente quis fazer um jogo viável, pensando como empresa, o que a gente consegue fazer no tempo, com pouco investimento, mas que provavelmente dê um lucro na frente”, explicou o fundador Daniel Monastero, que, ao lado dos sócios Ed Marques e Rafael Lima, trouxe a primeira demo pública do game Shiny para o evento.

Em Shiny, o jogador encarna Kramer 227, um simpático robô esférico que avançará por um mundo 2D em plataforma por cenários decadentes. A principal mecânica de jogo será a presença de uma barra de energia que é consumida a cada movimento de Kramer, o que obrigará o jogador a planejar bem seus movimentos para conseguir atravessar os cenários sem ficar sem bateria antes de atingir as estações de carga.

Apesar de ainda estar em fase inicial de desenvolvimento de seu primeiro game, a Garage 227 já nasceu pensado em negócios e tem planos bem alinhados para os próximos passos da empresa. Com lançamento previsto para 2015, Shiny deverá ser comercializado através de lojas virtuais, com destaque para a plataforma Steam, que tem hoje mais de 65 milhões de usuários. “O sucesso no Steam também garante uma negociação muito mais fácil com a Sony e com a Microsoft”, explica Monastero, já olhando para a possibilidade de portar o game para consoles um dia.

Nesse contexto, participar da feira foi um investimento para tornar o estúdio mais conhecido entre empresários e gamers, que também podem experimentar uma demonstração do game no estande e dar feedbacks aos devs. “Não vou falar que não foi caro, nem que foi barato, mas acho que foi justo”, avalia Monastero. “Não dá para mensurar, mas para a gente já foi sucesso, já fomos convidados para outros eventos por estar aqui”.

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Mas não é só no pavilhão indie que os desenvolvedores independentes dão as caras na BGS. Puxados pelo interesse das grandes publishers em oferecer esse tipo de conteúdo para os donos de consoles, alguns indies já subiram ao palco das gigantes da BGS, lado-a-lado com títulos AAA do evento.

"A gente já tem há uns dois anos o interesse dessas [grandes] empresas nos indies", explicou Marcelo Tavares. "Não dava nem para imaginar no passado uma empresa no Brasil desenvolvendo jogo para console. Agora a gente tem, esses sãos os pioneiros".

Foi o caso do estúdio brasiliense Behold Studios, responsável pelo bem avaliado Knights of Pen & Paper, lançado no ano passado e com quase 1 milhão de cópias vendidas e que agora se prepara para o lançamento do aguardado Chroma Squad, um simulador de programas japoneses "Super Sentai" com elementos de RPG.

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Financiado através de uma iniciativa de crowdfunding no Kickstarter, o novo título da Behold será lançado no ano que vem para PC e para os consoles PlayStation 3, PlayStation 4 e PS Vita, em parceria com a Sony como resultado da abertura da empresa japonesa para mais desenvolvedores indies. Durante uma apresentação na quarta-feira (8) no estande da Sony, o estúdio apresentou 15 minutos de gameplay inédito do jogo para o público da BGS.

"Antes era muito fechado, era muito difícil levar esse tipo de conteúdo para consoles, só um jogo muito extraordinário, muito bem elaborado, um case de sucesso", opinou o cofundador da Behold, Saulo Camarotti. "Eu acho que hoje é um cenário totalmente diferente".

Chroma Squad é o 16º título da empresa, que trabalhou com a produção de jogos sob demanda por quase três anos antes de "assumir a camiseta indie" e começar a desenvolver jogos autorais para o público final - o que depois de muitos jogos que não foram para frente, levou ao lançamento do título que catapultou o estúdio para mais de 30 prêmios internacionais nos últimos meses.

Na avaliação de Camarotti, a iniciativa de se criar um espaço dedicado para os indies na BGS é importante para o ecossistema e funciona como mais um ponto de encontro para a já forte comunidade de desenvolvedores locais.

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Em 2010, a Behold expôs pela primeira vez com um estande alugado na Brasil Game Show, com um jogo que nem chegou a ser lançado pela empresa, só para "por a cara a tapa". Desde então, a empresa tem marcado presença constante em áreas indies de eventos, interessada sempre no fluxo do público que passa pelos locais. "Eu sei que o pessoal reclamou de preço, mas vale muito a pena", comentou.