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Crítica | Hunters mostra por que o nazismo não pode ser esquecido

Por| 03 de Março de 2020 às 10h12

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A temática nazista está sempre presente em filmes e séries, e sempre chama a atenção por ser um tema muito delicado. Não é surpresa para ninguém todos os terrores e absurdos que surgiram com o regime, liderado por aquela pessoa que dá calafrios só de pensar o nome.

O foco da abordagem do nazismo no cinema e na televisão é provocar um sentimento de vingança a todos que tiveram a família afetada, ou simplesmente por todos que se sentem indignados com tudo isso. São títulos que servem como conscientização, outros como aula de história e outros focados no sentimento de reparação histórica, focando na tortura, como em Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino, que cumpre um papel de vingança violenta.

Para a última categoria, um embate de dois questionamentos é retratado e pode fazer muitas pessoas pensarem sobre o assunto: é "certo" vingar a violência com mais violência? Milhões de pessoas, entre judeus e negros, morreram no Holocausto das formas mais cruéis possíveis, e logo pensamos que quem fez parte disso deve ter uma punição no mesmo nível, não somente na cadeia, mas com a tortura por igual ou, ainda, a morte.

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Atenção, a crítica contém spoilers da primeira temporada de Hunters!

É exatamente esta a abordagem do roteiro de Hunters, série original do Amazon Prime Video produzida por Jordan Peele. A trama tem como foco um grupo de caçadores de nazistas que descobriram que existem muitos deles infiltrados nos Estados Unidos tentando organizar o Quarto Reich, que envolve uma nova hegemonia.

Inclusive, muitos deles foram contratados pelo governo norte-americano para usarem suas habilidades por lá, como na NASA, por exemplo. A história começa quando o jovem adulto Jonah Heidelbaum, interpretado por Logan Lerman, vê Ruth (Jeannie Berlin), sua avó e sobrevivente do Holocausto, ser assassinada. Não demora muito para ele descobrir que Ruth foi vítima de nazistas e que ela também estava envolvida nessa vingança. Na verdade, era ela quem comandava tudo isso.

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A avó tentou proteger o neto por todos esses anos sem contar tudo pelo que ela passou, com Jonah descobrindo a história dela após conhecer Meyer Offerman (Al Pacino), personagem que se relacionou com Ruth por anos — e que mais tarde descobre-se ser o avô do rapaz.

É quando a história finalmente começa. Passando-se nos anos 1970, mais precisamente em 1977, a série traz de forma divertida todas as referências da época e da cultura nova-iorquina. A equipe de caçadores de nazistas, alguns deles bem caricatos, trazem todos os estereótipos setentistas, como a estética, a popularidade dos quadrinhos e seus heróis, com a série abordando ainda questões sociais, como o crescimento do movimento negro.

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Antes de conduzir as matanças dos nazistas, o grupo faz questão de analisar todo o seu passado para ter certeza de que são realmente eles e que eles são culpados de todos os crimes que cometeram. Tudo isso é exibido em forma de história até o momento da vingança e em paralelo da história de Meyer e Ruth, como eles se conheceram e o relacionamento que desenvolveram.

Em meio às histórias, outras cenas em paralelo vão acontecendo como se fossem quadros de programas de televisão, que acabam ficando um pouco aleatórios e não fazendo muito sentido com a forma em que a trama é conduzida. Entre essas cenas, que lembram bastante filmes do Tarantino, estão algumas explicações sobre como os nazistas se sentiam perante aos judeus, tudo mostrado como uma forma bizarra de humor, além da apresentação dos próprios integrantes do grupo.

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A caçada contra os nazistas acaba se desvirtuando um pouco da questão histórica e do mau-caratismo, entrando em uma questão relacionada a distúrbios psicológicos, como a psicopatia, que vemos em um dos personagens de mais destaque do lado dos vilões: um norte-americano chamado Travis Leich (Greg Austin). O rapaz simpatiza com o nazismo e tem papéis importantes na missão do Quarto Reich e não tem pena de matar quem precisar para se sentir poderoso. Mesmo tendo crescido com uma vida comum, com tudo o que quer e com a melhor educação possível, como os próprios pais deles dizem ao final da série, de nada adiantou e ele se tornou a pessoa fria e calculista que mostra ser.

Estaria, então, a série dizendo que a maldade do nazismo vai além das questões sociais e de poder, sendo também uma consequência da psicopatia? Talvez os dois juntos. Essa crueldade que existe dentro do personagem também bate de frente com Jonah, que no começo sente dificuldades em matar ao questionar se realmente é o certo a ser feito com base em tudo o que acredita.

Um dos fatos mais curiosos desse assunto acontece com a personagem Millie Morris (Jerrika Hinton), uma policial que, mesmo sendo negra e lésbica, acredita que a violência não é a melhor forma de se vingar contra o nazismo. Em cenas pesadas, ela recebe ofensas extremamente racistas e homofóbicas difíceis de assistir, e mesmo assim ela se mantém de pé em suas convicções.

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Al Pacino, como sempre, está brilhante em seu papel e é o condutor da grande reviravolta que choca quem chega ao fim da primeira temporada. Pelo fato de ele não ser quem todos pensavam que fosse, sobrou para Jonah decidir, de uma vez por todas, se os nazistas realmente merecem a redenção, mesmo que digam que foram obrigados a fazer tudo aquilo e que, depois de tudo, se arrependem. A vida de quem morreu e foi torturada pode ser vingada com o perdão? O sadismo e a crueldade dos nazistas poderiam ser esquecidos assim, tão fácil, apenas com o arrependimento?

Hunters é uma série que mostra, a todo tempo, as justificativas pelos caçadores terem esses atos, caso ainda não esteja ficado claro para alguém, mesmo com todos esses anos que se passaram. As interpretações nos campos de concentração e as torturas são dolorosas de ver, mas fogem da romantização e podem se tornar necessárias para a conscientização sobre o assunto. De fato, o nazismo não pode ser esquecido.

A primeira temporada de Hunters, que conta com 10 episódios, está disponível na íntegra no Amazon Prime Video.