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BR constrói maior banco genômico de idosos da América Latina; saiba o porquê

Por| 28 de Setembro de 2020 às 17h50

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Gerd Altmann/Pixabay
Gerd Altmann/Pixabay

Para construir o maior baco genômico de pessoas com mais de 60 anos na América Latina, cientistas brasileiros concluíram o sequenciamento completo do DNA de 1.171 idosos paulistanos, de diferentes classes sociais e etnias. Os responsáveis pelo feito inédito foram os pesquisadores do Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (CEGH-CEL), do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP).

Agora, a análise dos dados levantados —  e reunidos em um repositório de acesso aberto — permitirá identificar mutações genéticas responsáveis por doenças, estimar a incidência dessas mesmas doenças na população brasileira e encontrar variantes genéticas que podem ser determinantes para o envelhecimento saudável. Em outras palavras, o levantamento foi o pontapé inicial para uma medicina mais personalizada (e certeira) para a população idosa do país.

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“É o maior banco de DNA de pessoas idosas da América Latina e de uma população altamente miscigenada como a brasileira, resultado de um trabalho iniciado há mais de 10 anos”, comenta Mayana Zatz, professora do IB-USP e coordenadora do CEGH-CEL – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP.

Como foi a seleção dos idosos?

O processo de seleção foi feito por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da USP no âmbito do Projeto Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (SABE), apoiado pela FAPESP. Entre os idosos, foram escolhidos como população-alvo aqueles que já teriam, em tese, passado da idade de início de manifestação de uma série de doenças que surgem na velhice, como o Alzheimer e Parkinson, por exemplo. Dessa forma, a idade da pesquisa é de 71 anos e também não envolveu participantes aparentados.

Iniciado em 2000, o SABE é coordenado pela professora Yeda Duarte e tem o objetivo de traçar o perfil das condições de vida e saúde de idosos que residem na cidade de São Paulo e em outros centros urbanos da América Latina e do Caribe. “Esse estudo é representativo da população idosa de São Paulo porque é baseado no censo do município paulista e inclui pessoas de todos os níveis socioeconômicos”, aponta Zatz.

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Falta diversidade nos bancos de genoma internacionais

Por enquanto, o grupo está nas primeiras análises dos dados genômicos dos idosos paulistanos e já é possível perceber uma inclusão significativa de descendentes de imigrantes de diferentes continentes. Isso permitiu a identificação de mais de 76 milhões de variantes genéticas, das quais dois milhões não estavam descritas em bancos de dados genômicos internacionais, ou seja, ainda não existiam para as pesquisas. Uma das explicações para essa lacuna é o caráter único dos dados coletados no Brasil. Afinal, populações altamente miscigenadas, como a brasileira, estão sub-representadas nesses bancos genômicos.

Atualmente, os bancos de DNA guardam, majoritariamente, dados genéticos de populações europeias. Infelizmente, a falta de diversidade nesses bancos pode limitar o acesso de pessoas de ascendência não europeia aos benefícios da medicina de precisão e a testes com maior acurácia, apontam os autores do estudo.

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“O número excessivo de variantes não descritas indica que nossas populações parentais não estão representadas nesses bancos e reafirma a importância de sequenciar o genoma de brasileiros, especificamente, para reduzir as assimetrias de representatividade nos bancos genômicos internacionais”, pontua Michel Naslavsky, professor do IB-USP e primeiro autor do estudo.

Além disso, a análise da ancestralidade genética dos idosos paulistanos revelou uma variabilidade considerável, que abrange desde um único ancestral a uma mistura de dois ou mais. No caso, a maior predominância foi primeiro de europeus, seguida, respectivamente, por africanos, ameríndios e asiáticos do leste.

“Os americanos que apresentam essa rara miscigenação são classificados nos bancos genômicos dos Estados Unidos como latinos, quando, na realidade, são majoritariamente mexicanos, que não apresentam o mesmo perfil de ancestralidade genética das populações do Brasil e de outros países da América Latina”, afirma Naslavsky.

Doenças mais comuns em brasileiros

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Pensando nas doenças que acometem os brasileiros, foram comparadas quase 400 mutações gênicas identificadas nos idosos com as apontadas como causadoras de doenças (patogênicas), encontradas nos bancos genômicos públicos, para verificar se, de fato, correspondiam a essa classificação. “As análises comparativas permitiram reclassificar mais de 40% de mutações e apontar que algumas delas podem ter efeito menor do que o previsto anteriormente”, explica Naslavsky.

Entre as doenças analisados pelo estudo, estava a fibrose cística – bastante comum entre os europeus. De acordo com os autores, a frequência da doença é de um caso em cada 2 mil, entre os habitantes do velho continente. Enquanto isso, no Brasil, a incidência estimada é de um caso em cada 10 mil, ou seja, muito menor. 

“A incidência dessa doença é maior na Europa, porque a mutação causadora é mais comum em caucasoides. Como a população brasileira é muito mais miscigenada, ela é mais rara no país”, argumenta Zatz. Isso atesta que conhecimentos e taxas de doenças, baseadas na experiência de outros países, não vale necessariamente para a população brasileira.

“Além da importância na medicina de precisão, esses resultados demonstram que o sequenciamento de genomas completos pode auxiliar na elaboração de políticas de saúde pública ao ajudar a estimar quantas pessoas podem nascer com doenças genéticas em uma determinada população”, completa Naslavsky.

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Publicado na plataforma bioRxiv, o preprint do estudo pode ser acessado aqui.

Fonte: Agência Fapesp